quarta-feira, 16 de maio de 2012

Chico X Roberta - Fé - Virtude ou Ingenuidade?

  1. Introdução 1

    Olá, Roberta!

    Desde já agradeço sua disposição em aceitar debater este tema tão profundo e também tão fundamental.

    Eu vou introduzir o tema tentando ser bem claro em relação àquilo que tem a ver com o tema que iremos discutir e também afastar tudo aquilo que não faz parte do que será discutido.

    A palavra “fé” é utilizada para dizer uma série de coisas, sendo que algumas delas são inquestionáveis.

    Quando dizem para alguém ter “fé em si mesmo”, por exemplo, não se está dizendo para a pessoa viver uma certeza ilusória, mas para ter uma atitude positiva frente ao incerto.

    É óbvio que isso é totalmente saudável e necessário. Todos deveriam ter este tipo de “fé”, pois é o que nos guia para um mundo melhor do que aquele que estamos vivendo.

    Em momentos de aflição, é importante ter uma atitude positiva frente ao incerto para que se possa superá-lo.

    Mas não é sobre este tipo de fé que eu quero discutir quando pergunto se é uma virtude ou uma ingenuidade.

    Eu me refiro à FÉ que permite as pessoas acreditarem em coisas, mesmo quando não possuem boas evidências para isso. Falo do tipo de FÉ que silencia o espírito questionador, por trazer respostas definitivas para questões que não sabemos a resposta.

    Falo da Fé que faz as pessoas acreditarem que sabem coisas que ninguém sabe ou negar evidências concretas por que são contrárias àquilo que elas resolveram aceitar como verdadeiro, baseado em uma confiança cega em algo que não tem uma explicação racional.

    Este tipo de mentalidade leva as pessoas a inferirem coisas bastante específicas sobre a natureza do cosmo, o que acontece após a morte ou a resposta definitiva para complicados dilemas morais.

    E isto leva à criação de sociedades onde os homens vivem suas vidas sonhando com o que vai acontecer quando ele receber 72 virgens no paraíso e o que deve fazer para alcançá-las.

    Outros defendem veementemente a existência de um sádico todo poderoso nos céus dizendo explicitamente o que as pessoas deveriam fazer para que sejam premiadas após a morte.

    Entretanto, não existe nenhuma boa evidência de que qualquer uma dessas coisas seja verdade e mesmo assim, as pessoas preferem acreditar nisso, do que naquilo que foi investigado, explorado, discutido e aceita mudar sua própria explicação.

    E as pessoas chegam a conclusões que não tem problema algum em se acreditar neste tipo de coisa, mesmo que não haja nenhuma justificativa racional para embasar a atitude. De que não se deve criticar aquilo que uma pessoa acredita.

    Bem, se fosse apenas uma crença, de fato, não haveria problema algum em dar a este tipo de fé todo o respeito que os fiéis querem, da mesma forma que se respeita o modo de se vestir de alguém, ou a forma como você decora sua casa.

    Mesmo que eu ache horroroso quando alguém se veste de forma ridícula, eu a respeitaria o suficiente para não dizer nada.

    Mas a fé religiosa é mais do que apenas uma crença. A ideia central em torno de toda a fé religiosa gira em torno da imposição de uma moralidade universal e por isso sempre atraiu o tipo de gente que acha que a vida dos outros é problema deles.
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  2. Introdução 2

    Respeitar este tipo de mentalidade é exatamente o que nos trouxe vários problemas que vivemos hoje. Ao fornecer à religião um crédito imerecido por aquilo que ela não é capaz de fazer, fechamos os olhos para àquilo que a fé religiosa realmente representa: a suspensão deliberada de uma descrença. É um ato de vontade, é uma escolha. Não é um “estado de graça” nem algo que apenas algumas pessoas podem experimentar.

    É a aceitação de uma explicação, mesmo que não existam boas provas para sustentá-la.

    Então por que este tipo de fé é mais merecedora de respeito que sua vontade em usar botas ou sandálias?

    E por que este tipo de fé é considerada algum tipo de “virtude”?

    Não ajuda a aprofundar nenhum tipo de conhecimento, muito pelo contrário. Ao propor que suas respostas são definitivas, ela simplesmente incentiva as pessoas a deixarem de fazer perguntas.

    Além disso, os impactos que este tipo de coisa pode provocar nas mentes das crianças são tremendos.

    Por isso eu acho que, de fato, devemos tratar a questão da fé religiosa com todo o respeito que ela merece, mas absolutamente nada além disso.

    O grande problema está em achar que ela merece mais repeito do que o que realmente merece.

    Mesmo por que, respeito é algo que se conquista. Tudo o que clama para si um “respeito inerente” pelo simples fato de ser como é, deveria ser alvo de críticas.

    Algumas coisas precisam ser criticadas e outras ridicularizadas para que as pessoas pensem melhor a respeito de suas posturas, afinal de contas, críticas são fundamentais para quem quer enxergar os próprios defeitos e aprender com eles.

    Todos sabem o que acontece com um estado quando ele proíbe as críticas a si mesmo, clamando para si um “respeito” na marra, imerecido. Também sabemos que isso acontece principalmente quando um estado quer impor seus ideais para a população, justamente por saber que o diálogo franco e aberto o impediria de agir como quer.

    Por que a religião teria esse direito? O que faz com que a religião seja algo que deva estar fora do escopo das críticas das pessoas, ao contrário de todas as outras instituições humanas? E mais... Será que dar este tipo de humanidade para este tipo de fonte de conhecimento é algo que pode ser útil para a humanidade?

    Mesmo que o Deus dos hebreus, tal como descrito na Bíblia realmente exista, ainda assim isso não seria motivo para seguir seus preceitos sem pensar antes em suas implicações.

    E se ele existisse, eu queria ouvir isso dele, de ninguém mais. Como é que eu posso acreditar que algo tão fundamental existe, baseado apenas no que dizem outras pessoas ou no que foi escrito séculos atrás, por culturas primitivas?

    Mas eu entendo muito bem por que as pessoas são tão atraídas por este tipo de conhecimento, pois é muito conveniente viver sua vida pautada em respostas prontas (por mais absurdas que elas possam ser) do que pautar sua vida na dúvida e na constante investigação.

    Tanto é que o ato de obter conhecimento a partir do questionamento e do acúmulo de evidências é um fenômeno bastante recente na história da humanidade e por isso, ainda está em fase de aceitação e assimilação da grande massa, que ainda permanece presa aos dogmas do senso comum, de uma vida sem reflexão.

    Mas uma coisas que todas as pessoas deveriam perceber é que não importa o tanto que você acredita em uma coisa, isso por si só, não vai fazer o que você acredita REAL.
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  3. Introdução 3

    Alguém pode muito bem ser hipnotizado para acreditar que é uma galinha, mas não pode esperar que todas as outras pessoas irão acreditar nisso, a não ser que ele mostre os ovos que está botando.

    Por essa e outras que eu não acredito que o Deus Hebreu, como descrito na Bíblia existe e por isso sou considerado por muitos um “ateu”.

    Para mim, “ateu” é uma palavra que não deveria nem existir, pois quando o ser humano chega ao ponto de embutir um nome em uma descrença, significa que acha que o certo seria que todos aceitassem a crença, o que, por si só, já é uma atitude discriminatória com quem não concorda em aceitar a crença.

    Eu prefiro me considerar um “Agnóstico Fundamentalista”.

    Em outras palavras, eu não sei. Eu não acho que ninguém mais também saiba alguma coisa e acho que todos os que não concordam comigo são um bando de infiéis hereges e malditos.

    Faz parte da natureza humana especular sobre as coisas que ele não conhece, mesmo por que, imaginar respostas para as coisas faz parte do processo que vai um dia levar à verdadeira resposta.

    Mas também faz parte da natureza humana aceitar essas respostas, ainda que incompletas ou sem evidências que as sustentem. Em alguns casos, são capazes de morrer por essas ideias formadas, sem nenhuma comprovação de que elas são, de fato, reais.

    Da mesma forma que o espírito investigativo parece fazer parte da natureza humana, também parece existir uma tendência de que as pessoas continuem firmes acreditando nas mesmas coisas pelo resto de suas vidas.

    Por isso, as ideias que são colocadas nas mentes das pessoas durante os primeiros momentos de suas vidas são extremamente importantes para a formação do caráter das pessoas.

    Mesmo assim, no mundo moderno, é perfeitamente aceitável que alguém doutrine seus filhos na mais segregatória das atividades humanas. Ninguém vê com maus olhos o fato de que suas crianças serão submetidas a um processo de lavagem cerebral que acabará as tornando zumbis incapazes de questionar sobre as coisas, pois terão aprendido que o caminho para a salvação é a obediência, não a investigação.

    Este tipo de abuso não é só permitido, como é incentivado. Dinheiro público é gasto com este tipo de coisa.

    E ninguém percebe que este tipo de conduta causa muito mais mal para a sociedade que qualquer tipo de droga, ou de qualquer tipo de mal para o meio ambiente que as pessoas possam infligir.

    No oriente médio, gente com este tipo de mentalidade domina armamentos de destruição em massa.

    Certeza absoluta é uma droga que controla a vida das pessoas, mais que qualquer outro vício.

    Ela toma o lugar na mente que antes estaria ocupado pelo senso crítico e leva as pessoas a contaminarem o mundo com seus princípios invioláveis.

    Até a próxima.

    Chico Sofista.
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  4. Os agradecimentos são recíprocos, acredite. È um tema recorrente em minhas análises pessoais, onde acredito que com sua cooperação, chegarei a algumas sentenças, espero ser para você, também de alguma valia.

    Li com atenção sua introdução, em busca de pontos divergentes, e até acredito que haja alguns, mas a impressão que tive é que tanto eu quanto você somos pessoas em busca de respostas, e mais do que isso, somos pessoas com infinitas novas perguntas. È motivador (e até certo ponto, pretensioso) fazer alusão a campanha do Canal Futura: http://www.youtube.com/watch?v=EVmejcPkkjI&feature=related, mas, em suma, é exatamente o que trataremos aqui: não falaremos de certezas, e sim de motivações e dúvidas.

    São esses fatores que fazem o homem questionar, acreditar, refutar antigas verdades. E esses valores, acumulados também através de tradições, podem ser chamados por crença, mas, há algo que precisa ser dito: a fé, não está necessariamente está ligada a religião. Alias, é relativamente recente essa associação. A origem da palavra diz que fé é a firme convicção sobre algo seja ele, inanimado, uma corrente filosófica, uma posição pessoal. Pode ser nomeado, portanto, como (tentativa de) persuasão, quando uma idéia é colocada em coletivo, ou, juízo de valor, quando essas impressões são experimentadas individualmente. Mas, ao nomear por “fé”, simplifica um pouco a discussão, isso, claro, em minha opinião.

    Concordo com você quando diz o termo é utilizado em uma gama de coisas, e que algumas são inquestionáveis. Mencionou sobre a fé em si mesmo, e me lembrei de uma determinada aula, esta, em minha primeira graduação: na disciplina Filosofia da Educação, o professor explicou o termo “entusiasmo”, de raiz grega, que significa, segundo o mestre, ter um deus dentro de si. Gregos, como politeístas acreditavam em várias entidades, portanto, qualquer pessoa podia viver em comum união e transformar a natureza e seu cotidiano, com auxílio do sobrenatural. Assim, aquela que fosse entusiasmada por Héstia, seria uma boa esposa, por Eros, um motivado amante, Artemis, uma exímia caçadora, e assim por diante. Os gregos afirmavam acreditar que só os entusiasmados eram capazes de vencer os desafios diários, daí, a necessidade prática da coisa e aí, entra um importante viés do que pode ser fé: uma escolha condicionada a uma necessidade, uma muleta emocional...
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  5. Mas não é nisso que acredito.

    Acredito em auto-sugestão, em estímulos externos, em sentenças positivas, em atitudes proativas. Acredito nas convicções obtidas através da experimentação e profunda análise. Mas também acredito no homem, na matemática, na racionalidade. A fé, segundo minha ótica, é isso, e quero ver alguém questionar essa lógica e legitimidade.

    E é por isso que discordo da forma que o tema de nosso duelo foi colocado. Não considero que ter fé em algo possa ser considerado uma virtude, e muito menos, que seja postulada a hipótese da ingenuidade. Ter fé em algo é uma característica humana, tal qual todas as outras e não pode ser considerada régua moral, ou atestado de boa índole. Com sua prática outros humanos buscarão interações, e essa é sua única finalidade: a de saber que não estão sozinhos com uma determinada certeza. Isso engloba todas as motivações, e por ser tão abrangente, não posso aceitar o axioma da ingenuidade, por defender que, quem faz uma escolha, o faz obedecendo a um critério.

    Vou transcrever algo que disse relacionando a verdade:
    Há alguns dias o assunto era a avaliação, e os critérios, estes, subjetivos. Também foi discutido sobre o que é a verdade. Perguntei ao Caril se considerava a sua verdade a mais importante, e apesar de pensarmos diferentes, continuo com meu pensamento: para mim ela é sinônima de convicção pessoal. E se alguém defende uma ideia é porque a avaliou sob todos os prismas, refutando antigas hipóteses, elegendo outras tantas, até que fundisse num conceito particular. Por essa razão, tenho tanto apego/apreço por minhas crenças. Apesar da defesa ferrenha por tudo aquilo que acredito, entendo que ela pode não ser a única, ou a mais certa. E muito menos que ela esteja, de forma definitiva, estática.

    Crenças não são imutáveis, mas para que haja mudança, é necessária a apresentação de novos dados, estes, coerentes. Para que minha verdade seja transformada, é necessário que seja completamente convencida, até para que reveja posicionamentos... Isso é um processo educativo, essencialmente humano.

    No mundo, lidamos com o melhor uso das ideias. E o pensamento é aquilo que melhor nos define, é aquilo que nos personaliza. Pessoas matam e morrem - e não é só no sentido metafórico - por suas convicções, e ao optarem por isso, não é justo atribuir a ingenuidade como motivação. A isso, damos outro nome.
    Há claro, enganos. O que é também, algo natural. Afinal, o que pode ser mais falível que o homem? Mas eu acredito que em toda escolha, inclusive nas equivocadas, haverá o aprendizado, por isso, nada será em vão. Não adianta, não acredito em involuções humanas, e com essa afirmação exponho minha única fé inabalável.
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  6. Não gostaria de discutir a fé religiosa, até porque não comungo de nenhuma agremiação, e por não fazer parte, considero incoerente julgar. Mas, há um ponto que gostaria de abordar: não acho que se deva ter em relação a religião, respeito. Defendo que isso seja aplicado aos religiosos. O respeito não é algo que se conquista, e sim, aquilo que retribuímos. Deve partir do individual, depois, para o todo, e sinceramente, não entendo como isso deveria ser alvo de críticas.

    O preconceito e a intolerância nada mais são do que o uso da força frente a razão. Nenhuma entidade tem direito de sobrepujar, e essa deveria ser uma luta coletiva.

    Sobre crenças pessoais, eu não acredito no deus do antigo testamento. E muito menos, não confundiremos religião com comportamentos de rebanho. Muito do que é realizado em países africanos e do Oriente Médio são ‘legitimados’ pela tradição machista e patriarcal (mutilação genital, apedrejamento, atentado suicidas) .

    Gosto mais da visão do Novo Testamento, parece-me mais humano a reconciliação d’Ele com os homens, mas, apesar disso, não consegui até hoje encontrar um rótulo confortável para aquilo que sou (estou). Talvez o mistério é entender que classificações não são necessárias. Seria esse o tal ovo do Colombo?

    Finalizando minha primeira participação, também gostaria de questionar esse seu parágrafo:

    “Certeza absoluta é uma droga que controla a vida das pessoas, mais que qualquer outro vício. Ela toma o lugar na mente que antes estaria ocupado pelo senso crítico e leva as pessoas a contaminarem o mundo com seus princípios invioláveis.” – aqui você coloca como definitiva uma posição humana, como se fôssemos estáticos. Alias, pela concepção humanista o homem nunca é nada, já que está em constante formação, portanto, ele no máximo está. Entende esse raciocínio?


    E, por enquanto é isso. Espero ansiosa pelo desenrolar dessa discussão, de antemão, agradecendo a oportunidade.

    Att,

    R.
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  7. Réplica 1

    Saudações, Roberta!

    Como não podia deixar de ser, nossas primeiras contradições encontram-se justamente relacionadas a questões semânticas.

    Quando usamos alguma palavra, estamos tentando fazer uma representação de uma ideia que carrega uma série de conceitos.

    E de fato, os conceitos básicos que estamos discutindo aqui são “certezas”, “motivações” e “dúvidas”, como você bem destacou.

    A palavra “FÉ”, como você disse, não está necessariamente está ligada a religião, mas ela não significa apenas “uma firme convicção sobre algo”, mas também a uma convicção SEM PROVA OU CRITÉRIO OBJETIVO DE VERIFICAÇÃO, dependente da CONFIANÇA que é depositada na ideia, tanto é que se relaciona semanticamente aos verbos crer, acreditar, confiar e apostar.

    A fé é justamente o fenômeno psicológico conceitualmente antagônico ao da DÚVIDA, e por isso É IMPOSSÍVEL DUVIDAR E TER FÉ AO MESMO TEMPO. Ter “fé” em algo significa justamente abandonar a dúvida.

    Quando debatemos sobre algum assunto, nós avaliamos as razões uns dos outros. Pensamos, comparamos, criticamos, enfim, pensamos nas diversas formas de se resolver uma questão.

    Se suas razões são boas o suficiente para defender o que você defende, eu ficarei sem meios lógicos de discordar de você e não terei opções, a não ser acreditar no que você acredita.

    A razão é contagiosa e é possível reconhecê-la na discussão aberta e honesta de ideias.

    Por isso, se o objetivo de um debate é se chegar à verdade sobre algum assunto, nós não devemos “respeitar a crença dos outros”, nós devemos avaliar suas razões.

    E é mostrando para as pessoas onde o raciocínio delas está errado que se muda o mundo, pouco a pouco.

    Mas você sabe disso muito bem disso.

    E é justamente por não respeitar o que seus alunos sabem de matemática que você mostra para eles como eles são ignorantes, toda vez que demonstra que existiam formas de raciocinar que eles ainda não conheciam.

    Se algum aluno discordar de alguma coisa que um professor diz, deve ser baseado em uma lógica que sirva para todos, não em alguma ignorância que o impeça de aceitar uma lógica inversa ao que diz sua própria ilusão.

    Por isso, eu concordo totalmente contigo quando diz que,”quem faz uma escolha, o faz obedecendo a um critério”. E acrescento ainda que, se existe um critério, ele pode muito bem ser apresentado, usando a racionalidade, de forma que faça sentido para outras pessoas, não é?

    Imagine, por exemplo, que eu te digo que eu tenho um castelo cheio de tesouros enterrado no meu jardim.

    Aí, quando você me pergunta quais são os critérios que eu uso para dizer os motivos dessa minha escolha, imagine que eu te respondo coisas do tipo:

    _Saber da existência desse tesouro me dá grande entusiasmo para viver. Ou então, “Eu não conseguiria viver em um mundo onde não existe o tesouro enterrado em meu jardim”.

    Qualquer um que ouvisse esse tipo de respostas diria que se trata do discurso de um louco, ou de um retardado.

    Isso acontece por que, para todas as explicações que damos na vida, devemos mostrar qual é o critério que usamos para justificar nossas crenças. Isso serve para absolutamente tudo na vida, mas as pessoas fecham os olhos quando o assunto é religião.
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  8. Réplica 2

    Eu fui bastante incisivo e direto na crítica específica à fé religiosa em minha introdução, ao que você foi enfática ao defender a ideia de que “religião não se discute” ou “cada um tem sua fé”, que são justamente os argumentos que encerram qualquer discussão a respeito desse assunto.

    Por isso, o que eu quero mostrar é que não faz o menor sentido que o mesmo critério que nós utilizamos para avaliar todas as nossas escolhas na vida seja negligenciado, quando o assunto é justamente o mais fundamental de toda nossa existência.

    Esse mesmo discurso é frequentemente utilizado pelos “cristãos moderados”, que são aqueles que não seguem ao pé da letra o que dizem as escrituras, mas acham que a fé religiosa representa algo bom para as pessoas e para as sociedades, sendo portanto coisas que não deveriam ser criticadas.

    Eu tenho várias críticas a serem feitas a este tipo de postura e é nisto que vou focar a minha réplica.

    Você falou em sua introdução de como você constrói suas convicções pessoais.

    Já refletiu a respeito de como as outras pessoas formam suas convicções pessoais? Será que as pessoas são criteriosas ao selecionar aquilo que elas têm por verdadeiro ou falso?

    E mais. Será que não é extremamente importante saber como as pessoas constroem suas convicções pessoais?

    Crenças são representações do mundo, o que é muito diferente de uma esperança, por exemplo.

    Quando alguém tem esperança em algo, tem a representação de uma POSSIBILIDADE do mundo. Já a crença traz uma série de transformações fisiológicas e comportamentais que irão alterar completamente a forma como a pessoa vivencia a realidade.

    Além disso, eu acredito que a forma como nós enxergamos as crenças uns dos outros nunca foi tão importante para a história da humanidade quanto tem sido atualmente.

    A manutenção de nossa civilização nunca esteve tão ameaçada por este fator e não existe nada em nosso poder tão importante do que este tipo de debate.

    Sendo assim, a forma como nós criticamos ou deixamos de criticar as crenças uns dos outros pode determinar o destino de toda a humanidade.

    O mundo encontra-se em guerra de dogmas incompatíveis: Cristãos X Muçulmanos X Judeus.

    Eu não vejo nenhuma razão para que sobrevivamos aos nossos conflitos religiosos indefinidamente e por isso eu acho que é extremamente importante este tipo de debate, principalmente onde ele ainda não é permitido.

    E justamente pelo fato da ideia de que “crenças devem ser respeitadas”, que estamos construindo uma sociedade baseada na ignorância.

    O número de evangélicos cresce no Brasil e com eles o número de pessoas que é a favor do ensino de criacionismo nas escolas ao invés de evolucionismo.

    Acreditar por exemplo, que o Deus Bíblico literalmente prometeu a terra de Israel ao judeus traz inúmeras consequências geopolíticas.

    Não é algo que podemos fechar os olhos e dizer “cada um que acredite naquilo que achar melhor”. Mesmo por que, esta é justamente a função do professor, não é?

    Mostrar, através da razão, o que é coerente, independentemente das suas opiniões prévias a respeito do assunto.

    Você poderia argumentar que o problema todo é educacional e não religioso.

    Mas grande parte das pessoas que se opõe à pesquisa com células tronco, por exemplo, são pessoas muito bem instruídas. Muitos fundamentalistas religiosos envolvidos em ataques terroristas são engenheiros ou arquitetos.

    É por causa desta visão medieval de que a alma entra no corpo a partir da concepção, que para eles é a fecundação, que um monte de células em uma placa de Petri merecem o mesmo tipo de preocupação moral que uma menina de seis anos com diabetes, ou um homem de 40 com Parkinson.
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  9. Réplica 3

    No fim das contas,todo este discurso politicamente correto dos moderados, de que “todos devem ser livres para acreditar no que quiser”, mostra-se intrinsecamente paradoxal.

    Para encerrar esta questão, me parece que muita gente, bem intencionada, inclusive, passa a acreditar que crenças são particulares e não causam mal a ninguém.

    Por ver com maus olhos críticas ao extremismo religioso, os moderados dão cobertura para que os fundamentalistas continuem cometendo seus absurdos.

    Justamente pela existência desse tipo de ideia, que é um tabu criticar religião.

    Apenas um suicida profissional ou político sairia defendendo abertamente ideias que confrontassem diretamente ideais defendidos pela maioria dos religiosos de sua região.

    E é claro, isso limita absurdamente a honestidade intelectual das pessoas, pois todos tendem a não externar pensamentos que fariam com que as outras pessoas fizessem um mal julgamento de sua pessoa.

    Além disso, eu defendo a ideia de que os religiosos fundamentalistas, ao contrário da maioria dos moderados, REALMENTE leram as escrituras e interpretaram certo.

    Esses livros são, de fato, segregatórios e intolerantes, como defendem os fundamentalistas.

    Uma vez que alguém ache legítima a afirmação de que esses livros são mais importantes que quaisquer outros livros e representam o que há de melhor em termos morais para serem seguidos por uma nação, nós nos tornamos refém de seus conteúdos.

    O criador do universo, de fato, odeia homossexuais. Está em Levíticos e para quem acha que o livro “bom” é o novo testamento, também está também lá em Romanos.

    Existem várias parábolas interessantes de Jesus Cristo. Várias delas pregavam princípios de solidariedade e humanismo, mas se você ler Lucas 19, por exemplo, vai ver uma estória que Jesus conta a respeito de um Rei, que era criticado por parte dos seus súditos, que não confiavam nele. No fim da história, o Rei pede pela presença de todos os seus críticos e que fossem mortos em sua presença.

    É óbvio que este tipo de passagem com certeza serviu de inspiração para monarcas assassinos legitimarem suas atitudes sanguinárias. O mesmo vale para os inquisidores da idade média que queimaram as pessoas vivas durante 400 anos. Eles conseguiram legitimar seu comportamento, de acordo com o ministério de Jesus Cristo.

    São Tomás de Aquino era da opinião de que hereges deveriam ser mortos imediatamente, enquanto Santo Agostinho achava que eles deveriam ser torturados. E esses são maiores intelectuais, fundamentadores de toda a “filosofia” cristã.

    Olhando este tipo de coisa, alguém poderia dizer, mas estas pessoas são loucas! O que não é verdade. Este era o tipo de comportamento normativamente aceito como natural para a sociedade da época, dado o que as pessoas acreditavam.

    E de fato, se o que os livros sagrados dizem é verdade, então os fundamentalistas religiosos estão cobertos de razão.

    Pense bem. Existe algo que seu vizinho pode dizer para o seu filho que pode fazer com que ele passe a eternidade sofrendo no inferno. Isso é muito pior do que molestação sexual.

    Eu acho que o grande problema do discurso moderado é que muitas pessoas se esquecem do quão fanáticas e idiotas, as pessoas conseguem ser.

    Você havia dito que “Crenças não são imutáveis, mas para que haja mudança, é necessária a apresentação de novos dados, estes, coerentes.” , o que é verdade e é diferente de “Fé”, pois esta não muda por causa da apresentação de novos dados, pois é um estado emocional, não racional, de apego a uma ideia, ainda que não existam evidências para sustentar a sua crença.

    Eu concordo contigo que crenças não precisam ser estáticas, mas é o que são, quando são fundamentadas em dogmas.

    E é exatamente por isso que eu acho que a “fé religiosa” não pode ficar fora da questão e não pode jamais ser vista como algo que é “incoerente de se julgar”, mesmo por que, é a mais importante para a formação dos valores de um povo.

    Até mais!

    Chico Sofista.
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  10. Por conta de meus compromissos familiares, não pude responder com a urgência que o assunto exigia, e por isso, peço desculpas. Por outro lado, isso para mim não foi tão ruim já que tive mais tempo para análise de seu discurso: é preciso elogiar a forma linear que apresenta os argumentos, foi agradavelmente coeso, além demonstrar em seu texto, preocupação estética, ou seja, tenho poucas coisas a questionar e/ ou contribuir.

    Mas há algo que gostaria que me explicasse: afirmou que nossas divergências começavam na semântica, e confesso que isso me deixou em dúvida: classificou-me como contraditória enquanto sinônimo de antonímia?

    E ficamos nesse dilema do que seja fé, onde acredito que a definição é plural, mas, em nenhum momento é dito que essa exposição de idéia é obtida sem prova. As análises individuais não são os únicos “instrumentos” de verificação de algo, vide o empirismo.

    Filosoficamente falando, não posso aceitar a afirmação “é impossível duvidar e ter fé ao mesmo tempo”, por estar na dúvida (questionamento) aquilo que faz do homem, homem: animal questionador e objeto em constante formação. Portanto, aceitar essa oração seria negar todas as convicções pessoais, o que na minha concepção, faria de qualquer pessoa uma espécie de zumbi, que age sem critérios, análises, avaliações... Por essa razão, reafirmo que a fé não pode ser classificada como virtude, muito menos se a mesma for a da ingenuidade. Posso até não concordar nos instrumentos escolhidos pela manutenção (ou negação) da fé, porém negá-los seria ridicularizar/menosprezar a individualidade humana.

    Apesar de concordar em grande parte daquilo que escreveu, discordo veemente na máxima que as minhas razões servirão de convencimento a alguém. Não há de minha parte interesse em “converter” ninguém a minha crença, portanto, sempre haverá a opção de continuar na sua forma original com suas dúvidas e questionamentos, sem que isso abale minha psique.
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  11. O objetivo de qualquer debate não é chegar a verdade, uma vez que ela não é única. Debatedores praticam um exercício retórico, de preferência amigável, onde desejam expor uma ideia, sem a necessidade de prevalecer o seu ponto de vista. È uma busca de respostas, ou, quando com sorte, de novas dúvidas. Sobre o nosso tema, Chico, sou da opinião que há sim de se respeitar a crença alheia, e que não podemos agir enquanto juiz da razão dessa escolha. O máximo que nos é permitido é entender o processo que se deu essa escolha.

    Ninguém é uma folha em branco, por essa razão, bons professores respeitam o que o aluno sabe. E respeitam mais ainda aquilo que aparentemente não sabem. Cabe ao educador entender a forma que o educando raciocina e a partir daí, montar uma estratégia para que ele assimile um conteúdo com maior tranqüilidade. Por isso, quando um aluno discorda da metodologia do professor, cabe ao mestre, investigar a lógica, mesmo que inversa. Em Matemática, bem como na vida, não importa o meio que se utiliza para chegar a uma resposta, o que vale é o resultado.

    Entendo perfeitamente a importância da dissecação de órgãos, mas gostaria de entender a necessidade disso quando analisamos opiniões pessoais. Qual é aplicabilidade de mostrar os critérios que justificam nossas crenças? Acredito que essa busca por respostas serviu como desculpa para toda sorte de conchavos humanos. Não questionarei a analogia do tesouro- mesmo considerando-a rica em simbologias - por ela estar ligada naquilo que prefiro não debater, que é a religião, mas, sendo objetiva afirmo que ninguém questionaria a existência desse tesouro, por ele ter valor apenas a pessoa que afirma pertencer.

    Tudo pode ser discutido, se obedecer ao critério do respeito. Mas, o que nos diferencia é que não tenho a necessidade de impor minha racionalidade/ credulidade a ninguém. Por isso tenho a fala moderada, mesmo não me considerando cristã.

    E sim, já refleti sobre minhas convicções, e exatamente por não ter chegado a um ponto específico, que continuo nesse exercício. E é claro que as pessoas são criteriosas na seleção de suas convicções, o que pode acontecer é de não concordamos com a lógica aplicada. Crenças podem ser representações do mundo, mas é, essencialmente, manifestação individual.
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  12. Eu não entendo como a forma que enxergamos as crenças do outro pode ser importante para manutenção de nossa civilização. O planeta não está em guerra por motivações religiosas, e sim, políticas, e não haveria nenhum dogma incompatível, se houvessem nas pessoas o estímulo a tolerância, ética, ao respeito e aceitação ao diferente. “Crenças devem ser respeitadas” – sou de opinião que o mesmo é princípio fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e harmônica. A questão do estado de Israel é bem mais simples que se possa imaginar, numa outra oportunidade, se assim preferir, podemos voltar ao ponto.

    Como é de conhecimento, sou contrária ao ensino religioso na escola pública, e há sempre a necessidade de lembrar que a fé não é inimiga da ciência, é só lembrar dos grandes Stephen Hales, John Flamsteed, John Bartram, Roger Bacon, Isaac Newton, Louis Agassiz, Henry Schaefer, Arthur Schawlow, enfim, são vários bons exemplos. Acredito que essa crença é um mito nascido no Iluminismo. Citou, de maneira superficial algumas passagens bíblicas, mas não houve uma contextualização de sua parte, relativo ao momento histórico e modo de vida dos habitantes. De toda forma, não sou também uma especialista em escrituras, apenas uma leitora dos livros que compõe a bíblia, bem como, de outros documentos históricos, mas, nasceu um interesse de futuramente debater com você, o Novo Testamento, em especial, o evangelho de Lucas, esse seria, portanto, um convite que gostaria que aceitasse.

    Sei que não houve de sua parte a intenção de me chocar, mas, há trechos em sua treplica algo que me deixou extremamente desconfortável: usou da lógica afetiva para me convencer que algo que um ‘vizinho’ falasse ao meu filho seria pior que o abuso sexual. Como mãe, zelosa e com o instinto de proteção aguçado, fiquei atônica com a comparação: da saúde emocional, dos valores morais e éticos que ele fará uso, nenhum adulto conseguirá fazê-lo sofrer, pois aprenderá a ser autoconfiante, mas pensar na possibilidade da violência sexual, é de uma crueldade que poderia ter sido evitado em seu discurso, por saber que esse filho mencionado não é uma hipótese, e sim, um sujeito. Não somos, eu e ele, pessoas fictícias, e talvez por isso essa fala tenha me afetado tanto.

    Numa outra parte, também fez um comentário que julguei bastante infeliz: ‘apenas um suicida profissional ou político sairia defendendo abertamente ideias que confrontassem diretamente ideais defendidos pela maioria dos religiosos de sua região’, além de dizer que não concordo com tal sentença, afirmo que pessoas que defendem de forma independente e abertamente suas idéias, são notáveis e livres da censura local. Têm, portanto, minha admiração.


    Por enquanto é isso, no aguardo de sua resposta, despeço-me


    R.
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  13. Olá, Roberta!

    Como eu havia te dito, nossa principal diferença está no significado que algumas palavras possuem em nossas mentes.

    Pelo que entendi, para você fé é a mesma coisa que uma convicção pessoal, seja ela qual for, baseada em evidências ou não. Mas é PRECISAMENTE neste ponto que discordamos completamente, pois tenho comigo que POR DEFINIÇÃO, FÉ, é uma crença em algo SEM EVIDÊNCIAS. Ora, se houvessem evidências, não haveria a necessidade de se ter fé, bastaria aceitá-las e fazer juízo racional das coisas.

    Fé é o estado psicológico necessário para se aceitar alguma coisa como verdadeira, quando NÃO EXISTEM evidências suficientes para garantir que ela seja real. É um sentimento de confiança que se deposita em alguma coisa e se houvessem evidências não seria necessário se depositar confiança.

    Eu confesso que não conheço a fonte de onde você possa ter tirado esta sua definição da palavra Fé, mas estou totalmente seguro de que não é o que as pessoas querem dizer quando usam a palavra. Pra mim, quando você diz coisas como “em nenhum momento é dito que essa exposição de idéia é obtida sem prova.”, está simplesmente invertendo o significado da palavra Fé.

    Fé não se trata de defender as coisas mediante provas, o nome disso é ceticismo, que é justamente o fenômeno psicológico inverso ao da fé. Quem é cético, o é justamente por não ter fé e precisar de evidências para sustentar suas crenças.

    Em quase todas as esferas da vida, as pessoas formam suas convicções pessoais baseadas naquilo que conheceram, e lhes pareceram evidências suficientes para sustentar suas convicções pessoais. Entretanto, em alguns momentos, irracionalmente, o homem aceita como verdade aquilo para o qual não possui evidência, por qualquer motivo psicológico que seja.

    Como eu já disse em minha introdução, nem sempre acreditar no improvável (ter fé) é algo ruim, muito pelo contrário. O grande problema é ter uma convicção tão grande no improvável a ponto de se fechar para evidências do contrário, mesmo quando elas estão cristalinamente claras.

    Para mim, isso não pode ter outro nome do que burrice. Ou ingenuidade, para não parecer agressivo. E ingenuidade não pode ser vista como uma virtude. A não ser que você ache que ignorância possa ser algo bom, o que não seria coerente vindo de uma educadora, que em tese, teria a principal missão em vida o combate a ela.

    De fato, minha intenção não é chocar quando dou exemplos como os que citei em minha réplica, mas eles acabam chocando, justamente por que são verdadeiros.

    Se uma pessoa acredita que é possível que ela, ou alguém que ela goste, possa passar uma ETERNIDADE de sofrimento no inferno, então não há absolutamente nenhum tipo de sofrimento que esta pessoa sofra em vida que possa ser pior do que isso. Por pior que seja a violação moral ou sexual, ela não é nada comparada com o inferno, onde o abuso não tem hora para terminar.

    E que bom que o Deus do novo testamento mudou de ideia e resolveu perdoar todo mundo, menos aqueles que negam o Espírito Santo.

    Mas o grande pilar de toda filosofia honesta é justamente aceitar, intelectualmente todas as possibilidades, para que se possa refletir sobre elas sem um juízo prévio.

    Como se pode conhecer a verdade se você já parte de pressupostos invioláveis?

    Exatamente por isso, a ideia de BLASFÊMIA é a concepção dogmática mais anti-filosófica já criada por uma religião.
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  14. Não é a toa que vários filósofos iluministas dissertaram a respeito da enorme diferença que existe entre “verdade descoberta” e “verdade revelada” e não há nenhum mito nisto. Mito é justamente o universo criado a partir de “verdades reveladas”, alcançadas através de fenômenos sobrenaturais que apenas algumas pessoas são “escolhidas” para vivenciar.

    E quando você acredita que é possível que você, ou as pessoas que você conhece passem uma eternidade de sofrimento no inferno, é natural que você tente convencer as pessoas a fazer o necessário para evitar isso. O contrário seria ser indiferente com o destino das pessoas e não se importar se elas se prejudicam.

    Exatamente por isso, eu acho que eles estão certos em agir como agem, tentando converter as pessoas a suas “verdades”. O único problema da questão toda é que esta verdade que está sendo defendida não é uma verdade baseada em evidências, portanto não é racional.

    E quem espalha irracionalidade, contribui para a ignorância das pessoas. E qualquer um que se coloque como compromissado com a educação e almeje ser um instrumento de mudança para a realidade, jamais aceitaria a ideia de não interferir no processo que faz com que as pessoas à sua volta permaneçam enclausuradas em suas próprias ignorâncias.

    Um debate pode ter vários objetivos, dependendo da forma como é realizado. O objetivo dos debates relatados nos diálogos Socráticos, por exemplo, era justamente o de tentar chegar à verdade sobre algum assunto. A isso se dá o nome de dialética. Embora muita gente seja incapaz de mudar de ideia, a forma como a conversa é conduzida pode mostrar a lógica de várias possíveis argumentações, fazendo com que as pessoas reflitam melhor sobre suas próprias convicções iniciais.

    Para mim, “respeitar a crença alheia” é exatamente a mesma coisa que ser conivente com a ignorância, mesmo quando ela é a principal causadora de conflitos e segregações entre os seres humanos.

    Foi exatamente isso que fizeram todos as personalidades que agiram como elementos transformadores ao longo da história, quando produziram algum tipo de conhecimento que contrariava a crença das pessoas de sua época. O principal fundamento por trás de todo o processo científico é o de justamente não respeitar as crenças das pessoas. Exatamente por isso tudo é sujeito a inúmeros testes e aberto a infinitas possibilidades de refutação.

    O mesmo jamais poderia acontecer com o conhecimento religioso, que mudou apenas a duras custas e de forma extremamente lenta. A grande igreja, mãe de todos e detentora de todas as respostas perdeu quase todo seu imenso poder quando o homem descobriu que o método que ela utilizava não era adequado para se responder questões a respeito do mundo natural e não é de se espantar que ela tenha que infundir a ideia de que o conflito entre ciência e religião é apenas um “mito”, quando é simplesmente a causa maior de toda segregação gerada entre seres humanos.

    A mesma coisa é dizer que não existem fatores religiosos envolvidos nos conflitos da Palestina, ou que ateus conseguiriam ser eleitos em importantes cargos políticos no Brasil.

    Eu não sei se você soube, mas fizeram uma pesquisa revelando o preconceito das pessoas com relação à figuras públicas. A pesquisa mostrou o que todo mundo esperava: as pessoas têm uma tendência a rejeitar votar em pessoas públicas que fazem parte de grupos sujeitos a discriminação, como mulheres, negros ou homossexuais. O que pouca gente esperava era que a rejeição em relação a possíveis candidatos ateus, que foi imensamente superior a qualquer outro grupo, chegando a 99% de rejeição.

    Além disso, qualquer um que resolveu assumir-se ateu publicamente sabe muito bem das implicações familiares e profissionais deste tipo de conduta em um país como um nosso, quem dirá em outro onde a influência religiosa é ainda maior. Dizer que este preconceito não existe chega a ser uma ofensa para quem sofre na pele, todos os dias, este tipo de coisa.
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  15. Em Matemática, assim como em qualquer outra coisa na vida, um resultado não surge do nada. O meio utilizado para se chegar à resposta é o fator mais importante de todos, pois é justamente a partir dele que saberemos o quão apurada foi a análise.

    Milhares de pessoas sofrem de doenças, cujo tratamento pode receber inúmeras contribuições de pesquisas com células tronco. O fato de alguém cismar que isso não deve ser feito por algum motivo sobrenatural não tem repercussões apenas em sua vida, mas destrói o sonho de cura de milhares de outras pessoas.

    Você citou o nome de alguns cientistas que eram religiosos para sustentar seu argumento de que “a fé não é inimiga da ciência”. Mas em nenhum dos casos que você citou cientistas que usaram “fé” para provar seus argumentos, muito pelo contrário. O método pelo qual a se chega a verdades a partir da fé é extremamente diferente do método pelo qual se chega a verdades a partir da ciência e compreender isso é fundamental para que se possa realmente compreender realmente o que é ciência.

    Agora esta questão da “contextualização” é a desculpa mais utilizada pelos apolegetas religiosos para justificar os absurdos das escrituras sagradas. Você vai me desculpar, mas não me parece nenhum pouco racional imaginar que existe um “contexto” onde seja justo um rei punir com a morte todos os que o criticam. Eu sei que para justificar uma coisa dessas seria necessário um malabarismo retórico tremendo, associado a uma imensa vontade de acreditar e proteger a fé cristã, o que definitivamente, eu não tenho.

    Mas uma coisa que esta sua réplica definitivamente me provou é que, de fato, o tema a que nos dispomos a discutir é de fato, um tabu, mesmo entre as pessoas que se dizem “não religiosas”, quando você insiste em afirmar que não quer discutir religião, quando eu não vejo absolutamente outra saída a não ser discutir isso, quando se fala a respeito de um tema como este. Exatamente por isso, agradeço sua paciência até o momento.

    Mas para evitar essas intransponíveis barreiras linguísticas que parecem ter se formado em nossas formas de pensar, devido ao significado que demos a algumas palavras, vou tentar contorná-los refazendo as questões principais do duelo usando outros termos. Espero que ao fazer isso, deixe mais claro os pontos principais que estou tentando discutir e também saber mais a respeito de sua opinião a respeito deles.

    Como educadora, você não acha que a ignorância deve ser combatida? Ainda mais quando ela está associada a atitudes discriminatórias? Para você, qual é a importância do ceticismo para a investigação pessoal e também para o estudo da natureza? Você acha que um conhecimento que não é legitimado por evidências é um conhecimento seguro?

    E por fim... Você acha que a irracionalidade pode ser útil para a humanidade?

    Espero sua resposta para que possa concluir esta profunda discussão.

    Até a próxima!

    Chico Sofista.
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  16. Olá, Chico!



    Analisando nosso diálogo, percebo que enquanto respondo pela ótica da fé filosófica, você se pauta no aspecto da fé religiosa, este, enquanto fenômeno sociológico. È claro que haverá rupturas de pensamentos, mas isso não quer dizer (necessariamente) que há alguém errado em seus posicionamentos, é segundo minha interpretação, apenas um diferente ponto de vista: não há inversão de significados, apenas uma abrangência do que é conceituado.


    E por isso, chegamos num impasse, porque insisto na concepção mais ampla da palavra - assuntível enquanto convicção pessoal, baseada em evidências lógicas e percepções particulares. È um produto subjetivo, de resultado individual, por esse motivo não acredito que ela possa ser atribuída à ingenuidade. Podem não concordar com as evidências apresentadas, mas isso não tira o mérito ou legitimidade, porque isso iria contra a individualidade, e ninguém quer parecer um ditador, não é mesmo?


    Particularmente tenho dificuldade em assimilar o assunto, e por isso peço ajuda para entender o seu conceito, fazendo uma associação ‘simples’: sou corinthiana, que é o máximo que me permito de uma “experiência religiosa”, e ontem tivemos um jogo decisivo. Nos milhares de torcedores que lá estavam não havia quem duvidasse da vitória, correto? Em meu entendimento, esse é um exemplo prático do que é ter fé, mas, mesmo acreditando, houve sofrimento, dúvida, medo... È contraditório duvidar e ter fé ao mesmo tempo, e por isso aqui preciso de um esclarecimento.


    Você, com freqüência afirma que ter fé é acreditar piamente em algo. Acredito que seja esse ‘algo’ englobe todos os aspectos (deus, ideologia, personagem, sentimento...) Se essa for a concepção da palavra, só posso acreditar que ela não existe, por não conhecer nenhuma pessoa que tenha uma convicção inabalável. Todos têm dúvidas, todo mundo questiona seu ponto de vista, até como manutenção daquilo que defende. Ou seja, sentimentos como esperança e sua antítese, o desânimo, são comuns aos humanos, o que invalidaria a sentença da confiança absoluta.
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  17. Não considero nada ruim acreditar em algo, mesmo que aparentemente aquilo se mostre improvável. E a isso nomeio por esperança, se o meio de sua obtenção for de outra pessoa que não si mesmo, e autoconfiança, quando só depende de seu próprio esforço. Não pode ser considerada burrice, é apenas uma forma de encarar a vida.


    Os exemplos que levantou não chocam por serem verdadeiros, e sim por sua aparência cruel. Não pensei na ETERNIDADE do sofrimento no INFERNO, primeiro por não saber da existência destes dois conceitos, e segundo porque priorizo aquilo que tenho controle, que é o aqui, o agora, o que é físico, material, palpável. Isso não me torna alguém sem fé, sou apenas alguém sem a necessidade de levantar uma bandeira religiosa. E por não ter essa necessidade de rótulos, que questiono a relevância de se discutir a finalidade da fé. Enfim, vamos ao próximo item:
    Não sou uma historiadora, mas sei que a Bíblia católica é uma obra composta de setenta e três livros individuais, escritos em dois (ou possivelmente três) continentes, em ao menos, três idiomas diferentes, através de um período de aproximadamente 1500 anos, por mais de 40 autores (vindos de diferentes atividades e ofícios), portanto, é mais do que compreensível que haja enganos de interpretação e tradução, o que resultaria em contradições. A Bíblia, como a História ocidental é separada pelo nascimento de Cristo, e esse livro narra, segundo seus seguidores, toda a história, esta revelada por Deus. No antigo testamento é contado a origem dos costumes judaicos, e com esse registro histórico é possível entender as distorções que povos como fariseus faziam em relação a lei. Já no novo testamento é apresentado a forma do ‘Messias’, seu local de nascimento, julgamento, morte e ressurreição.

    Não vejo que Deus tenha mudado de idéia: antes o povo vivia pela lei, com a nova aliança, esta com a oferta de seu filho em sacrifício, o homem vive pela graça. A graça tem tantas conseqüências quanto a lei. Na concepção cristã, aquilo que é errado continua sendo errado e certo continua sendo certo. Como não se percebe as conseqüências de forma imediata, temos a impressão de achar que o tempo da graça é mais flexível do que o tempo da lei, o que segundo os estudiosos é um erro.


    Absolutismos são nefastos, e por isso, concordo com você sobre o possível malefício da crença, enquanto a única verdade. Por isso vejo com gratidão movimentos sociais como o Iluminismo. Não considero certo que se convença ninguém a nada, o máximo que se é permitido é uma apresentação de hipótese, essa, livre da contaminação da opinião pessoal. Caberá a cada pessoa fazer o juízo de valor, e refutar, se for o caso, aquilo que foi apresentado. Mas, infelizmente não é isso que acontece: pessoas querem impor seu ponto de vista, seja no campo religioso, ideológico, partidário... Vemos exemplos de intolerância em cada esquina, mas isso não é reflexo da fé, e sim, da prepotência humana. Não é obra da irracionalidade, e sim, da vaidade contida daqueles que acreditam dominar um fato.
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  18. E por ser uma educadora progressista, adepta da teoria do desenvolvimento humano é que não interfiro em aspectos que são de cunho pessoal. Religião não se aprende na escola, e não é também na escola que ela será experimentada. Talvez fosse necessário distinguir laicidade do laicismo.


    Sobre a questão da Palestina é evidente que foram utilizados fatores religiosos para o convencimento de uma parcela da população, como também na Inquisição, Cruzadas, Segunda Guerra Mundial, e também quando em processos eleitorais, a perseguição aos ateus, ou, adeptos de alguma religião considera satânica, como candomblé e umbanda. Mas sabemos que isso é apenas uma desculpa, o intuito é bem menos nobre. Tudo é política, e nisso está incluo guerras e religião.


    Tem razão, em Matemática (como qualquer outro aspecto da vida) o resultado não é obra do acaso. E é exatamente por isso que citei Newton, que foi um dos defensores do Iluminismo. Ele usou de sua fé para legitimar esse movimento.


    Sobre a contextualização, não há como negar, ela de fato existe como justificativa, porém, ela não é a única explicação: a religião é uma criação humana, e como tal, passível de erros. Cabe lembrar também que ela, desde o seu início foi criada para a perpetuação de poder, e por conta disso, artifícios foram utilizados. Alguns foram manipulados, outros tantos, em benefício próprio, o que não traz a ninguém, isenção de responsabilidades.


    É evidente que a ignorância deva ser combatida. Mas para isso é necessário que o educando entenda a origem dos fatos, para se abolir o pré-conceito, e formar sua própria opinião. Por essa razão, cabe ao professor partir do que o aluno sabe/conhece. Penso que o ceticismo é um excelente ponto de partida: é preciso ter certa distância daquilo que não entendemos, e através de observações, experimentos e análises pessoais, ‘nascer’ um conhecimento mais refinado, este, filtrado das primeiras impressões. Nenhum conhecimento é absolutamente seguro, por isso a necessidade de contínua reavaliação, e não, em definitivo acredito na irracionalidade.


    No aguardo de sua finalização, despeço-me.

    R.
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  19. Olá, Roberta!

    Enfim, chegamos ao final da conversa.

    Gostei bastante dessa sua última participação, onde você levantou uma série de questões muito lúcidas. Eu nunca tinha visto alguém ser tão seguro de “meio termos” desde os debates antigos do Leonardo Levi.

    Não importa como você conceitue “fé”. Lembre-se que em minha introdução, deixei claro que estava me referindo a “fé” relacionada à crenças SEM BASE EM EVIDÊNCIA. E como fui eu quem começou o duelo, falar de outra coisa, por definição, é fugir do assunto.

    É extremamente óbvio que a forma como os religiosos resolvem reconhecer a realidade (a partir da fé), é diferente da forma de se conhecer a realidade de quem parte de um processo cético e fundamentado apenas na honestidade intelectual. Existe um limite muito bem definido até onde pode ir o ceticismo de um religioso.

    Toda opinião humana é resultado subjetivo de reflexão individual, e mesmo assim, é possível de se reconhecer quando uma opinião é baseada em evidências concretas ou em crenças ingênuas em fenômenos sobrenaturais, dos quais não se tem evidência da existência.

    Todas as ideias geradas pelos seres humanos estão em constante guerra para permanecerem existindo na cultura humana. Algumas ideias são mais úteis ou se reproduzem mais rapidamente e por isso acabam se tornando mais marcantes na cultura humana. Outras acabam sendo ultrapassadas e acabam sendo deletadas pela história, não sem antes ficar por um bom tempo beliscando e torturando a memória da civilização.

    Essa ideia de que alguém deve ser “livre” para ter sua própria opinião é totalmente utópica, por que no fim das contas, toda ideia terá um resultado prático importante para a sociedade e várias delas devem ser combatidas, para a manutenção da civilização.

    Alguns séculos atrás a ideia de que alguém poderia ser dono de outra pessoa era plenamente aceita como legítima e Deus nunca se importou em influenciar seus profetas a pensarem diferente, talvez por que achasse importante alguém viver como objeto, dependendo do “contexto” histórico que ele mesmo criou.

    Mesmo depois da abolição dos escravos, muita gente teve que lutar e morrer para mudar a ideia de que negros são inferiores a brancos. Foi necessário criminalizar o racismo para que os efeitos nefastos deste tipo de ideia na sociedade pudessem diminuir, ao ponto que existe hoje.

    Se hoje alguém é preso por que discriminou uma pessoa pela sua raça, até bem pouco tempo atrás, pessoas eram vendidas e abusadas durante todas as suas vidas e este tipo de “crença” era tido como legítimo pela sociedade da época.

    E mesmo sendo crime, a ideia da inferioridade do negro está implantada no subconsciente de várias pessoas na sociedade, mesmo a biologia tendo mostrado o contrário, repetidas vezes.

    Em alguns casos é necessário ser exatamente um ditador. Ninguém deve ter o direito de divulgar ideias discriminatórias que levam à incitação à marginalização de um grupo de pessoas e isso deveria ser inviolável.

    O grande problema em ser tolerante demais é justamente ser omisso em relação ao intolerável. É como ver uma mulher sendo estuprada e não fazer nada, para respeitar o “direito” do estuprador de acreditar que ele pode fazer o que quiser.

    E se o motivo do estupro fosse religioso? E se o estuprador alegasse que um anjo do céu apareceu para ele dizendo para ter à força a primeira mulher que encontrasse, pois dali seria gerada sua tribo sagrada, que seria eternamente protegida por Deus?

    Como é que alguém contrariaria suas crenças sem parecer um “ditador”?

    E lá vou eu dando exemplos “fortes” novamente... ;-) (Sorry)

    Desculpe-me a imaginação sádica. Mas ela em nada se compara a dos autores do velho testamento, cujos exemplos todas as pessoas tem o “direito” de seguir como quiserem, por que criticar este tipo de crença seria interferir nas ideias dos outros e ser intolerante.
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  20. É claro que existem vários tipos de “Corinthianos”. A maioria está lá apenas para se divertir em ver o time jogar, mas alguns estão para bater e matar torcedores de outros times. Se você achar que “tudo deve ser tolerado”, ninguém poderia falar nada em relação às ações criminosas desses fanáticos.

    Os torcedores esperam que seu time vença. A fé, neste sentido, relaciona-se a uma probabilidade de um evento acontecer no futuro. Não há nada de errado em se querer muito que um evento aconteça no futuro, justamente por isso somos capazes de sonhar e também de lutar por nossos sonhos.

    É bem diferente do cara que aposta todos os seus bens na ideia de que o
    Corinthians vai ser campeão da Libertadores.

    O que impede que uma pessoa faça isso é justamente o CETICISMO, nossa capacidade de filtrar os eventos da realidade e fazer um juízo baseado em comprovações, sob a ferramenta da dúvida.

    E isto é exatamente o OPOSTO do ato de se abraçar a realidade tal como ela lhe é apresentada, que é o que acontece quando se tem fé, seja em qualquer ideologia ou religião.

    Se existe alguma coisa que te impede de apostar tudo o que você tem nas vitórias do Corinthians ou de acreditar no slogan assassino de alguma torcida organizada é o seu senso crítico.

    E o estímulo à capacidade apurada de fazer perguntas do ser humano é uma atividade extremamente recente na cultura humana. Para manter-se, vai ter que competir com outras ideias muitas vezes antagônicas e também muito difundidas e rapidamente assimiladas, como as presentes nos slogans políticos e religiosos.

    A ideia de que obedecer sem fazer questões é uma virtude é extensamente difundida nos textos bíblicos, assim como a ideia de pobreza e tolerância a maus tratos de superiores. Daí a César o que é de César! Assuma passivamente a invasão de sua nação. Ao longo dos anos, este tipo de ideia ajudou a sustentar os pilares políticos da nossa civilização, onde a moral do servo, ignorante e obediente, tinha que ser vista como virtude pelo mesmo, para o bem da estrutura social vigente.

    Eu nunca te disse que “fé é acreditar piamente em algo”. Isso é sinônimo de convicção pessoal e o que estou tentando te dizer desde as outras participações é que Fé não é isso. Fé é apenas acreditar em algo improvável sem evidências que sustentem sua crença.

    Quanto à sua reflexão quanto às convicções humanas, acredito que, como moderada, você não consegue imaginar o quão inabaláveis podem elas podem se tornar. A dúvida é um dom de poucos. A maioria das pessoas prefere se contentar com as respostas mais convenientes, por não admitir viver sem respostas, sejam elas quais forem.

    Aquilo que você acredita define aquilo que você é. Guia todas as suas ações. Sendo assim, a crença de uma pessoa é justamente a característica mais fundamental para ser avaliada quando se pensa a respeito de relações entre as pessoas na sociedade. Não existe absolutamente nada mais importante do que isso.

    E quando as pessoas preferem acreditar em coisas que não são reais em detrimento àquelas que são, estão vivendo uma ilusão em massa que pode ter resultados extremamente nefastos para a raça humana.

    Como já dissemos várias vezes, nem sempre é ruim acreditar no improvável, ter esperança. O problema é achar que se sabe coisas das quais ninguém sabe a resposta. Fazer apostas insanas, saltos na escuridão.

    Eu iria adorar viver em mundo sem rótulos onde as pessoas pudessem se reconhecer simplesmente pelo fato de serem seres humanos, independente de serem católicos, muçulmanos, ateus, corinthianos ou marxistas.

    Mas a própria existência desses rótulos já é algo que, por definição, serve para segregar as pessoas, ainda mais quando se destinam a separar as pessoas por projetos individuais de moral absoluta.
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  21. Eu concordo contigo que o conhecimento não deve ser imposto as pessoas, que ao contrário, elas devam ser incentivadas a querer aprender e a investigar a verdade sobre as coisas, mesmo quando elas estão mascaradas pelas ilusões do senso comum.

    E acho ainda que a racionalidade deve ser disseminada da melhor forma possível, para imunizar a sociedade dos vírus das superstições.

    Quando isso acontecer, qualquer um será capaz de perceber a imensa contradição que existe em se aceitar a ideia de que somos criaturas de um ser que se apresentava como vingativo e cruel e que, de repente, faz o sacrifício de seu próprio filho em forma humana, como forma de mostrar (?) que esta representação foi um favor para a humanidade.

    Qual é o sentido de se acreditar que Jesus morreu por meus pecados se eu não tinha sequer nascido? Ainda assim, a ideia de que somos culpados pela morte do filho do altíssimo é amplamente difundida entre as pessoas.

    Se todos as pessoas de fé achassem que “a religião é uma criação humana, e como tal, passível de erros.”, eu concordaria contigo que este tipo de discussão não é fundamental. Mas é JUSTAMENTE pelo fato dessa ideia ter sido tão exageradamente negligenciada, que acho que este é um dos assuntos mais importantes para se discutir em um debate sobre ideias que podem ser boas para a sociedade.

    E por ter implicações pessoais e sentimentais extremamente profundas, pouca gente consegue conversar sobre isso de forma racional e educada, como foi realizada este duelo retórico.

    Agradeço sua participação e a dos leitores e espero suas considerações finais.

    Chico Sofista.
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  22. Oi, Chico, então finalizamos...
    Fico contente por ter apreciado minha participação, mesmo sendo a última. Meu maior temor era não ser compreendida em algum de meus posicionamentos. Além de (aparentemente) ter me feito clara, você faz um comentário onde correlaciona minha ponderação com a de Leonardo Levi – essa foi com certeza, a cereja do bolo, fazendo desse duelo em particular, motivo de alegria e orgulho e por essa razão, agradeço a maneira elegante e simpática que abordou o assunto.

    È claro que importa a forma que conceituo a fé. Foi essa a nossa grande diferença: quando disse que a mesma se dá através de evidência, mesmo que ela seja a outros olhos, considerada insuficiente, por isso acredito que não houve fuga do assunto, apenas uma dificuldade em assimilar a semântica do termo. Eu gostaria de continuar o assunto, uma vez que não entendi como uma idéia pode abalar uma civilização. A questão escravocrata em nada tem relação com os desígnios divinos, ela foi nada mais que uma interpretação humana, daqueles que mais podiam pleitear direitos que eram os abastados e letrados. Bob Dylan, racionalmente afirmou: “As pessoas não fazem aquilo que acreditam. Elas fazem o que é conveniente, e só então se arrependem”.

    Alias, a questão da escravidão é muito pouco entendida: a percepção de que senhores donos de milhares de escravos é uma generalização equivocada, bem como toda a idéia aqueles que foram “destinados” a essa função social. Se há até hoje ignorância acerca do assunto, sendo ele muito mais recente, imagine os enganos de interpretação que se comete em relação a um livro que conta com mais de mil anos de história?


    A questão da inferioridade entre índios (povo gentil), negros, mulheres, judeus, gays não está na explicação religiosa a sua lógica, e em Gênesis é isso bastante claro. O que acontece é que se utilizam os mais variados meios para legitimar um favorecimento, e que melhor explicação é a da vontade divina? E aqui voltamos a Idade Média onde a questão do reinado/pobreza estava, na linhagem em definitivo, determinada. Não havia discussão, e por isso, quase não existia revolta, até que surge entre eles, alguém com coragem de questionar fundamentais pontos, e assim, a fé foi rediscutida. Lutero fez da bíblia um livro mais acessível, e a teologia adotada era mais próxima da maioria da população. Mas, como a maioria dos líderes, o poder também o corrompeu. A corrupção e a má fé não podem ser atribuídas a Deus, e sim, a aquilo que chamamos por livre arbítrio.
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  23. Todo homem é livre, ao menos, em sua forma de pensar. Se suas idéias trarão algum resultado prático para alguém que não ele, é outra história, mas o que discuto é que nenhuma delas deverá ser combatida sobre o véu do ‘que pode acontecer’. Vou apresentar um exemplo bem atual: semanas atrás na Grécia o partido neonazista ( Chryssi Avgi - Crepúsculo Dourado) conquistou numerosas e importantes cadeiras no parlamento. Quando comentava o episódio em rodas de amigos, alguns questionavam sobre a ideologia defendida, se ela não deveria ter sido proibida, censurada, extinta... O que precisamos entender é que, por mais chocante que seja a opinião de alguém, não se pode proibir que a mesma se manifeste. O que deve ser garantido por lei é o direito de resposta, além da criminalização quando essa idéia torna uma forma física e ofensiva.

    O partido neonazista tem como justificativa o resgate da autoestima do povo que sofre com a quebra do país, e com a provável exclusão da Zona do Euro. Para isso, levantam a bandeira contra os 7% da população ( algo em torno de 10,5 milhões de imigrantes) que segundo afirmam, são mão de obra barata, e sem vínculos com o país. Isso não parece familiar? O levante nada tem relação com ideologia, religião ou comprovação estatística. È apenas uma desculpa para justificar uma ação que os beneficie. Porém, o mundo mudou, e absurdos acontecidos na Segunda Guerra, ou até essa última, dos Balcãs, não serão mais aceitos. Há organizações que fiscalizam, evidenciam e punem aqueles que praticam crimes contra a humanidade. Organização esta, sem nenhuma concepção religiosa.

    Agora, em relação ao preconceito atribuído a inferioridade do negro e da mulher, da desconfiança aos ateus e adeptos de religiões africanas, rejeição a gays, e a símbolos como suástica, tudo isso há cura, que é o esclarecimento. Mas para que a Educação seja eficiente, é preciso apresentar todo o histórico, suas causas e conseqüências. É necessário reconhecê-las e discuti-las, para evitar que ocorram novas situações de discriminação. O professor Luis Carlos de Menezes foi extremamente feliz quando afirmou que o preconceito não é obra de grupos sectários, como por exemplo, skinheads, pois surge, às vezes, da tola pretensão de valorizar a si mesmo ao depreciar diferentes escolhas religiosas, estéticas, desportivas ou musicais. Podendo se manifestar através do de humor, religião, estatísticas... Muitas formas de intolerância são resultados de posturas repetidas sem análise nas relações familiares e afetivas, por isso, cabe a cada um estimular a discussão e identificação em todos os meios. Quando o preconceito é demonstrado (vivenciado em pequena escala), haverá o constrangimento, e subseqüente, uma mudança de postura, por saber que julgamentos antecipados nem sempre são definitivos, assim como algumas afirmações científicas.
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  24. E aí está a importância de se valorizar a gama de crenças e culturas, para que de fato exista o questionamento. È fundamental que subsista o contraditório, para que, com isso floresça o mito da neutralidade absoluta, este, sem dúvida, minha mais almejada utopia. Por isso, em nenhum lugar do mundo seria aceitável que o estupro seja obra de alguma crença. Para isso existe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e é por isso que não aceito o rótulo de ser ‘tolerante demais’: ou se é tolerante, ou não é.~> Agora, confessa: fui bastante ditatorial nessa afirmação, não é? ;-)

    “Eu nunca te disse que “fé é acreditar piamente em algo”. Isso é sinônimo de convicção pessoal e o que estou tentando te dizer desde as outras participações é que Fé não é isso...”– sim, você disse. Ao menos em três diferentes situações. E aqui percebemos que damos significados diferentes para coisas iguais, mas, voltando a definição do que seja fé, sinto que o assunto não chegará numa conclusão, mas não há de minha parte, lamento: o pior de não se ter dúvida, é ter a certeza sobre todos os pontos.

    Concordo que o estímulo as indagações é um fenômeno recente, e acredito que esteja aí a explicação do número de pessoas consideradas moderadas não serem ainda, a maioria. Acredito que toda a sociedade ganhará com o espírito mais amigável e tolerante, tal qual um dia Gandhi defendeu em sua lei de ouro.

    São as posturas que se defende que define aquilo que se é. E o que guia nossas ações não é a crença em algo, e sim, sua própria consciência. Beethoven atribuía a Deus a consciência do homem, portanto, as escolhas erradas que se tomam não estão na religião a justificativa, e sim, da maneira que CONSCIENTEMENTE decidiu escolher, obedecendo vantagens pessoais. E é por isso que disse que não acreditava em ingenuidade no que diz respeito a fé. A fé não é uma obtenção ingênua, é resultado de ponderações e renúncias. E tão pouco é uma virtude, é apenas uma característica. De modo geral, repudio o valor superestimado do termo.


    E diferente de você, não gostaria de viver em um mundo sem rótulos. Seria mais feliz em um que eles não fariam grande diferença, e que estes humanos se reconheceriam como iguais, apesar de suas particulares características. Mas concordamos no poder da Educação para atribuir significado a sociedade.

    Sobre a questão do Cristianismo( bem como, de todas as outras agremiações religiosas), poderíamos conversar com mais tempo, numa outra oportunidade, mas, é importante lembrar que esta é apenas uma crença e em pouquíssimo tempo, nem será a mais numerosa. Quem sabe com essa nova discussão descobriremos uma maneira de fazer desse importante assunto para a luz da razão?

    Obrigada pela oportunidade de um debate tão enriquecedor e agradável, e no aguardo de futuras ( e promissoras ) conversas, finalizo minha participação.

    R.

25 comentários:

  1. Introdução 1

    Olá, Roberta!

    Desde já agradeço sua disposição em aceitar debater este tema tão profundo e também tão fundamental.

    Eu vou introduzir o tema tentando ser bem claro em relação àquilo que tem a ver com o tema que iremos discutir e também afastar tudo aquilo que não faz parte do que será discutido.

    A palavra “fé” é utilizada para dizer uma série de coisas, sendo que algumas delas são inquestionáveis.

    Quando dizem para alguém ter “fé em si mesmo”, por exemplo, não se está dizendo para a pessoa viver uma certeza ilusória, mas para ter uma atitude positiva frente ao incerto.

    É óbvio que isso é totalmente saudável e necessário. Todos deveriam ter este tipo de “fé”, pois é o que nos guia para um mundo melhor do que aquele que estamos vivendo.

    Em momentos de aflição, é importante ter uma atitude positiva frente ao incerto para que se possa superá-lo.

    Mas não é sobre este tipo de fé que eu quero discutir quando pergunto se é uma virtude ou uma ingenuidade.

    Eu me refiro à FÉ que permite as pessoas acreditarem em coisas, mesmo quando não possuem boas evidências para isso. Falo do tipo de FÉ que silencia o espírito questionador, por trazer respostas definitivas para questões que não sabemos a resposta.

    Falo da Fé que faz as pessoas acreditarem que sabem coisas que ninguém sabe ou negar evidências concretas por que são contrárias àquilo que elas resolveram aceitar como verdadeiro, baseado em uma confiança cega em algo que não tem uma explicação racional.

    Este tipo de mentalidade leva as pessoas a inferirem coisas bastante específicas sobre a natureza do cosmo, o que acontece após a morte ou a resposta definitiva para complicados dilemas morais.

    E isto leva à criação de sociedades onde os homens vivem suas vidas sonhando com o que vai acontecer quando ele receber 72 virgens no paraíso e o que deve fazer para alcançá-las.

    Outros defendem veementemente a existência de um sádico todo poderoso nos céus dizendo explicitamente o que as pessoas deveriam fazer para que sejam premiadas após a morte.

    Entretanto, não existe nenhuma boa evidência de que qualquer uma dessas coisas seja verdade e mesmo assim, as pessoas preferem acreditar nisso, do que naquilo que foi investigado, explorado, discutido e aceita mudar sua própria explicação.

    E as pessoas chegam a conclusões que não tem problema algum em se acreditar neste tipo de coisa, mesmo que não haja nenhuma justificativa racional para embasar a atitude. De que não se deve criticar aquilo que uma pessoa acredita.

    Bem, se fosse apenas uma crença, de fato, não haveria problema algum em dar a este tipo de fé todo o respeito que os fiéis querem, da mesma forma que se respeita o modo de se vestir de alguém, ou a forma como você decora sua casa.

    Mesmo que eu ache horroroso quando alguém se veste de forma ridícula, eu a respeitaria o suficiente para não dizer nada.

    Mas a fé religiosa é mais do que apenas uma crença. A ideia central em torno de toda a fé religiosa gira em torno da imposição de uma moralidade universal e por isso sempre atraiu o tipo de gente que acha que a vida dos outros é problema deles.

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  2. Introdução 2

    Respeitar este tipo de mentalidade é exatamente o que nos trouxe vários problemas que vivemos hoje. Ao fornecer à religião um crédito imerecido por aquilo que ela não é capaz de fazer, fechamos os olhos para àquilo que a fé religiosa realmente representa: a suspensão deliberada de uma descrença. É um ato de vontade, é uma escolha. Não é um “estado de graça” nem algo que apenas algumas pessoas podem experimentar.

    É a aceitação de uma explicação, mesmo que não existam boas provas para sustentá-la.

    Então por que este tipo de fé é mais merecedora de respeito que sua vontade em usar botas ou sandálias?

    E por que este tipo de fé é considerada algum tipo de “virtude”?

    Não ajuda a aprofundar nenhum tipo de conhecimento, muito pelo contrário. Ao propor que suas respostas são definitivas, ela simplesmente incentiva as pessoas a deixarem de fazer perguntas.

    Além disso, os impactos que este tipo de coisa pode provocar nas mentes das crianças são tremendos.

    Por isso eu acho que, de fato, devemos tratar a questão da fé religiosa com todo o respeito que ela merece, mas absolutamente nada além disso.

    O grande problema está em achar que ela merece mais repeito do que o que realmente merece.

    Mesmo por que, respeito é algo que se conquista. Tudo o que clama para si um “respeito inerente” pelo simples fato de ser como é, deveria ser alvo de críticas.

    Algumas coisas precisam ser criticadas e outras ridicularizadas para que as pessoas pensem melhor a respeito de suas posturas, afinal de contas, críticas são fundamentais para quem quer enxergar os próprios defeitos e aprender com eles.

    Todos sabem o que acontece com um estado quando ele proíbe as críticas a si mesmo, clamando para si um “respeito” na marra, imerecido. Também sabemos que isso acontece principalmente quando um estado quer impor seus ideais para a população, justamente por saber que o diálogo franco e aberto o impediria de agir como quer.

    Por que a religião teria esse direito? O que faz com que a religião seja algo que deva estar fora do escopo das críticas das pessoas, ao contrário de todas as outras instituições humanas? E mais... Será que dar este tipo de humanidade para este tipo de fonte de conhecimento é algo que pode ser útil para a humanidade?

    Mesmo que o Deus dos hebreus, tal como descrito na Bíblia realmente exista, ainda assim isso não seria motivo para seguir seus preceitos sem pensar antes em suas implicações.

    E se ele existisse, eu queria ouvir isso dele, de ninguém mais. Como é que eu posso acreditar que algo tão fundamental existe, baseado apenas no que dizem outras pessoas ou no que foi escrito séculos atrás, por culturas primitivas?

    Mas eu entendo muito bem por que as pessoas são tão atraídas por este tipo de conhecimento, pois é muito conveniente viver sua vida pautada em respostas prontas (por mais absurdas que elas possam ser) do que pautar sua vida na dúvida e na constante investigação.

    Tanto é que o ato de obter conhecimento a partir do questionamento e do acúmulo de evidências é um fenômeno bastante recente na história da humanidade e por isso, ainda está em fase de aceitação e assimilação da grande massa, que ainda permanece presa aos dogmas do senso comum, de uma vida sem reflexão.

    Mas uma coisas que todas as pessoas deveriam perceber é que não importa o tanto que você acredita em uma coisa, isso por si só, não vai fazer o que você acredita REAL.

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  3. Introdução 3

    Alguém pode muito bem ser hipnotizado para acreditar que é uma galinha, mas não pode esperar que todas as outras pessoas irão acreditar nisso, a não ser que ele mostre os ovos que está botando.

    Por essa e outras que eu não acredito que o Deus Hebreu, como descrito na Bíblia existe e por isso sou considerado por muitos um “ateu”.

    Para mim, “ateu” é uma palavra que não deveria nem existir, pois quando o ser humano chega ao ponto de embutir um nome em uma descrença, significa que acha que o certo seria que todos aceitassem a crença, o que, por si só, já é uma atitude discriminatória com quem não concorda em aceitar a crença.

    Eu prefiro me considerar um “Agnóstico Fundamentalista”.

    Em outras palavras, eu não sei. Eu não acho que ninguém mais também saiba alguma coisa e acho que todos os que não concordam comigo são um bando de infiéis hereges e malditos.

    Faz parte da natureza humana especular sobre as coisas que ele não conhece, mesmo por que, imaginar respostas para as coisas faz parte do processo que vai um dia levar à verdadeira resposta.

    Mas também faz parte da natureza humana aceitar essas respostas, ainda que incompletas ou sem evidências que as sustentem. Em alguns casos, são capazes de morrer por essas ideias formadas, sem nenhuma comprovação de que elas são, de fato, reais.

    Da mesma forma que o espírito investigativo parece fazer parte da natureza humana, também parece existir uma tendência de que as pessoas continuem firmes acreditando nas mesmas coisas pelo resto de suas vidas.

    Por isso, as ideias que são colocadas nas mentes das pessoas durante os primeiros momentos de suas vidas são extremamente importantes para a formação do caráter das pessoas.

    Mesmo assim, no mundo moderno, é perfeitamente aceitável que alguém doutrine seus filhos na mais segregatória das atividades humanas. Ninguém vê com maus olhos o fato de que suas crianças serão submetidas a um processo de lavagem cerebral que acabará as tornando zumbis incapazes de questionar sobre as coisas, pois terão aprendido que o caminho para a salvação é a obediência, não a investigação.

    Este tipo de abuso não é só permitido, como é incentivado. Dinheiro público é gasto com este tipo de coisa.

    E ninguém percebe que este tipo de conduta causa muito mais mal para a sociedade que qualquer tipo de droga, ou de qualquer tipo de mal para o meio ambiente que as pessoas possam infligir.

    No oriente médio, gente com este tipo de mentalidade domina armamentos de destruição em massa.

    Certeza absoluta é uma droga que controla a vida das pessoas, mais que qualquer outro vício.

    Ela toma o lugar na mente que antes estaria ocupado pelo senso crítico e leva as pessoas a contaminarem o mundo com seus princípios invioláveis.

    Até a próxima.

    Chico Sofista.

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  4. Os agradecimentos são recíprocos, acredite. È um tema recorrente em minhas análises pessoais, onde acredito que com sua cooperação, chegarei a algumas sentenças, espero ser para você, também de alguma valia.

    Li com atenção sua introdução, em busca de pontos divergentes, e até acredito que haja alguns, mas a impressão que tive é que tanto eu quanto você somos pessoas em busca de respostas, e mais do que isso, somos pessoas com infinitas novas perguntas. È motivador (e até certo ponto, pretensioso) fazer alusão a campanha do Canal Futura: http://www.youtube.com/watch?v=EVmejcPkkjI&feature=related, mas, em suma, é exatamente o que trataremos aqui: não falaremos de certezas, e sim de motivações e dúvidas.

    São esses fatores que fazem o homem questionar, acreditar, refutar antigas verdades. E esses valores, acumulados também através de tradições, podem ser chamados por crença, mas, há algo que precisa ser dito: a fé, não está necessariamente está ligada a religião. Alias, é relativamente recente essa associação. A origem da palavra diz que fé é a firme convicção sobre algo seja ele, inanimado, uma corrente filosófica, uma posição pessoal. Pode ser nomeado, portanto, como (tentativa de) persuasão, quando uma idéia é colocada em coletivo, ou, juízo de valor, quando essas impressões são experimentadas individualmente. Mas, ao nomear por “fé”, simplifica um pouco a discussão, isso, claro, em minha opinião.

    Concordo com você quando diz o termo é utilizado em uma gama de coisas, e que algumas são inquestionáveis. Mencionou sobre a fé em si mesmo, e me lembrei de uma determinada aula, esta, em minha primeira graduação: na disciplina Filosofia da Educação, o professor explicou o termo “entusiasmo”, de raiz grega, que significa, segundo o mestre, ter um deus dentro de si. Gregos, como politeístas acreditavam em várias entidades, portanto, qualquer pessoa podia viver em comum união e transformar a natureza e seu cotidiano, com auxílio do sobrenatural. Assim, aquela que fosse entusiasmada por Héstia, seria uma boa esposa, por Eros, um motivado amante, Artemis, uma exímia caçadora, e assim por diante. Os gregos afirmavam acreditar que só os entusiasmados eram capazes de vencer os desafios diários, daí, a necessidade prática da coisa e aí, entra um importante viés do que pode ser fé: uma escolha condicionada a uma necessidade, uma muleta emocional...

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  5. Mas não é nisso que acredito.

    Acredito em auto-sugestão, em estímulos externos, em sentenças positivas, em atitudes proativas. Acredito nas convicções obtidas através da experimentação e profunda análise. Mas também acredito no homem, na matemática, na racionalidade. A fé, segundo minha ótica, é isso, e quero ver alguém questionar essa lógica e legitimidade.

    E é por isso que discordo da forma que o tema de nosso duelo foi colocado. Não considero que ter fé em algo possa ser considerado uma virtude, e muito menos, que seja postulada a hipótese da ingenuidade. Ter fé em algo é uma característica humana, tal qual todas as outras e não pode ser considerada régua moral, ou atestado de boa índole. Com sua prática outros humanos buscarão interações, e essa é sua única finalidade: a de saber que não estão sozinhos com uma determinada certeza. Isso engloba todas as motivações, e por ser tão abrangente, não posso aceitar o axioma da ingenuidade, por defender que, quem faz uma escolha, o faz obedecendo a um critério.

    Vou transcrever algo que disse relacionando a verdade:
    Há alguns dias o assunto era a avaliação, e os critérios, estes, subjetivos. Também foi discutido sobre o que é a verdade. Perguntei ao Caril se considerava a sua verdade a mais importante, e apesar de pensarmos diferentes, continuo com meu pensamento: para mim ela é sinônima de convicção pessoal. E se alguém defende uma ideia é porque a avaliou sob todos os prismas, refutando antigas hipóteses, elegendo outras tantas, até que fundisse num conceito particular. Por essa razão, tenho tanto apego/apreço por minhas crenças. Apesar da defesa ferrenha por tudo aquilo que acredito, entendo que ela pode não ser a única, ou a mais certa. E muito menos que ela esteja, de forma definitiva, estática.

    Crenças não são imutáveis, mas para que haja mudança, é necessária a apresentação de novos dados, estes, coerentes. Para que minha verdade seja transformada, é necessário que seja completamente convencida, até para que reveja posicionamentos... Isso é um processo educativo, essencialmente humano.

    No mundo, lidamos com o melhor uso das ideias. E o pensamento é aquilo que melhor nos define, é aquilo que nos personaliza. Pessoas matam e morrem - e não é só no sentido metafórico - por suas convicções, e ao optarem por isso, não é justo atribuir a ingenuidade como motivação. A isso, damos outro nome.
    Há claro, enganos. O que é também, algo natural. Afinal, o que pode ser mais falível que o homem? Mas eu acredito que em toda escolha, inclusive nas equivocadas, haverá o aprendizado, por isso, nada será em vão. Não adianta, não acredito em involuções humanas, e com essa afirmação exponho minha única fé inabalável.

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  6. Não gostaria de discutir a fé religiosa, até porque não comungo de nenhuma agremiação, e por não fazer parte, considero incoerente julgar. Mas, há um ponto que gostaria de abordar: não acho que se deva ter em relação a religião, respeito. Defendo que isso seja aplicado aos religiosos. O respeito não é algo que se conquista, e sim, aquilo que retribuímos. Deve partir do individual, depois, para o todo, e sinceramente, não entendo como isso deveria ser alvo de críticas.

    O preconceito e a intolerância nada mais são do que o uso da força frente a razão. Nenhuma entidade tem direito de sobrepujar, e essa deveria ser uma luta coletiva.

    Sobre crenças pessoais, eu não acredito no deus do antigo testamento. E muito menos, não confundiremos religião com comportamentos de rebanho. Muito do que é realizado em países africanos e do Oriente Médio são ‘legitimados’ pela tradição machista e patriarcal (mutilação genital, apedrejamento, atentado suicidas) .

    Gosto mais da visão do Novo Testamento, parece-me mais humano a reconciliação d’Ele com os homens, mas, apesar disso, não consegui até hoje encontrar um rótulo confortável para aquilo que sou (estou). Talvez o mistério é entender que classificações não são necessárias. Seria esse o tal ovo do Colombo?

    Finalizando minha primeira participação, também gostaria de questionar esse seu parágrafo:

    “Certeza absoluta é uma droga que controla a vida das pessoas, mais que qualquer outro vício. Ela toma o lugar na mente que antes estaria ocupado pelo senso crítico e leva as pessoas a contaminarem o mundo com seus princípios invioláveis.” – aqui você coloca como definitiva uma posição humana, como se fôssemos estáticos. Alias, pela concepção humanista o homem nunca é nada, já que está em constante formação, portanto, ele no máximo está. Entende esse raciocínio?


    E, por enquanto é isso. Espero ansiosa pelo desenrolar dessa discussão, de antemão, agradecendo a oportunidade.

    Att,

    R.

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  7. Réplica 1

    Saudações, Roberta!

    Como não podia deixar de ser, nossas primeiras contradições encontram-se justamente relacionadas a questões semânticas.

    Quando usamos alguma palavra, estamos tentando fazer uma representação de uma ideia que carrega uma série de conceitos.

    E de fato, os conceitos básicos que estamos discutindo aqui são “certezas”, “motivações” e “dúvidas”, como você bem destacou.

    A palavra “FÉ”, como você disse, não está necessariamente está ligada a religião, mas ela não significa apenas “uma firme convicção sobre algo”, mas também a uma convicção SEM PROVA OU CRITÉRIO OBJETIVO DE VERIFICAÇÃO, dependente da CONFIANÇA que é depositada na ideia, tanto é que se relaciona semanticamente aos verbos crer, acreditar, confiar e apostar.

    A fé é justamente o fenômeno psicológico conceitualmente antagônico ao da DÚVIDA, e por isso É IMPOSSÍVEL DUVIDAR E TER FÉ AO MESMO TEMPO. Ter “fé” em algo significa justamente abandonar a dúvida.

    Quando debatemos sobre algum assunto, nós avaliamos as razões uns dos outros. Pensamos, comparamos, criticamos, enfim, pensamos nas diversas formas de se resolver uma questão.

    Se suas razões são boas o suficiente para defender o que você defende, eu ficarei sem meios lógicos de discordar de você e não terei opções, a não ser acreditar no que você acredita.

    A razão é contagiosa e é possível reconhecê-la na discussão aberta e honesta de ideias.

    Por isso, se o objetivo de um debate é se chegar à verdade sobre algum assunto, nós não devemos “respeitar a crença dos outros”, nós devemos avaliar suas razões.

    E é mostrando para as pessoas onde o raciocínio delas está errado que se muda o mundo, pouco a pouco.

    Mas você sabe disso muito bem disso.

    E é justamente por não respeitar o que seus alunos sabem de matemática que você mostra para eles como eles são ignorantes, toda vez que demonstra que existiam formas de raciocinar que eles ainda não conheciam.

    Se algum aluno discordar de alguma coisa que um professor diz, deve ser baseado em uma lógica que sirva para todos, não em alguma ignorância que o impeça de aceitar uma lógica inversa ao que diz sua própria ilusão.

    Por isso, eu concordo totalmente contigo quando diz que,”quem faz uma escolha, o faz obedecendo a um critério”. E acrescento ainda que, se existe um critério, ele pode muito bem ser apresentado, usando a racionalidade, de forma que faça sentido para outras pessoas, não é?

    Imagine, por exemplo, que eu te digo que eu tenho um castelo cheio de tesouros enterrado no meu jardim.

    Aí, quando você me pergunta quais são os critérios que eu uso para dizer os motivos dessa minha escolha, imagine que eu te respondo coisas do tipo:

    _Saber da existência desse tesouro me dá grande entusiasmo para viver. Ou então, “Eu não conseguiria viver em um mundo onde não existe o tesouro enterrado em meu jardim”.

    Qualquer um que ouvisse esse tipo de respostas diria que se trata do discurso de um louco, ou de um retardado.

    Isso acontece por que, para todas as explicações que damos na vida, devemos mostrar qual é o critério que usamos para justificar nossas crenças. Isso serve para absolutamente tudo na vida, mas as pessoas fecham os olhos quando o assunto é religião.

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  8. Réplica 2

    Eu fui bastante incisivo e direto na crítica específica à fé religiosa em minha introdução, ao que você foi enfática ao defender a ideia de que “religião não se discute” ou “cada um tem sua fé”, que são justamente os argumentos que encerram qualquer discussão a respeito desse assunto.

    Por isso, o que eu quero mostrar é que não faz o menor sentido que o mesmo critério que nós utilizamos para avaliar todas as nossas escolhas na vida seja negligenciado, quando o assunto é justamente o mais fundamental de toda nossa existência.

    Esse mesmo discurso é frequentemente utilizado pelos “cristãos moderados”, que são aqueles que não seguem ao pé da letra o que dizem as escrituras, mas acham que a fé religiosa representa algo bom para as pessoas e para as sociedades, sendo portanto coisas que não deveriam ser criticadas.

    Eu tenho várias críticas a serem feitas a este tipo de postura e é nisto que vou focar a minha réplica.

    Você falou em sua introdução de como você constrói suas convicções pessoais.

    Já refletiu a respeito de como as outras pessoas formam suas convicções pessoais? Será que as pessoas são criteriosas ao selecionar aquilo que elas têm por verdadeiro ou falso?

    E mais. Será que não é extremamente importante saber como as pessoas constroem suas convicções pessoais?

    Crenças são representações do mundo, o que é muito diferente de uma esperança, por exemplo.

    Quando alguém tem esperança em algo, tem a representação de uma POSSIBILIDADE do mundo. Já a crença traz uma série de transformações fisiológicas e comportamentais que irão alterar completamente a forma como a pessoa vivencia a realidade.

    Além disso, eu acredito que a forma como nós enxergamos as crenças uns dos outros nunca foi tão importante para a história da humanidade quanto tem sido atualmente.

    A manutenção de nossa civilização nunca esteve tão ameaçada por este fator e não existe nada em nosso poder tão importante do que este tipo de debate.

    Sendo assim, a forma como nós criticamos ou deixamos de criticar as crenças uns dos outros pode determinar o destino de toda a humanidade.

    O mundo encontra-se em guerra de dogmas incompatíveis: Cristãos X Muçulmanos X Judeus.

    Eu não vejo nenhuma razão para que sobrevivamos aos nossos conflitos religiosos indefinidamente e por isso eu acho que é extremamente importante este tipo de debate, principalmente onde ele ainda não é permitido.

    E justamente pelo fato da ideia de que “crenças devem ser respeitadas”, que estamos construindo uma sociedade baseada na ignorância.

    O número de evangélicos cresce no Brasil e com eles o número de pessoas que é a favor do ensino de criacionismo nas escolas ao invés de evolucionismo.

    Acreditar por exemplo, que o Deus Bíblico literalmente prometeu a terra de Israel ao judeus traz inúmeras consequências geopolíticas.

    Não é algo que podemos fechar os olhos e dizer “cada um que acredite naquilo que achar melhor”. Mesmo por que, esta é justamente a função do professor, não é?

    Mostrar, através da razão, o que é coerente, independentemente das suas opiniões prévias a respeito do assunto.

    Você poderia argumentar que o problema todo é educacional e não religioso.

    Mas grande parte das pessoas que se opõe à pesquisa com células tronco, por exemplo, são pessoas muito bem instruídas. Muitos fundamentalistas religiosos envolvidos em ataques terroristas são engenheiros ou arquitetos.

    É por causa desta visão medieval de que a alma entra no corpo a partir da concepção, que para eles é a fecundação, que um monte de células em uma placa de Petri merecem o mesmo tipo de preocupação moral que uma menina de seis anos com diabetes, ou um homem de 40 com Parkinson.

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  9. Réplica 3

    No fim das contas,todo este discurso politicamente correto dos moderados, de que “todos devem ser livres para acreditar no que quiser”, mostra-se intrinsecamente paradoxal.

    Para encerrar esta questão, me parece que muita gente, bem intencionada, inclusive, passa a acreditar que crenças são particulares e não causam mal a ninguém.

    Por ver com maus olhos críticas ao extremismo religioso, os moderados dão cobertura para que os fundamentalistas continuem cometendo seus absurdos.

    Justamente pela existência desse tipo de ideia, que é um tabu criticar religião.

    Apenas um suicida profissional ou político sairia defendendo abertamente ideias que confrontassem diretamente ideais defendidos pela maioria dos religiosos de sua região.

    E é claro, isso limita absurdamente a honestidade intelectual das pessoas, pois todos tendem a não externar pensamentos que fariam com que as outras pessoas fizessem um mal julgamento de sua pessoa.

    Além disso, eu defendo a ideia de que os religiosos fundamentalistas, ao contrário da maioria dos moderados, REALMENTE leram as escrituras e interpretaram certo.

    Esses livros são, de fato, segregatórios e intolerantes, como defendem os fundamentalistas.

    Uma vez que alguém ache legítima a afirmação de que esses livros são mais importantes que quaisquer outros livros e representam o que há de melhor em termos morais para serem seguidos por uma nação, nós nos tornamos refém de seus conteúdos.

    O criador do universo, de fato, odeia homossexuais. Está em Levíticos e para quem acha que o livro “bom” é o novo testamento, também está também lá em Romanos.

    Existem várias parábolas interessantes de Jesus Cristo. Várias delas pregavam princípios de solidariedade e humanismo, mas se você ler Lucas 19, por exemplo, vai ver uma estória que Jesus conta a respeito de um Rei, que era criticado por parte dos seus súditos, que não confiavam nele. No fim da história, o Rei pede pela presença de todos os seus críticos e que fossem mortos em sua presença.

    É óbvio que este tipo de passagem com certeza serviu de inspiração para monarcas assassinos legitimarem suas atitudes sanguinárias. O mesmo vale para os inquisidores da idade média que queimaram as pessoas vivas durante 400 anos. Eles conseguiram legitimar seu comportamento, de acordo com o ministério de Jesus Cristo.

    São Tomás de Aquino era da opinião de que hereges deveriam ser mortos imediatamente, enquanto Santo Agostinho achava que eles deveriam ser torturados. E esses são maiores intelectuais, fundamentadores de toda a “filosofia” cristã.

    Olhando este tipo de coisa, alguém poderia dizer, mas estas pessoas são loucas! O que não é verdade. Este era o tipo de comportamento normativamente aceito como natural para a sociedade da época, dado o que as pessoas acreditavam.

    E de fato, se o que os livros sagrados dizem é verdade, então os fundamentalistas religiosos estão cobertos de razão.

    Pense bem. Existe algo que seu vizinho pode dizer para o seu filho que pode fazer com que ele passe a eternidade sofrendo no inferno. Isso é muito pior do que molestação sexual.

    Eu acho que o grande problema do discurso moderado é que muitas pessoas se esquecem do quão fanáticas e idiotas, as pessoas conseguem ser.

    Você havia dito que “Crenças não são imutáveis, mas para que haja mudança, é necessária a apresentação de novos dados, estes, coerentes.” , o que é verdade e é diferente de “Fé”, pois esta não muda por causa da apresentação de novos dados, pois é um estado emocional, não racional, de apego a uma ideia, ainda que não existam evidências para sustentar a sua crença.

    Eu concordo contigo que crenças não precisam ser estáticas, mas é o que são, quando são fundamentadas em dogmas.

    E é exatamente por isso que eu acho que a “fé religiosa” não pode ficar fora da questão e não pode jamais ser vista como algo que é “incoerente de se julgar”, mesmo por que, é a mais importante para a formação dos valores de um povo.

    Até mais!

    Chico Sofista.

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  10. Por conta de meus compromissos familiares, não pude responder com a urgência que o assunto exigia, e por isso, peço desculpas. Por outro lado, isso para mim não foi tão ruim já que tive mais tempo para análise de seu discurso: é preciso elogiar a forma linear que apresenta os argumentos, foi agradavelmente coeso, além demonstrar em seu texto, preocupação estética, ou seja, tenho poucas coisas a questionar e/ ou contribuir.

    Mas há algo que gostaria que me explicasse: afirmou que nossas divergências começavam na semântica, e confesso que isso me deixou em dúvida: classificou-me como contraditória enquanto sinônimo de antonímia?

    E ficamos nesse dilema do que seja fé, onde acredito que a definição é plural, mas, em nenhum momento é dito que essa exposição de idéia é obtida sem prova. As análises individuais não são os únicos “instrumentos” de verificação de algo, vide o empirismo.

    Filosoficamente falando, não posso aceitar a afirmação “é impossível duvidar e ter fé ao mesmo tempo”, por estar na dúvida (questionamento) aquilo que faz do homem, homem: animal questionador e objeto em constante formação. Portanto, aceitar essa oração seria negar todas as convicções pessoais, o que na minha concepção, faria de qualquer pessoa uma espécie de zumbi, que age sem critérios, análises, avaliações... Por essa razão, reafirmo que a fé não pode ser classificada como virtude, muito menos se a mesma for a da ingenuidade. Posso até não concordar nos instrumentos escolhidos pela manutenção (ou negação) da fé, porém negá-los seria ridicularizar/menosprezar a individualidade humana.

    Apesar de concordar em grande parte daquilo que escreveu, discordo veemente na máxima que as minhas razões servirão de convencimento a alguém. Não há de minha parte interesse em “converter” ninguém a minha crença, portanto, sempre haverá a opção de continuar na sua forma original com suas dúvidas e questionamentos, sem que isso abale minha psique.

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  11. O objetivo de qualquer debate não é chegar a verdade, uma vez que ela não é única. Debatedores praticam um exercício retórico, de preferência amigável, onde desejam expor uma ideia, sem a necessidade de prevalecer o seu ponto de vista. È uma busca de respostas, ou, quando com sorte, de novas dúvidas. Sobre o nosso tema, Chico, sou da opinião que há sim de se respeitar a crença alheia, e que não podemos agir enquanto juiz da razão dessa escolha. O máximo que nos é permitido é entender o processo que se deu essa escolha.

    Ninguém é uma folha em branco, por essa razão, bons professores respeitam o que o aluno sabe. E respeitam mais ainda aquilo que aparentemente não sabem. Cabe ao educador entender a forma que o educando raciocina e a partir daí, montar uma estratégia para que ele assimile um conteúdo com maior tranqüilidade. Por isso, quando um aluno discorda da metodologia do professor, cabe ao mestre, investigar a lógica, mesmo que inversa. Em Matemática, bem como na vida, não importa o meio que se utiliza para chegar a uma resposta, o que vale é o resultado.

    Entendo perfeitamente a importância da dissecação de órgãos, mas gostaria de entender a necessidade disso quando analisamos opiniões pessoais. Qual é aplicabilidade de mostrar os critérios que justificam nossas crenças? Acredito que essa busca por respostas serviu como desculpa para toda sorte de conchavos humanos. Não questionarei a analogia do tesouro- mesmo considerando-a rica em simbologias - por ela estar ligada naquilo que prefiro não debater, que é a religião, mas, sendo objetiva afirmo que ninguém questionaria a existência desse tesouro, por ele ter valor apenas a pessoa que afirma pertencer.

    Tudo pode ser discutido, se obedecer ao critério do respeito. Mas, o que nos diferencia é que não tenho a necessidade de impor minha racionalidade/ credulidade a ninguém. Por isso tenho a fala moderada, mesmo não me considerando cristã.

    E sim, já refleti sobre minhas convicções, e exatamente por não ter chegado a um ponto específico, que continuo nesse exercício. E é claro que as pessoas são criteriosas na seleção de suas convicções, o que pode acontecer é de não concordamos com a lógica aplicada. Crenças podem ser representações do mundo, mas é, essencialmente, manifestação individual.

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  12. Eu não entendo como a forma que enxergamos as crenças do outro pode ser importante para manutenção de nossa civilização. O planeta não está em guerra por motivações religiosas, e sim, políticas, e não haveria nenhum dogma incompatível, se houvessem nas pessoas o estímulo a tolerância, ética, ao respeito e aceitação ao diferente. “Crenças devem ser respeitadas” – sou de opinião que o mesmo é princípio fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e harmônica. A questão do estado de Israel é bem mais simples que se possa imaginar, numa outra oportunidade, se assim preferir, podemos voltar ao ponto.

    Como é de conhecimento, sou contrária ao ensino religioso na escola pública, e há sempre a necessidade de lembrar que a fé não é inimiga da ciência, é só lembrar dos grandes Stephen Hales, John Flamsteed, John Bartram, Roger Bacon, Isaac Newton, Louis Agassiz, Henry Schaefer, Arthur Schawlow, enfim, são vários bons exemplos. Acredito que essa crença é um mito nascido no Iluminismo. Citou, de maneira superficial algumas passagens bíblicas, mas não houve uma contextualização de sua parte, relativo ao momento histórico e modo de vida dos habitantes. De toda forma, não sou também uma especialista em escrituras, apenas uma leitora dos livros que compõe a bíblia, bem como, de outros documentos históricos, mas, nasceu um interesse de futuramente debater com você, o Novo Testamento, em especial, o evangelho de Lucas, esse seria, portanto, um convite que gostaria que aceitasse.

    Sei que não houve de sua parte a intenção de me chocar, mas, há trechos em sua treplica algo que me deixou extremamente desconfortável: usou da lógica afetiva para me convencer que algo que um ‘vizinho’ falasse ao meu filho seria pior que o abuso sexual. Como mãe, zelosa e com o instinto de proteção aguçado, fiquei atônica com a comparação: da saúde emocional, dos valores morais e éticos que ele fará uso, nenhum adulto conseguirá fazê-lo sofrer, pois aprenderá a ser autoconfiante, mas pensar na possibilidade da violência sexual, é de uma crueldade que poderia ter sido evitado em seu discurso, por saber que esse filho mencionado não é uma hipótese, e sim, um sujeito. Não somos, eu e ele, pessoas fictícias, e talvez por isso essa fala tenha me afetado tanto.

    Numa outra parte, também fez um comentário que julguei bastante infeliz: ‘apenas um suicida profissional ou político sairia defendendo abertamente ideias que confrontassem diretamente ideais defendidos pela maioria dos religiosos de sua região’, além de dizer que não concordo com tal sentença, afirmo que pessoas que defendem de forma independente e abertamente suas idéias, são notáveis e livres da censura local. Têm, portanto, minha admiração.


    Por enquanto é isso, no aguardo de sua resposta, despeço-me


    R.

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  13. Olá, Roberta!

    Como eu havia te dito, nossa principal diferença está no significado que algumas palavras possuem em nossas mentes.

    Pelo que entendi, para você fé é a mesma coisa que uma convicção pessoal, seja ela qual for, baseada em evidências ou não. Mas é PRECISAMENTE neste ponto que discordamos completamente, pois tenho comigo que POR DEFINIÇÃO, FÉ, é uma crença em algo SEM EVIDÊNCIAS. Ora, se houvessem evidências, não haveria a necessidade de se ter fé, bastaria aceitá-las e fazer juízo racional das coisas.

    Fé é o estado psicológico necessário para se aceitar alguma coisa como verdadeira, quando NÃO EXISTEM evidências suficientes para garantir que ela seja real. É um sentimento de confiança que se deposita em alguma coisa e se houvessem evidências não seria necessário se depositar confiança.

    Eu confesso que não conheço a fonte de onde você possa ter tirado esta sua definição da palavra Fé, mas estou totalmente seguro de que não é o que as pessoas querem dizer quando usam a palavra. Pra mim, quando você diz coisas como “em nenhum momento é dito que essa exposição de idéia é obtida sem prova.”, está simplesmente invertendo o significado da palavra Fé.

    Fé não se trata de defender as coisas mediante provas, o nome disso é ceticismo, que é justamente o fenômeno psicológico inverso ao da fé. Quem é cético, o é justamente por não ter fé e precisar de evidências para sustentar suas crenças.

    Em quase todas as esferas da vida, as pessoas formam suas convicções pessoais baseadas naquilo que conheceram, e lhes pareceram evidências suficientes para sustentar suas convicções pessoais. Entretanto, em alguns momentos, irracionalmente, o homem aceita como verdade aquilo para o qual não possui evidência, por qualquer motivo psicológico que seja.

    Como eu já disse em minha introdução, nem sempre acreditar no improvável (ter fé) é algo ruim, muito pelo contrário. O grande problema é ter uma convicção tão grande no improvável a ponto de se fechar para evidências do contrário, mesmo quando elas estão cristalinamente claras.

    Para mim, isso não pode ter outro nome do que burrice. Ou ingenuidade, para não parecer agressivo. E ingenuidade não pode ser vista como uma virtude. A não ser que você ache que ignorância possa ser algo bom, o que não seria coerente vindo de uma educadora, que em tese, teria a principal missão em vida o combate a ela.

    De fato, minha intenção não é chocar quando dou exemplos como os que citei em minha réplica, mas eles acabam chocando, justamente por que são verdadeiros.

    Se uma pessoa acredita que é possível que ela, ou alguém que ela goste, possa passar uma ETERNIDADE de sofrimento no inferno, então não há absolutamente nenhum tipo de sofrimento que esta pessoa sofra em vida que possa ser pior do que isso. Por pior que seja a violação moral ou sexual, ela não é nada comparada com o inferno, onde o abuso não tem hora para terminar.

    E que bom que o Deus do novo testamento mudou de ideia e resolveu perdoar todo mundo, menos aqueles que negam o Espírito Santo.

    Mas o grande pilar de toda filosofia honesta é justamente aceitar, intelectualmente todas as possibilidades, para que se possa refletir sobre elas sem um juízo prévio.

    Como se pode conhecer a verdade se você já parte de pressupostos invioláveis?

    Exatamente por isso, a ideia de BLASFÊMIA é a concepção dogmática mais anti-filosófica já criada por uma religião.

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  14. Não é a toa que vários filósofos iluministas dissertaram a respeito da enorme diferença que existe entre “verdade descoberta” e “verdade revelada” e não há nenhum mito nisto. Mito é justamente o universo criado a partir de “verdades reveladas”, alcançadas através de fenômenos sobrenaturais que apenas algumas pessoas são “escolhidas” para vivenciar.

    E quando você acredita que é possível que você, ou as pessoas que você conhece passem uma eternidade de sofrimento no inferno, é natural que você tente convencer as pessoas a fazer o necessário para evitar isso. O contrário seria ser indiferente com o destino das pessoas e não se importar se elas se prejudicam.

    Exatamente por isso, eu acho que eles estão certos em agir como agem, tentando converter as pessoas a suas “verdades”. O único problema da questão toda é que esta verdade que está sendo defendida não é uma verdade baseada em evidências, portanto não é racional.

    E quem espalha irracionalidade, contribui para a ignorância das pessoas. E qualquer um que se coloque como compromissado com a educação e almeje ser um instrumento de mudança para a realidade, jamais aceitaria a ideia de não interferir no processo que faz com que as pessoas à sua volta permaneçam enclausuradas em suas próprias ignorâncias.

    Um debate pode ter vários objetivos, dependendo da forma como é realizado. O objetivo dos debates relatados nos diálogos Socráticos, por exemplo, era justamente o de tentar chegar à verdade sobre algum assunto. A isso se dá o nome de dialética. Embora muita gente seja incapaz de mudar de ideia, a forma como a conversa é conduzida pode mostrar a lógica de várias possíveis argumentações, fazendo com que as pessoas reflitam melhor sobre suas próprias convicções iniciais.

    Para mim, “respeitar a crença alheia” é exatamente a mesma coisa que ser conivente com a ignorância, mesmo quando ela é a principal causadora de conflitos e segregações entre os seres humanos.

    Foi exatamente isso que fizeram todos as personalidades que agiram como elementos transformadores ao longo da história, quando produziram algum tipo de conhecimento que contrariava a crença das pessoas de sua época. O principal fundamento por trás de todo o processo científico é o de justamente não respeitar as crenças das pessoas. Exatamente por isso tudo é sujeito a inúmeros testes e aberto a infinitas possibilidades de refutação.

    O mesmo jamais poderia acontecer com o conhecimento religioso, que mudou apenas a duras custas e de forma extremamente lenta. A grande igreja, mãe de todos e detentora de todas as respostas perdeu quase todo seu imenso poder quando o homem descobriu que o método que ela utilizava não era adequado para se responder questões a respeito do mundo natural e não é de se espantar que ela tenha que infundir a ideia de que o conflito entre ciência e religião é apenas um “mito”, quando é simplesmente a causa maior de toda segregação gerada entre seres humanos.

    A mesma coisa é dizer que não existem fatores religiosos envolvidos nos conflitos da Palestina, ou que ateus conseguiriam ser eleitos em importantes cargos políticos no Brasil.

    Eu não sei se você soube, mas fizeram uma pesquisa revelando o preconceito das pessoas com relação à figuras públicas. A pesquisa mostrou o que todo mundo esperava: as pessoas têm uma tendência a rejeitar votar em pessoas públicas que fazem parte de grupos sujeitos a discriminação, como mulheres, negros ou homossexuais. O que pouca gente esperava era que a rejeição em relação a possíveis candidatos ateus, que foi imensamente superior a qualquer outro grupo, chegando a 99% de rejeição.

    Além disso, qualquer um que resolveu assumir-se ateu publicamente sabe muito bem das implicações familiares e profissionais deste tipo de conduta em um país como um nosso, quem dirá em outro onde a influência religiosa é ainda maior. Dizer que este preconceito não existe chega a ser uma ofensa para quem sofre na pele, todos os dias, este tipo de coisa.

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  15. Em Matemática, assim como em qualquer outra coisa na vida, um resultado não surge do nada. O meio utilizado para se chegar à resposta é o fator mais importante de todos, pois é justamente a partir dele que saberemos o quão apurada foi a análise.

    Milhares de pessoas sofrem de doenças, cujo tratamento pode receber inúmeras contribuições de pesquisas com células tronco. O fato de alguém cismar que isso não deve ser feito por algum motivo sobrenatural não tem repercussões apenas em sua vida, mas destrói o sonho de cura de milhares de outras pessoas.

    Você citou o nome de alguns cientistas que eram religiosos para sustentar seu argumento de que “a fé não é inimiga da ciência”. Mas em nenhum dos casos que você citou cientistas que usaram “fé” para provar seus argumentos, muito pelo contrário. O método pelo qual a se chega a verdades a partir da fé é extremamente diferente do método pelo qual se chega a verdades a partir da ciência e compreender isso é fundamental para que se possa realmente compreender realmente o que é ciência.

    Agora esta questão da “contextualização” é a desculpa mais utilizada pelos apolegetas religiosos para justificar os absurdos das escrituras sagradas. Você vai me desculpar, mas não me parece nenhum pouco racional imaginar que existe um “contexto” onde seja justo um rei punir com a morte todos os que o criticam. Eu sei que para justificar uma coisa dessas seria necessário um malabarismo retórico tremendo, associado a uma imensa vontade de acreditar e proteger a fé cristã, o que definitivamente, eu não tenho.

    Mas uma coisa que esta sua réplica definitivamente me provou é que, de fato, o tema a que nos dispomos a discutir é de fato, um tabu, mesmo entre as pessoas que se dizem “não religiosas”, quando você insiste em afirmar que não quer discutir religião, quando eu não vejo absolutamente outra saída a não ser discutir isso, quando se fala a respeito de um tema como este. Exatamente por isso, agradeço sua paciência até o momento.

    Mas para evitar essas intransponíveis barreiras linguísticas que parecem ter se formado em nossas formas de pensar, devido ao significado que demos a algumas palavras, vou tentar contorná-los refazendo as questões principais do duelo usando outros termos. Espero que ao fazer isso, deixe mais claro os pontos principais que estou tentando discutir e também saber mais a respeito de sua opinião a respeito deles.

    Como educadora, você não acha que a ignorância deve ser combatida? Ainda mais quando ela está associada a atitudes discriminatórias? Para você, qual é a importância do ceticismo para a investigação pessoal e também para o estudo da natureza? Você acha que um conhecimento que não é legitimado por evidências é um conhecimento seguro?

    E por fim... Você acha que a irracionalidade pode ser útil para a humanidade?

    Espero sua resposta para que possa concluir esta profunda discussão.

    Até a próxima!

    Chico Sofista.

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  16. Olá, Chico!



    Analisando nosso diálogo, percebo que enquanto respondo pela ótica da fé filosófica, você se pauta no aspecto da fé religiosa, este, enquanto fenômeno sociológico. È claro que haverá rupturas de pensamentos, mas isso não quer dizer (necessariamente) que há alguém errado em seus posicionamentos, é segundo minha interpretação, apenas um diferente ponto de vista: não há inversão de significados, apenas uma abrangência do que é conceituado.


    E por isso, chegamos num impasse, porque insisto na concepção mais ampla da palavra - assuntível enquanto convicção pessoal, baseada em evidências lógicas e percepções particulares. È um produto subjetivo, de resultado individual, por esse motivo não acredito que ela possa ser atribuída à ingenuidade. Podem não concordar com as evidências apresentadas, mas isso não tira o mérito ou legitimidade, porque isso iria contra a individualidade, e ninguém quer parecer um ditador, não é mesmo?


    Particularmente tenho dificuldade em assimilar o assunto, e por isso peço ajuda para entender o seu conceito, fazendo uma associação ‘simples’: sou corinthiana, que é o máximo que me permito de uma “experiência religiosa”, e ontem tivemos um jogo decisivo. Nos milhares de torcedores que lá estavam não havia quem duvidasse da vitória, correto? Em meu entendimento, esse é um exemplo prático do que é ter fé, mas, mesmo acreditando, houve sofrimento, dúvida, medo... È contraditório duvidar e ter fé ao mesmo tempo, e por isso aqui preciso de um esclarecimento.


    Você, com freqüência afirma que ter fé é acreditar piamente em algo. Acredito que seja esse ‘algo’ englobe todos os aspectos (deus, ideologia, personagem, sentimento...) Se essa for a concepção da palavra, só posso acreditar que ela não existe, por não conhecer nenhuma pessoa que tenha uma convicção inabalável. Todos têm dúvidas, todo mundo questiona seu ponto de vista, até como manutenção daquilo que defende. Ou seja, sentimentos como esperança e sua antítese, o desânimo, são comuns aos humanos, o que invalidaria a sentença da confiança absoluta.

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  17. Não considero nada ruim acreditar em algo, mesmo que aparentemente aquilo se mostre improvável. E a isso nomeio por esperança, se o meio de sua obtenção for de outra pessoa que não si mesmo, e autoconfiança, quando só depende de seu próprio esforço. Não pode ser considerada burrice, é apenas uma forma de encarar a vida.


    Os exemplos que levantou não chocam por serem verdadeiros, e sim por sua aparência cruel. Não pensei na ETERNIDADE do sofrimento no INFERNO, primeiro por não saber da existência destes dois conceitos, e segundo porque priorizo aquilo que tenho controle, que é o aqui, o agora, o que é físico, material, palpável. Isso não me torna alguém sem fé, sou apenas alguém sem a necessidade de levantar uma bandeira religiosa. E por não ter essa necessidade de rótulos, que questiono a relevância de se discutir a finalidade da fé. Enfim, vamos ao próximo item:
    Não sou uma historiadora, mas sei que a Bíblia católica é uma obra composta de setenta e três livros individuais, escritos em dois (ou possivelmente três) continentes, em ao menos, três idiomas diferentes, através de um período de aproximadamente 1500 anos, por mais de 40 autores (vindos de diferentes atividades e ofícios), portanto, é mais do que compreensível que haja enganos de interpretação e tradução, o que resultaria em contradições. A Bíblia, como a História ocidental é separada pelo nascimento de Cristo, e esse livro narra, segundo seus seguidores, toda a história, esta revelada por Deus. No antigo testamento é contado a origem dos costumes judaicos, e com esse registro histórico é possível entender as distorções que povos como fariseus faziam em relação a lei. Já no novo testamento é apresentado a forma do ‘Messias’, seu local de nascimento, julgamento, morte e ressurreição.

    Não vejo que Deus tenha mudado de idéia: antes o povo vivia pela lei, com a nova aliança, esta com a oferta de seu filho em sacrifício, o homem vive pela graça. A graça tem tantas conseqüências quanto a lei. Na concepção cristã, aquilo que é errado continua sendo errado e certo continua sendo certo. Como não se percebe as conseqüências de forma imediata, temos a impressão de achar que o tempo da graça é mais flexível do que o tempo da lei, o que segundo os estudiosos é um erro.


    Absolutismos são nefastos, e por isso, concordo com você sobre o possível malefício da crença, enquanto a única verdade. Por isso vejo com gratidão movimentos sociais como o Iluminismo. Não considero certo que se convença ninguém a nada, o máximo que se é permitido é uma apresentação de hipótese, essa, livre da contaminação da opinião pessoal. Caberá a cada pessoa fazer o juízo de valor, e refutar, se for o caso, aquilo que foi apresentado. Mas, infelizmente não é isso que acontece: pessoas querem impor seu ponto de vista, seja no campo religioso, ideológico, partidário... Vemos exemplos de intolerância em cada esquina, mas isso não é reflexo da fé, e sim, da prepotência humana. Não é obra da irracionalidade, e sim, da vaidade contida daqueles que acreditam dominar um fato.

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  18. E por ser uma educadora progressista, adepta da teoria do desenvolvimento humano é que não interfiro em aspectos que são de cunho pessoal. Religião não se aprende na escola, e não é também na escola que ela será experimentada. Talvez fosse necessário distinguir laicidade do laicismo.


    Sobre a questão da Palestina é evidente que foram utilizados fatores religiosos para o convencimento de uma parcela da população, como também na Inquisição, Cruzadas, Segunda Guerra Mundial, e também quando em processos eleitorais, a perseguição aos ateus, ou, adeptos de alguma religião considera satânica, como candomblé e umbanda. Mas sabemos que isso é apenas uma desculpa, o intuito é bem menos nobre. Tudo é política, e nisso está incluo guerras e religião.


    Tem razão, em Matemática (como qualquer outro aspecto da vida) o resultado não é obra do acaso. E é exatamente por isso que citei Newton, que foi um dos defensores do Iluminismo. Ele usou de sua fé para legitimar esse movimento.


    Sobre a contextualização, não há como negar, ela de fato existe como justificativa, porém, ela não é a única explicação: a religião é uma criação humana, e como tal, passível de erros. Cabe lembrar também que ela, desde o seu início foi criada para a perpetuação de poder, e por conta disso, artifícios foram utilizados. Alguns foram manipulados, outros tantos, em benefício próprio, o que não traz a ninguém, isenção de responsabilidades.


    É evidente que a ignorância deva ser combatida. Mas para isso é necessário que o educando entenda a origem dos fatos, para se abolir o pré-conceito, e formar sua própria opinião. Por essa razão, cabe ao professor partir do que o aluno sabe/conhece. Penso que o ceticismo é um excelente ponto de partida: é preciso ter certa distância daquilo que não entendemos, e através de observações, experimentos e análises pessoais, ‘nascer’ um conhecimento mais refinado, este, filtrado das primeiras impressões. Nenhum conhecimento é absolutamente seguro, por isso a necessidade de contínua reavaliação, e não, em definitivo acredito na irracionalidade.


    No aguardo de sua finalização, despeço-me.

    R.

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  19. Olá, Roberta!

    Enfim, chegamos ao final da conversa.

    Gostei bastante dessa sua última participação, onde você levantou uma série de questões muito lúcidas. Eu nunca tinha visto alguém ser tão seguro de “meio termos” desde os debates antigos do Leonardo Levi.

    Não importa como você conceitue “fé”. Lembre-se que em minha introdução, deixei claro que estava me referindo a “fé” relacionada à crenças SEM BASE EM EVIDÊNCIA. E como fui eu quem começou o duelo, falar de outra coisa, por definição, é fugir do assunto.

    É extremamente óbvio que a forma como os religiosos resolvem reconhecer a realidade (a partir da fé), é diferente da forma de se conhecer a realidade de quem parte de um processo cético e fundamentado apenas na honestidade intelectual. Existe um limite muito bem definido até onde pode ir o ceticismo de um religioso.

    Toda opinião humana é resultado subjetivo de reflexão individual, e mesmo assim, é possível de se reconhecer quando uma opinião é baseada em evidências concretas ou em crenças ingênuas em fenômenos sobrenaturais, dos quais não se tem evidência da existência.

    Todas as ideias geradas pelos seres humanos estão em constante guerra para permanecerem existindo na cultura humana. Algumas ideias são mais úteis ou se reproduzem mais rapidamente e por isso acabam se tornando mais marcantes na cultura humana. Outras acabam sendo ultrapassadas e acabam sendo deletadas pela história, não sem antes ficar por um bom tempo beliscando e torturando a memória da civilização.

    Essa ideia de que alguém deve ser “livre” para ter sua própria opinião é totalmente utópica, por que no fim das contas, toda ideia terá um resultado prático importante para a sociedade e várias delas devem ser combatidas, para a manutenção da civilização.

    Alguns séculos atrás a ideia de que alguém poderia ser dono de outra pessoa era plenamente aceita como legítima e Deus nunca se importou em influenciar seus profetas a pensarem diferente, talvez por que achasse importante alguém viver como objeto, dependendo do “contexto” histórico que ele mesmo criou.

    Mesmo depois da abolição dos escravos, muita gente teve que lutar e morrer para mudar a ideia de que negros são inferiores a brancos. Foi necessário criminalizar o racismo para que os efeitos nefastos deste tipo de ideia na sociedade pudessem diminuir, ao ponto que existe hoje.

    Se hoje alguém é preso por que discriminou uma pessoa pela sua raça, até bem pouco tempo atrás, pessoas eram vendidas e abusadas durante todas as suas vidas e este tipo de “crença” era tido como legítimo pela sociedade da época.

    E mesmo sendo crime, a ideia da inferioridade do negro está implantada no subconsciente de várias pessoas na sociedade, mesmo a biologia tendo mostrado o contrário, repetidas vezes.

    Em alguns casos é necessário ser exatamente um ditador. Ninguém deve ter o direito de divulgar ideias discriminatórias que levam à incitação à marginalização de um grupo de pessoas e isso deveria ser inviolável.

    O grande problema em ser tolerante demais é justamente ser omisso em relação ao intolerável. É como ver uma mulher sendo estuprada e não fazer nada, para respeitar o “direito” do estuprador de acreditar que ele pode fazer o que quiser.

    E se o motivo do estupro fosse religioso? E se o estuprador alegasse que um anjo do céu apareceu para ele dizendo para ter à força a primeira mulher que encontrasse, pois dali seria gerada sua tribo sagrada, que seria eternamente protegida por Deus?

    Como é que alguém contrariaria suas crenças sem parecer um “ditador”?

    E lá vou eu dando exemplos “fortes” novamente... ;-) (Sorry)

    Desculpe-me a imaginação sádica. Mas ela em nada se compara a dos autores do velho testamento, cujos exemplos todas as pessoas tem o “direito” de seguir como quiserem, por que criticar este tipo de crença seria interferir nas ideias dos outros e ser intolerante.

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  20. É claro que existem vários tipos de “Corinthianos”. A maioria está lá apenas para se divertir em ver o time jogar, mas alguns estão para bater e matar torcedores de outros times. Se você achar que “tudo deve ser tolerado”, ninguém poderia falar nada em relação às ações criminosas desses fanáticos.

    Os torcedores esperam que seu time vença. A fé, neste sentido, relaciona-se a uma probabilidade de um evento acontecer no futuro. Não há nada de errado em se querer muito que um evento aconteça no futuro, justamente por isso somos capazes de sonhar e também de lutar por nossos sonhos.

    É bem diferente do cara que aposta todos os seus bens na ideia de que o
    Corinthians vai ser campeão da Libertadores.

    O que impede que uma pessoa faça isso é justamente o CETICISMO, nossa capacidade de filtrar os eventos da realidade e fazer um juízo baseado em comprovações, sob a ferramenta da dúvida.

    E isto é exatamente o OPOSTO do ato de se abraçar a realidade tal como ela lhe é apresentada, que é o que acontece quando se tem fé, seja em qualquer ideologia ou religião.

    Se existe alguma coisa que te impede de apostar tudo o que você tem nas vitórias do Corinthians ou de acreditar no slogan assassino de alguma torcida organizada é o seu senso crítico.

    E o estímulo à capacidade apurada de fazer perguntas do ser humano é uma atividade extremamente recente na cultura humana. Para manter-se, vai ter que competir com outras ideias muitas vezes antagônicas e também muito difundidas e rapidamente assimiladas, como as presentes nos slogans políticos e religiosos.

    A ideia de que obedecer sem fazer questões é uma virtude é extensamente difundida nos textos bíblicos, assim como a ideia de pobreza e tolerância a maus tratos de superiores. Daí a César o que é de César! Assuma passivamente a invasão de sua nação. Ao longo dos anos, este tipo de ideia ajudou a sustentar os pilares políticos da nossa civilização, onde a moral do servo, ignorante e obediente, tinha que ser vista como virtude pelo mesmo, para o bem da estrutura social vigente.

    Eu nunca te disse que “fé é acreditar piamente em algo”. Isso é sinônimo de convicção pessoal e o que estou tentando te dizer desde as outras participações é que Fé não é isso. Fé é apenas acreditar em algo improvável sem evidências que sustentem sua crença.

    Quanto à sua reflexão quanto às convicções humanas, acredito que, como moderada, você não consegue imaginar o quão inabaláveis podem elas podem se tornar. A dúvida é um dom de poucos. A maioria das pessoas prefere se contentar com as respostas mais convenientes, por não admitir viver sem respostas, sejam elas quais forem.

    Aquilo que você acredita define aquilo que você é. Guia todas as suas ações. Sendo assim, a crença de uma pessoa é justamente a característica mais fundamental para ser avaliada quando se pensa a respeito de relações entre as pessoas na sociedade. Não existe absolutamente nada mais importante do que isso.

    E quando as pessoas preferem acreditar em coisas que não são reais em detrimento àquelas que são, estão vivendo uma ilusão em massa que pode ter resultados extremamente nefastos para a raça humana.

    Como já dissemos várias vezes, nem sempre é ruim acreditar no improvável, ter esperança. O problema é achar que se sabe coisas das quais ninguém sabe a resposta. Fazer apostas insanas, saltos na escuridão.

    Eu iria adorar viver em mundo sem rótulos onde as pessoas pudessem se reconhecer simplesmente pelo fato de serem seres humanos, independente de serem católicos, muçulmanos, ateus, corinthianos ou marxistas.

    Mas a própria existência desses rótulos já é algo que, por definição, serve para segregar as pessoas, ainda mais quando se destinam a separar as pessoas por projetos individuais de moral absoluta.

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  21. Eu concordo contigo que o conhecimento não deve ser imposto as pessoas, que ao contrário, elas devam ser incentivadas a querer aprender e a investigar a verdade sobre as coisas, mesmo quando elas estão mascaradas pelas ilusões do senso comum.

    E acho ainda que a racionalidade deve ser disseminada da melhor forma possível, para imunizar a sociedade dos vírus das superstições.

    Quando isso acontecer, qualquer um será capaz de perceber a imensa contradição que existe em se aceitar a ideia de que somos criaturas de um ser que se apresentava como vingativo e cruel e que, de repente, faz o sacrifício de seu próprio filho em forma humana, como forma de mostrar (?) que esta representação foi um favor para a humanidade.

    Qual é o sentido de se acreditar que Jesus morreu por meus pecados se eu não tinha sequer nascido? Ainda assim, a ideia de que somos culpados pela morte do filho do altíssimo é amplamente difundida entre as pessoas.

    Se todos as pessoas de fé achassem que “a religião é uma criação humana, e como tal, passível de erros.”, eu concordaria contigo que este tipo de discussão não é fundamental. Mas é JUSTAMENTE pelo fato dessa ideia ter sido tão exageradamente negligenciada, que acho que este é um dos assuntos mais importantes para se discutir em um debate sobre ideias que podem ser boas para a sociedade.

    E por ter implicações pessoais e sentimentais extremamente profundas, pouca gente consegue conversar sobre isso de forma racional e educada, como foi realizada este duelo retórico.

    Agradeço sua participação e a dos leitores e espero suas considerações finais.

    Chico Sofista.

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  22. Oi, Chico, então finalizamos...
    Fico contente por ter apreciado minha participação, mesmo sendo a última. Meu maior temor era não ser compreendida em algum de meus posicionamentos. Além de (aparentemente) ter me feito clara, você faz um comentário onde correlaciona minha ponderação com a de Leonardo Levi – essa foi com certeza, a cereja do bolo, fazendo desse duelo em particular, motivo de alegria e orgulho e por essa razão, agradeço a maneira elegante e simpática que abordou o assunto.

    È claro que importa a forma que conceituo a fé. Foi essa a nossa grande diferença: quando disse que a mesma se dá através de evidência, mesmo que ela seja a outros olhos, considerada insuficiente, por isso acredito que não houve fuga do assunto, apenas uma dificuldade em assimilar a semântica do termo. Eu gostaria de continuar o assunto, uma vez que não entendi como uma idéia pode abalar uma civilização. A questão escravocrata em nada tem relação com os desígnios divinos, ela foi nada mais que uma interpretação humana, daqueles que mais podiam pleitear direitos que eram os abastados e letrados. Bob Dylan, racionalmente afirmou: “As pessoas não fazem aquilo que acreditam. Elas fazem o que é conveniente, e só então se arrependem”.

    Alias, a questão da escravidão é muito pouco entendida: a percepção de que senhores donos de milhares de escravos é uma generalização equivocada, bem como toda a idéia aqueles que foram “destinados” a essa função social. Se há até hoje ignorância acerca do assunto, sendo ele muito mais recente, imagine os enganos de interpretação que se comete em relação a um livro que conta com mais de mil anos de história?


    A questão da inferioridade entre índios (povo gentil), negros, mulheres, judeus, gays não está na explicação religiosa a sua lógica, e em Gênesis é isso bastante claro. O que acontece é que se utilizam os mais variados meios para legitimar um favorecimento, e que melhor explicação é a da vontade divina? E aqui voltamos a Idade Média onde a questão do reinado/pobreza estava, na linhagem em definitivo, determinada. Não havia discussão, e por isso, quase não existia revolta, até que surge entre eles, alguém com coragem de questionar fundamentais pontos, e assim, a fé foi rediscutida. Lutero fez da bíblia um livro mais acessível, e a teologia adotada era mais próxima da maioria da população. Mas, como a maioria dos líderes, o poder também o corrompeu. A corrupção e a má fé não podem ser atribuídas a Deus, e sim, a aquilo que chamamos por livre arbítrio.

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  23. Todo homem é livre, ao menos, em sua forma de pensar. Se suas idéias trarão algum resultado prático para alguém que não ele, é outra história, mas o que discuto é que nenhuma delas deverá ser combatida sobre o véu do ‘que pode acontecer’. Vou apresentar um exemplo bem atual: semanas atrás na Grécia o partido neonazista ( Chryssi Avgi - Crepúsculo Dourado) conquistou numerosas e importantes cadeiras no parlamento. Quando comentava o episódio em rodas de amigos, alguns questionavam sobre a ideologia defendida, se ela não deveria ter sido proibida, censurada, extinta... O que precisamos entender é que, por mais chocante que seja a opinião de alguém, não se pode proibir que a mesma se manifeste. O que deve ser garantido por lei é o direito de resposta, além da criminalização quando essa idéia torna uma forma física e ofensiva.

    O partido neonazista tem como justificativa o resgate da autoestima do povo que sofre com a quebra do país, e com a provável exclusão da Zona do Euro. Para isso, levantam a bandeira contra os 7% da população ( algo em torno de 10,5 milhões de imigrantes) que segundo afirmam, são mão de obra barata, e sem vínculos com o país. Isso não parece familiar? O levante nada tem relação com ideologia, religião ou comprovação estatística. È apenas uma desculpa para justificar uma ação que os beneficie. Porém, o mundo mudou, e absurdos acontecidos na Segunda Guerra, ou até essa última, dos Balcãs, não serão mais aceitos. Há organizações que fiscalizam, evidenciam e punem aqueles que praticam crimes contra a humanidade. Organização esta, sem nenhuma concepção religiosa.

    Agora, em relação ao preconceito atribuído a inferioridade do negro e da mulher, da desconfiança aos ateus e adeptos de religiões africanas, rejeição a gays, e a símbolos como suástica, tudo isso há cura, que é o esclarecimento. Mas para que a Educação seja eficiente, é preciso apresentar todo o histórico, suas causas e conseqüências. É necessário reconhecê-las e discuti-las, para evitar que ocorram novas situações de discriminação. O professor Luis Carlos de Menezes foi extremamente feliz quando afirmou que o preconceito não é obra de grupos sectários, como por exemplo, skinheads, pois surge, às vezes, da tola pretensão de valorizar a si mesmo ao depreciar diferentes escolhas religiosas, estéticas, desportivas ou musicais. Podendo se manifestar através do de humor, religião, estatísticas... Muitas formas de intolerância são resultados de posturas repetidas sem análise nas relações familiares e afetivas, por isso, cabe a cada um estimular a discussão e identificação em todos os meios. Quando o preconceito é demonstrado (vivenciado em pequena escala), haverá o constrangimento, e subseqüente, uma mudança de postura, por saber que julgamentos antecipados nem sempre são definitivos, assim como algumas afirmações científicas.

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  24. E aí está a importância de se valorizar a gama de crenças e culturas, para que de fato exista o questionamento. È fundamental que subsista o contraditório, para que, com isso floresça o mito da neutralidade absoluta, este, sem dúvida, minha mais almejada utopia. Por isso, em nenhum lugar do mundo seria aceitável que o estupro seja obra de alguma crença. Para isso existe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e é por isso que não aceito o rótulo de ser ‘tolerante demais’: ou se é tolerante, ou não é.~> Agora, confessa: fui bastante ditatorial nessa afirmação, não é? ;-)

    “Eu nunca te disse que “fé é acreditar piamente em algo”. Isso é sinônimo de convicção pessoal e o que estou tentando te dizer desde as outras participações é que Fé não é isso...”– sim, você disse. Ao menos em três diferentes situações. E aqui percebemos que damos significados diferentes para coisas iguais, mas, voltando a definição do que seja fé, sinto que o assunto não chegará numa conclusão, mas não há de minha parte, lamento: o pior de não se ter dúvida, é ter a certeza sobre todos os pontos.

    Concordo que o estímulo as indagações é um fenômeno recente, e acredito que esteja aí a explicação do número de pessoas consideradas moderadas não serem ainda, a maioria. Acredito que toda a sociedade ganhará com o espírito mais amigável e tolerante, tal qual um dia Gandhi defendeu em sua lei de ouro.

    São as posturas que se defende que define aquilo que se é. E o que guia nossas ações não é a crença em algo, e sim, sua própria consciência. Beethoven atribuía a Deus a consciência do homem, portanto, as escolhas erradas que se tomam não estão na religião a justificativa, e sim, da maneira que CONSCIENTEMENTE decidiu escolher, obedecendo vantagens pessoais. E é por isso que disse que não acreditava em ingenuidade no que diz respeito a fé. A fé não é uma obtenção ingênua, é resultado de ponderações e renúncias. E tão pouco é uma virtude, é apenas uma característica. De modo geral, repudio o valor superestimado do termo.


    E diferente de você, não gostaria de viver em um mundo sem rótulos. Seria mais feliz em um que eles não fariam grande diferença, e que estes humanos se reconheceriam como iguais, apesar de suas particulares características. Mas concordamos no poder da Educação para atribuir significado a sociedade.

    Sobre a questão do Cristianismo( bem como, de todas as outras agremiações religiosas), poderíamos conversar com mais tempo, numa outra oportunidade, mas, é importante lembrar que esta é apenas uma crença e em pouquíssimo tempo, nem será a mais numerosa. Quem sabe com essa nova discussão descobriremos uma maneira de fazer desse importante assunto para a luz da razão?

    Obrigada pela oportunidade de um debate tão enriquecedor e agradável, e no aguardo de futuras ( e promissoras ) conversas, finalizo minha participação.

    R.

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  25. Este debate foi o mais difícil em que eu já votei. A cada vez que lia, mudava de opinião, mas acabei de me decidir pelo Chico Sofista e aí vão minhas razões:

    Esse problema semântico consumiu boa parte do debate e, como Chico Sofista é o desafiante, a maior parte da responsabilidade por isso recai sobre a Roberta A. Aires. Mesmo assim, em minha opinião, ela estava em vantagem no começo tanto pelos exemplos com que ilustrava seus argumentos, todos muito bem fundamentados, quanto pelo excelente manejo que ela tem com a linguagem. Observando o vocabulário e as diferentes maneiras de abordar um assunto, dá para perceber quando uma pessoa tem cultura.

    Claro que cultura e retórica o Chico também tem, mas, na hora de escrever, a Roberta se destacou aqui. Além disso, Chico escorregou sobre a história de “desrespeitar” o conhecimento de um aluno, mas não levei isso muito em conta por achar que foi apenas a escolha infeliz de uma palavra. Então a Roberta estava na frente... até a tréplica do Chico, quando ele virou o jogo e acabou mantendo a vantagem nas CFs.

    Nas tréplicas, Chico conseguiu explorar muito bem o problema semântico inicial e, quando o assunto chegou mais especificamente naquilo que ele pretendia debater desde o começo, ele conseguiu se sobressair com argumentos fortes e coerentes. Deste ponto em diante, no meu entender, a Roberta não conseguiu manter de pé sua visão mais relativista da fé, talvez porque os bons argumentos que ela tinha sobre o assunto dependiam justamente de uma definição mais ampla da palavra “fé”. Então, nas CFs, Chico encontrou o terreno certo para disparar os argumentos que, creio eu, tinha na manga desde o começo do debate. Não acho que Roberta tenha conseguido respondê-los tão bem quanto Chico os soube colocar, embora ainda tenha conseguido encaixar alguns bons exemplos.

    Se a Roberta A. Aires fosse a desafiante, poderia delimitar mais o tema e teria vencido. Mas, como o Octávio Henrique disse, não lembro onde, o Chico Sofista é muito bom de estratégia e soube usar sua prerrogativa de escolher o tema.

    Foi um ótimo debate e ambos estão de parabéns.

    Saudações do “sofista, agressivo, mercenário, indigno, torpe, desprezível e impudico”
    Alex Cruz

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