quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Marco Lisboa X Vitor Godinho - Socialismo


  1. E ai gente boa?tranquilidade?Primeiramente queria saudar meu interlocutor e amigo Marco Lisboa,que vou ter a honra de debater,e a todos os leitores e leitoras.
    ------------
    Primeiramente defenderei a tese que o Socialismo Cientifico em qualquer metodologia vai se tornar uma ditadura do proletariado,o que influi na anti-democratização política e estatização econômica e que esse sistema é impraticável devido a reciprocidade do ser humano.Vou começar pela política mais próxima que chegamos do Socialismo Cientifico e provar que mesmo esse sistema em prática teve de ser harmonizado ao capitalismo.Bom,Israel é um Estado democrático e laico que vive uma economia de mercado globalizada, porém se você é um marxista convicto e há muitos por lá, imigrados da antiga URSS,não ha problema. Você poderá viver com sua família a utopia comunitária comunista em um kibbutz, onde todos os bens são comunitários e parte do lucro é dividido igualitariamente entre seus moradores. Assim não ha tensão ideológica interna e a utopia marxista é possível dentro dessas restrições para quem a deseja. Se esta não é a sua ideologia econômica, tudo bem! Vá viver o mundo capitalista fora dos kibbutz, nas cidades. Com a pressão externa Israel não poderia se permitir a tensões ideológicas internas, e solucionou esta questão de forma perfeita, possibilitando o convívio da utopia marxista com a economia capitalista em perfeita harmonia,apenas neste parâmetro houve realmente uma ''espécie''de socialismo que passou longe do que realmente Karl Marx propôs,pois segundo ele isso ocorreria na medida em que, na sua dinâmica evolutiva, o capitalismo, necessariamente, geraria os elementos que acabariam por destruí-lo e que determinariam sua superação.Nos demais países em que esse sistema foi implantado,fracasso total,gosto de usar um exemplo bem interessante o filhote do ditador da Coreia do Norte se divertia na Disney, bem gorducho, enquanto os "súditos" passavam fome,Mao vivia no fausto e o povo atormentado pra poder comer,por isso digo que o socialismo ao ser elaborado nunca levou em conta a falha natureza humana. Por seguinte entendo perfeitamente idéias como essas se familiarizarem no contexto da Revolução Industrial onde existia de fato a exploração do proletariado,exploração desumana e grotesca hoje em dia considero uma política atrasada,você provavelmente vai dizer que o capitalismo é um sistema excludente e egoísta mas volto a bater na tecla de que a questão do egoísmo como uma maldade capitalista não procede mediante creio que isto é uma característica do ser humano,não todos, e que graças ao atual sistema temos um pobre hoje com melhores condições que um rico em 1940 então podemos concluir que existe uma hierarquia mas também existe o progresso de todas as classes,finalizando e voltado para assuntos nacionais quero dizer que temos que abrir portas pra políticas inovadoras como a proposta libertária ou liberal,são novas tendências que temos de experimentar,o Brasil é culturalmente esquerdista o que me deixa preocupado,veja bem até mesmo as metodologias educacionais estão repletas de marxismo,os professores principalmente de faculdade,instigam os alunos a seguirem um preceito que vai de acordo com o seu,tirando o livre direito democrático de escolherem o que seguir em plena consentia,são batizados nos livros de História,Filosofia,Geografia,ressalto para que não confundam isso com o desenvolvimento de raciocínio critico porque o professor tem dever de desenvolver consciência crítica,mas nunca de influenciar os alunos a doutrina que seguem,infelizmente não é o que acontece, temos um marxismo cultural muito forte,quase despercebido porém tenho esperanças de que nos livraremos das amarras comunistas.
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  2. Meu abraço aos leitores, e, em especial, ao Vitor. Tenho certeza de que esse será um debate fraterno, que irá trazer mais luz do que calor.
    Antes de entrar no mérito da questão, queria precisar o sentido que dou a alguns termos, como socialismo científico e comunismo.
    Quando Marx e Engels escreveram “O Manifesto do Partido Comunista”, optaram por batizar o novo partido de comunista, para evitar que ele se confundisse com as inúmeras correntes que se pretendiam socialistas, em especial o socialismo utópico.
    O marxismo, tomado como sinônimo de socialismo científico, tem os pés na terra. Ele possui três raízes: o socialismo francês, a filosofia alemã e a economia inglesa.
    Os socialistas franceses não se limitavam a propor uma igualdade formal, queriam abolir as classes e não simplesmente os privilégios de classe. Em suma, lutavam por uma revolução social e não simplesmente política.
    Da filosofia alemã o marxismo retira a sua concepção da história. E, finalmente, a economia inglesa contribui com os fundamentos para a análise do modo de produção capitalista, que Marx empreenderá em O Capital.
    Outra diferença crítica em relação aos socialistas utopicos é que o marxismo vê duas classes fundamentais no capitalismo, burguesia e proletariado, cabendo à esta última o protagonismo. Finalmente, a transformação social decorrerá da própria dinâmica do capitalismo. Marx acreditava que este avançaria até um estágio em que o modo de produção acabaria sendo um entrave às forças produtivas. A nova sociedade nasceria da velha, através da expropriação dos bens de produção, que de individuais passariam a ser coletivos.
    Como corolário dessa última proposição, a revolução social seria feita com os homens educados no seio da velha sociedade, com seus defeitos e imperfeições. Marx não coloca como centro da atuação política uma reforma moral, como faziam os utopistas. Mesmo em sua análise do capitalismo, ele não baseia sua crítica na ganância ou no egoísmo da burguesia.
    Infelizmente, socialismo e comunismo não são denominações patenteadas. Chávez, El-assad, além da Coréia do Norte, Cuba, China e Vietnã, todos eles, de alguma forma, tem o socialismo como referência (essa enumeração não é exaustiva).
    Quem seria então o legítimo herdeiro da doutrina de Marx e Engels? Como as concepções teóricas, as formas políticas e a organização social se diferenciam e se contradizem, é um tarefa inglória proclamar quem representa o verdadeiro socialismo. Para efeito de nosso debate, socialismo científico é aquele cujos princípios gerais estão nas obras de Marx e de Engels.
    Outra questão é: o socialismo, como sistema político e econômico, foi substituído pelo capitalismo na antiga União Soviética e em todo Leste Europeu. Este modelo, que chamaremos de socialismo real, era a referência teórica para os comunistas. Os socialistas que não compartilham dessa visão, alegam que ali não se praticou o autêntico socialismo.
    Essa crítica varia em grau e em extensão: alguns enxergam que houve apenas deformações; outros que houve uma traição, partida dos sucessores de Stalin; e há os que avaliam que não chegou a se formar uma sociedade socialista e sim um capitalismo de estado. Para os críticos do socialismo, não há sentido em falar em socialismo real, como não há sentido em defender um cristianismo ideal, distinto das religiões que se fundaram em seu nome.
    Um dos pontos que defenderei é que há algumas categorias metahistóricas que explicam parcialmente o fracasso do socialismo real. Mostrarei ainda que concepções utópicas, algumas bem antigas, foram retomadas na antiga União Soviética.
    Meu amigo Vitor pretende provar que os princípios do socialismo científico, quando aplicados, levam inevitavelmente a um fracasso do tipo do socialismo real, por ser ele intrinsecamente contrário à natureza humana. Isso implica em colocar o marxismo ao lado de tantas outras utopias. Há pontos de contato em nossas teses: o que eu chamo de categorias metahistóricas inclui traços do que ele chama de natureza humana. Outro ponto é a constatação de que o socialismo real fracassou. 
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  3. A primeira grande utopia foi idealizada por Platão em A República. Ele antecipou muitos características das utopias posteriores. Vejamos algumas:
    A concepção utilitarista da arte
    Platão subordinava a arte à tarefa de preservação do Estado. Em um diálogo de “A República” ele coloca na boca de Sócrates essas palavras:
    “Por conseguinte, não devemos acreditar nem permitir que se diga que Teseu, filho de Poseidon, e Pirito, filho de Zeus, praticaram tão hediondos raptos, nem que outro qualquer filho de deus e herói tenha cometido os atos horríveis e ímpios de que são acusados. Ao contrário, obriguemos os poetas a dizer que não tiveram tais atitudes ou que não foram os filhos dos deuses, mas que não afirmem ambas coisas ao mesmo tempo, tampouco que procurem convencer os nossos jovens de que os deuses realizam coisas más e de que os heróis não são em nada melhores do que os homens. ...” Grifos nossos.
    Aí estão alguns traços do Zhdnovismo: a confusão do espaço ficcional com o espaço real, a crença no herói positivo e o controle da produção cultural (quem vai obrigar ou negar permissão aos artistas?). Segundo Zhdanov, os escritores deveriam ser “engenheiros de alma”. Faltou mencionar que os agentes da KGB seriam os inspetores de produção.
    A preponderância do estado sobre o indivíduo
    A República de Platão, assim como outras utopias, tratava a sociedade ideal como uma colméia, ou um organismo vivo, em que cada parte ou cada indivíduo agia em função de um interesse coletivo.
    A sociedade soviética tratou sua força de trabalho como um exército de abelhas operárias, que podia ser mobilizado e deslocado para a frente onde seria mais útil. A industrialização foi feita através da coletivização forçada, da transferência de renda do campo para a cidade, de uma jornada de trabalho com ritmos extenuantes e uma apropriação muito grande da renda produzida, via baixos salários e pesadas inversões do excedente em bens de produção.
    Entretanto, a democracia direta dos sovietes apontava para o que o marxismo chama de associação livre de produtores.
    “O primeiro ato - escreve Engels no seu Anti-Dúhring - em que o Estado atua efetivamente como representante de toda a sociedade - a expropriação dos meios de produção em nome de toda a sociedade - é, ao mesmo tempo, o seu último ato independente como Estado. A intervenção do poder de Estado nas relações sociais tornar-se-á supérflua num domínio após outro, e cessará então por si mesma. O governo das pessoas dá lugar à administração das coisas e à direção do processo de produção. O Estado não é ‘abolido’, extingue-se.” “A sociedade, que reorganizará a produção na base de uma associação livre de produtores iguais, enviará toda a máquina do Estado para o lugar que lhe corresponderá então: museu de antiguidades, ao lado da roca de fiar e do machado de bronze.” (F. Engels, A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado.)”Grifos nossos.
    O trecho citado é de um artigo de Lênin, “Karl Marx”. Seu conteúdo não condiz com o que foi o desenvolvimento do estado soviético, que iria se fortalecer cada vez mais, ampliar suas estruturas e estender a sua influência sobre todas as esferas sociais.
    Isso se deu através de um mecanismo de substituição: os sovietes foram absorvidos pelo Estado, que se tornou um apêndice do partido. O partido, por sua vez, se viu reduzido, sucessivamente, ao Comitê Central, ao Politburo e, finalmente, ao Secretário Geral e seu círculo mais íntimo.
    Esse mecanismo elimina toda possibilidade de um interesse coletivo que não seja imposto pela coerção. Do homem total, proposto por Marx, chega-se ao totalitarismo. Da realização plena das potencialidades individuais e do fim de toda alienação, chega-se a uma sociedade industrial fordista, onde o capitalismo de estado substitui o capitalismo tradicional.
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  4. A criação do homem novo
    Toda utopia que se preza, propõe-se a criação de um novo homem. Para tal, remodela a arquitetura dos espaços coletivos, a arte, a educação, a forma da família, a organização da produção, etc., esperando que surja um homem desprovido de qualidades negativas. É a concepção rousseauniana de que o homem nasce bom e é corrompido pela sociedade.
    Vejamos este trecho de Campanela, em A cidade do Sol:
    “E assim todos os males provenientes dos dois contrários, a riqueza e a pobreza, que Platão e Salomão consideram como a origem dos males da república: a avareza, a adulação, a fraude, os furtos, a sordidez da pobreza; e a rapina, a arrogância, a soberba, a ociosidade, etc., da riqueza.
    Assim se destroem os vícios provocados pelo abuso do amor, como os adultérios, a fornicação, a sodomia, os abortos, o ciúme, as discórdias domésticas, etc.
    Assim os males que procedem do excesso de amor dos filhos ou dos consortes; a propriedade que elimina, como diz Santo Agostinho, as forças da caridade; o amor próprio que ocasiona todos os males, como diz Santa Catarina num diálogo; a avareza, a usura, a iliberalidade, o ódio do próximo, a inveja dos ricos e dos grandes. Nós, ao contrário, aumentamos o amor da comunidade e acabamos com os ódios despertados pela avareza, raiz de todos os males, e com os conflitos, as fraudes, os falsos testemunhos, etc.”
    http://www.culturabrasil.org/cidadedosol.htm#sol3
    Um dos erros do socialismo real foi o de pretender que os vícios da antiga sociedade que ainda perdurassem deveriam ser severamente reprimidos, como uma ameaça direta ao novo estado. Em Cuba, a partir de 1965, padres, pederastas, hippies e cabeludos, elementos ditos anti-sociais, foram enviados para as UMAP, Unidade Militares de Auxílio à Produção, verdadeiros campos de concentração, onde deveriam ser reeducados.
    Sem pretender esgotar o tema, podemos encontrar algumas categorias metahistóricas comuns a várias utopias e revoluções: a concentração do poder em uma casta (os filósofos, na República de Platão e a nomenclatura, na sociedade soviética), muitas vezes como resultado da substituição (na Revolução Francesa, a Convenção é substituída pelo Diretório e o Diretório pelos jacobinos), a luta fratricida, (a revolução devora os seus filhos) e o mito do homem novo que resulta num regime totalitário.
    Revoluções radicais costumam propiciar uma restauração, que, no entanto, não consegue retomar os regimes ultrapassados e acaba incorporando vários dos valores revolucionários. A Revolução Francesa viu no código Napoleônico a consagração dos valores burgueses e as monarquias absolutistas européias acabaram se tornando repúblicas ou monarquias constitucionais, onde reis e rainhas exercem cada vez mais uma função simbólica. Na União Soviética, foi restaurado o capitalismo tradicional, mas não é possível um retorno a autocracia tzarista e, no próprio capitalismo ocidental, conquistas trabalhistas, conseguidas através da luta dos trabalhadores, se mantém.
    Minha tese é que não há uma natureza humana intrínseca, há um homem histórico. O comunismo primitivo, o primeiro estágio da civilização, foi um período onde não havia essa contradição entre o individual e o coletivo. Não existe um egoísmo humano que atravesse todas as épocas históricas e que seja um obstáculo intransponível a um projeto coletivo. Por outro lado, processos revolucionários com conteúdos totalmente diferentes podem ter traços comuns, como os que apontei.
    Na minha próxima postagem, pretendo demonstrar que não há uma inevitabilidade histórica, que obrigue toda proposta socialista a repetir os mesmos erros. E que, no caso soviético, houve uma série de especificidades que levaram a um desenvolvimento que, infelizmente, foi tomado como modelo universal. Apontarei também algumas alternativas a esse modelo, que acredito se aplicarem à realidade brasileira. 

4 comentários:

  1. E ai gente boa?tranquilidade?Primeiramente queria saudar meu interlocutor e amigo Marco Lisboa,que vou ter a honra de debater,e a todos os leitores e leitoras.
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    Primeiramente defenderei a tese que o Socialismo Cientifico em qualquer metodologia vai se tornar uma ditadura do proletariado,o que influi na anti-democratização política e estatização econômica e que esse sistema é impraticável devido a reciprocidade do ser humano.Vou começar pela política mais próxima que chegamos do Socialismo Cientifico e provar que mesmo esse sistema em prática teve de ser harmonizado ao capitalismo.Bom,Israel é um Estado democrático e laico que vive uma economia de mercado globalizada, porém se você é um marxista convicto e há muitos por lá, imigrados da antiga URSS,não ha problema. Você poderá viver com sua família a utopia comunitária comunista em um kibbutz, onde todos os bens são comunitários e parte do lucro é dividido igualitariamente entre seus moradores. Assim não ha tensão ideológica interna e a utopia marxista é possível dentro dessas restrições para quem a deseja. Se esta não é a sua ideologia econômica, tudo bem! Vá viver o mundo capitalista fora dos kibbutz, nas cidades. Com a pressão externa Israel não poderia se permitir a tensões ideológicas internas, e solucionou esta questão de forma perfeita, possibilitando o convívio da utopia marxista com a economia capitalista em perfeita harmonia,apenas neste parâmetro houve realmente uma ''espécie''de socialismo que passou longe do que realmente Karl Marx propôs,pois segundo ele isso ocorreria na medida em que, na sua dinâmica evolutiva, o capitalismo, necessariamente, geraria os elementos que acabariam por destruí-lo e que determinariam sua superação.Nos demais países em que esse sistema foi implantado,fracasso total,gosto de usar um exemplo bem interessante o filhote do ditador da Coreia do Norte se divertia na Disney, bem gorducho, enquanto os "súditos" passavam fome,Mao vivia no fausto e o povo atormentado pra poder comer,por isso digo que o socialismo ao ser elaborado nunca levou em conta a falha natureza humana. Por seguinte entendo perfeitamente idéias como essas se familiarizarem no contexto da Revolução Industrial onde existia de fato a exploração do proletariado,exploração desumana e grotesca hoje em dia considero uma política atrasada,você provavelmente vai dizer que o capitalismo é um sistema excludente e egoísta mas volto a bater na tecla de que a questão do egoísmo como uma maldade capitalista não procede mediante creio que isto é uma característica do ser humano,não todos, e que graças ao atual sistema temos um pobre hoje com melhores condições que um rico em 1940 então podemos concluir que existe uma hierarquia mas também existe o progresso de todas as classes,finalizando e voltado para assuntos nacionais quero dizer que temos que abrir portas pra políticas inovadoras como a proposta libertária ou liberal,são novas tendências que temos de experimentar,o Brasil é culturalmente esquerdista o que me deixa preocupado,veja bem até mesmo as metodologias educacionais estão repletas de marxismo,os professores principalmente de faculdade,instigam os alunos a seguirem um preceito que vai de acordo com o seu,tirando o livre direito democrático de escolherem o que seguir em plena consentia,são batizados nos livros de História,Filosofia,Geografia,ressalto para que não confundam isso com o desenvolvimento de raciocínio critico porque o professor tem dever de desenvolver consciência crítica,mas nunca de influenciar os alunos a doutrina que seguem,infelizmente não é o que acontece, temos um marxismo cultural muito forte,quase despercebido porém tenho esperanças de que nos livraremos das amarras comunistas.

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  2. Meu abraço aos leitores, e, em especial, ao Vitor. Tenho certeza de que esse será um debate fraterno, que irá trazer mais luz do que calor.
    Antes de entrar no mérito da questão, queria precisar o sentido que dou a alguns termos, como socialismo científico e comunismo.
    Quando Marx e Engels escreveram “O Manifesto do Partido Comunista”, optaram por batizar o novo partido de comunista, para evitar que ele se confundisse com as inúmeras correntes que se pretendiam socialistas, em especial o socialismo utópico.
    O marxismo, tomado como sinônimo de socialismo científico, tem os pés na terra. Ele possui três raízes: o socialismo francês, a filosofia alemã e a economia inglesa.
    Os socialistas franceses não se limitavam a propor uma igualdade formal, queriam abolir as classes e não simplesmente os privilégios de classe. Em suma, lutavam por uma revolução social e não simplesmente política.
    Da filosofia alemã o marxismo retira a sua concepção da história. E, finalmente, a economia inglesa contribui com os fundamentos para a análise do modo de produção capitalista, que Marx empreenderá em O Capital.
    Outra diferença crítica em relação aos socialistas utopicos é que o marxismo vê duas classes fundamentais no capitalismo, burguesia e proletariado, cabendo à esta última o protagonismo. Finalmente, a transformação social decorrerá da própria dinâmica do capitalismo. Marx acreditava que este avançaria até um estágio em que o modo de produção acabaria sendo um entrave às forças produtivas. A nova sociedade nasceria da velha, através da expropriação dos bens de produção, que de individuais passariam a ser coletivos.
    Como corolário dessa última proposição, a revolução social seria feita com os homens educados no seio da velha sociedade, com seus defeitos e imperfeições. Marx não coloca como centro da atuação política uma reforma moral, como faziam os utopistas. Mesmo em sua análise do capitalismo, ele não baseia sua crítica na ganância ou no egoísmo da burguesia.
    Infelizmente, socialismo e comunismo não são denominações patenteadas. Chávez, El-assad, além da Coréia do Norte, Cuba, China e Vietnã, todos eles, de alguma forma, tem o socialismo como referência (essa enumeração não é exaustiva).
    Quem seria então o legítimo herdeiro da doutrina de Marx e Engels? Como as concepções teóricas, as formas políticas e a organização social se diferenciam e se contradizem, é um tarefa inglória proclamar quem representa o verdadeiro socialismo. Para efeito de nosso debate, socialismo científico é aquele cujos princípios gerais estão nas obras de Marx e de Engels.
    Outra questão é: o socialismo, como sistema político e econômico, foi substituído pelo capitalismo na antiga União Soviética e em todo Leste Europeu. Este modelo, que chamaremos de socialismo real, era a referência teórica para os comunistas. Os socialistas que não compartilham dessa visão, alegam que ali não se praticou o autêntico socialismo.
    Essa crítica varia em grau e em extensão: alguns enxergam que houve apenas deformações; outros que houve uma traição, partida dos sucessores de Stalin; e há os que avaliam que não chegou a se formar uma sociedade socialista e sim um capitalismo de estado. Para os críticos do socialismo, não há sentido em falar em socialismo real, como não há sentido em defender um cristianismo ideal, distinto das religiões que se fundaram em seu nome.
    Um dos pontos que defenderei é que há algumas categorias metahistóricas que explicam parcialmente o fracasso do socialismo real. Mostrarei ainda que concepções utópicas, algumas bem antigas, foram retomadas na antiga União Soviética.
    Meu amigo Vitor pretende provar que os princípios do socialismo científico, quando aplicados, levam inevitavelmente a um fracasso do tipo do socialismo real, por ser ele intrinsecamente contrário à natureza humana. Isso implica em colocar o marxismo ao lado de tantas outras utopias. Há pontos de contato em nossas teses: o que eu chamo de categorias metahistóricas inclui traços do que ele chama de natureza humana. Outro ponto é a constatação de que o socialismo real fracassou.

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  3. A primeira grande utopia foi idealizada por Platão em A República. Ele antecipou muitos características das utopias posteriores. Vejamos algumas:
    A concepção utilitarista da arte
    Platão subordinava a arte à tarefa de preservação do Estado. Em um diálogo de “A República” ele coloca na boca de Sócrates essas palavras:
    “Por conseguinte, não devemos acreditar nem permitir que se diga que Teseu, filho de Poseidon, e Pirito, filho de Zeus, praticaram tão hediondos raptos, nem que outro qualquer filho de deus e herói tenha cometido os atos horríveis e ímpios de que são acusados. Ao contrário, obriguemos os poetas a dizer que não tiveram tais atitudes ou que não foram os filhos dos deuses, mas que não afirmem ambas coisas ao mesmo tempo, tampouco que procurem convencer os nossos jovens de que os deuses realizam coisas más e de que os heróis não são em nada melhores do que os homens. ...” Grifos nossos.
    Aí estão alguns traços do Zhdnovismo: a confusão do espaço ficcional com o espaço real, a crença no herói positivo e o controle da produção cultural (quem vai obrigar ou negar permissão aos artistas?). Segundo Zhdanov, os escritores deveriam ser “engenheiros de alma”. Faltou mencionar que os agentes da KGB seriam os inspetores de produção.
    A preponderância do estado sobre o indivíduo
    A República de Platão, assim como outras utopias, tratava a sociedade ideal como uma colméia, ou um organismo vivo, em que cada parte ou cada indivíduo agia em função de um interesse coletivo.
    A sociedade soviética tratou sua força de trabalho como um exército de abelhas operárias, que podia ser mobilizado e deslocado para a frente onde seria mais útil. A industrialização foi feita através da coletivização forçada, da transferência de renda do campo para a cidade, de uma jornada de trabalho com ritmos extenuantes e uma apropriação muito grande da renda produzida, via baixos salários e pesadas inversões do excedente em bens de produção.
    Entretanto, a democracia direta dos sovietes apontava para o que o marxismo chama de associação livre de produtores.
    “O primeiro ato - escreve Engels no seu Anti-Dúhring - em que o Estado atua efetivamente como representante de toda a sociedade - a expropriação dos meios de produção em nome de toda a sociedade - é, ao mesmo tempo, o seu último ato independente como Estado. A intervenção do poder de Estado nas relações sociais tornar-se-á supérflua num domínio após outro, e cessará então por si mesma. O governo das pessoas dá lugar à administração das coisas e à direção do processo de produção. O Estado não é ‘abolido’, extingue-se.” “A sociedade, que reorganizará a produção na base de uma associação livre de produtores iguais, enviará toda a máquina do Estado para o lugar que lhe corresponderá então: museu de antiguidades, ao lado da roca de fiar e do machado de bronze.” (F. Engels, A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado.)”Grifos nossos.
    O trecho citado é de um artigo de Lênin, “Karl Marx”. Seu conteúdo não condiz com o que foi o desenvolvimento do estado soviético, que iria se fortalecer cada vez mais, ampliar suas estruturas e estender a sua influência sobre todas as esferas sociais.
    Isso se deu através de um mecanismo de substituição: os sovietes foram absorvidos pelo Estado, que se tornou um apêndice do partido. O partido, por sua vez, se viu reduzido, sucessivamente, ao Comitê Central, ao Politburo e, finalmente, ao Secretário Geral e seu círculo mais íntimo.
    Esse mecanismo elimina toda possibilidade de um interesse coletivo que não seja imposto pela coerção. Do homem total, proposto por Marx, chega-se ao totalitarismo. Da realização plena das potencialidades individuais e do fim de toda alienação, chega-se a uma sociedade industrial fordista, onde o capitalismo de estado substitui o capitalismo tradicional.

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  4. A criação do homem novo
    Toda utopia que se preza, propõe-se a criação de um novo homem. Para tal, remodela a arquitetura dos espaços coletivos, a arte, a educação, a forma da família, a organização da produção, etc., esperando que surja um homem desprovido de qualidades negativas. É a concepção rousseauniana de que o homem nasce bom e é corrompido pela sociedade.
    Vejamos este trecho de Campanela, em A cidade do Sol:
    “E assim todos os males provenientes dos dois contrários, a riqueza e a pobreza, que Platão e Salomão consideram como a origem dos males da república: a avareza, a adulação, a fraude, os furtos, a sordidez da pobreza; e a rapina, a arrogância, a soberba, a ociosidade, etc., da riqueza.
    Assim se destroem os vícios provocados pelo abuso do amor, como os adultérios, a fornicação, a sodomia, os abortos, o ciúme, as discórdias domésticas, etc.
    Assim os males que procedem do excesso de amor dos filhos ou dos consortes; a propriedade que elimina, como diz Santo Agostinho, as forças da caridade; o amor próprio que ocasiona todos os males, como diz Santa Catarina num diálogo; a avareza, a usura, a iliberalidade, o ódio do próximo, a inveja dos ricos e dos grandes. Nós, ao contrário, aumentamos o amor da comunidade e acabamos com os ódios despertados pela avareza, raiz de todos os males, e com os conflitos, as fraudes, os falsos testemunhos, etc.”
    http://www.culturabrasil.org/cidadedosol.htm#sol3
    Um dos erros do socialismo real foi o de pretender que os vícios da antiga sociedade que ainda perdurassem deveriam ser severamente reprimidos, como uma ameaça direta ao novo estado. Em Cuba, a partir de 1965, padres, pederastas, hippies e cabeludos, elementos ditos anti-sociais, foram enviados para as UMAP, Unidade Militares de Auxílio à Produção, verdadeiros campos de concentração, onde deveriam ser reeducados.
    Sem pretender esgotar o tema, podemos encontrar algumas categorias metahistóricas comuns a várias utopias e revoluções: a concentração do poder em uma casta (os filósofos, na República de Platão e a nomenclatura, na sociedade soviética), muitas vezes como resultado da substituição (na Revolução Francesa, a Convenção é substituída pelo Diretório e o Diretório pelos jacobinos), a luta fratricida, (a revolução devora os seus filhos) e o mito do homem novo que resulta num regime totalitário.
    Revoluções radicais costumam propiciar uma restauração, que, no entanto, não consegue retomar os regimes ultrapassados e acaba incorporando vários dos valores revolucionários. A Revolução Francesa viu no código Napoleônico a consagração dos valores burgueses e as monarquias absolutistas européias acabaram se tornando repúblicas ou monarquias constitucionais, onde reis e rainhas exercem cada vez mais uma função simbólica. Na União Soviética, foi restaurado o capitalismo tradicional, mas não é possível um retorno a autocracia tzarista e, no próprio capitalismo ocidental, conquistas trabalhistas, conseguidas através da luta dos trabalhadores, se mantém.
    Minha tese é que não há uma natureza humana intrínseca, há um homem histórico. O comunismo primitivo, o primeiro estágio da civilização, foi um período onde não havia essa contradição entre o individual e o coletivo. Não existe um egoísmo humano que atravesse todas as épocas históricas e que seja um obstáculo intransponível a um projeto coletivo. Por outro lado, processos revolucionários com conteúdos totalmente diferentes podem ter traços comuns, como os que apontei.
    Na minha próxima postagem, pretendo demonstrar que não há uma inevitabilidade histórica, que obrigue toda proposta socialista a repetir os mesmos erros. E que, no caso soviético, houve uma série de especificidades que levaram a um desenvolvimento que, infelizmente, foi tomado como modelo universal. Apontarei também algumas alternativas a esse modelo, que acredito se aplicarem à realidade brasileira.

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