quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Rafael Gasparini X Alonso Prado - A demagogia como mal inerente à democracia

§1 - Cada debatedor tem direto a no máximo 3 postagens (de 4096 caracteres cada uma) por participação - QUE DEVERÃO SER UTILIZADAS DA MELHOR FORMA POSSÍVEL POR CADA UM DOS DEBATEDORES. 

§2 - Os debatedores DEVERÃO fazer 4 participações intercaladas por duelo:considerações iniciais, réplica, tréplica e considerações finais. 

§3 - O prazo regulamentar entre as participações dos debatedores é de 3 dias. Todo adversário tem o direito de estender o prazo de seu oponente. Após o prazo, será declarada vitória por W.O. para o duelista remanescente. 


§4 - Após o duelo, o vencedor será escolhido através de votações em enquete.

24 comentários:

  1. 1. INTRODUÇÃO

    O nosso objeto é esse: “A demagogia como mal inerente à democracia.”

    Eu pretendo dissertar contra essa tese e dizer que a demagogia é um mal que se manifesta na democracia, e não um mal inerente a ela.

    Ainda tenho um objetivo além disso, que é derrubar as bases do pessimismo com relação às democracias (bem entendidas aqui como sinônimo de ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, e não democracia propriamente dita, em seu significado primitivo, de “governo do povo”, que hoje é conhecida como democracia direta, que é de natureza utópica e autoritária em essência), pois esse tipo de pessimismo favorece a disseminação de ideologias autoritárias de caráter utilitário, que acabam se promovendo como alternativas viáveis àquilo que já é bom intrinsecamente. Se as pessoas entendem porque a democracia é boa, do jeito que ela é, mesmo com toda a demagogia e falsidade que muitas vezes nela se manifesta, é esperança que deixemos de imaginar e apoiar sistemas utópicos alternativos a ela.

    Porém, para fazer isso, é preciso começar pelas bases antropológicas do que é o homem, a fim de especificar qual o modelo que lhe seria mais adequado.

    2. É POSSÍVEL ESTUDAR EM SEPARADO COISAS QUE SÃO EM PRINCÍPIO INSEPARÁVEIS?

    Eu sou Engenheiro Eletricista, e em uma fase da faculdade começamos a estudar eletricidade e magnetismo, e posteriormente ondas eletromagnéticas. E me lembro que uma das primeiras perguntas que me veio à mente, com toda a minha inexperiência e ignorância, era se não existiria uma onda puramente elétrica ou uma onda puramente magnética. A continuação mais tarde mostraria que uma onda não pode existir sem a outra, ou seja, onde há uma onda elétrica há ao mesmo tempo uma magnética e vice-versa. Por isso é sempre eletromagnética, pois é impossível separá-las fisicamente. Porém, É POSSÍVEL SEPARÁ-LAS PELO PENSAMENTO E ESTUDÁ-LAS SEPARADAMENTE em suas componentes elétrica e magnética.

    Com o homem algo similar ocorre. Só há dois tipos de causalidade “em si” concebíveis: a interna e a externa, que são mais conhecidas como “livre” e “natural”, ou como “autodeterminada” ou “determinada”, ou como “espírito” e “matéria”, ou como “mente” e “corpo”, “inteligência” e “matéria”, etc... Há vários nomes para se designarem as mesmas ideias, de modo que não há porque não entender o conceito.

    Eu sei que há os que parecem crer em magia ou feitiçaria, que defendem uma não-possibilidade alternativa que excluísse ao mesmo tempo o “interno”, o “externo”, e o “interno e externo”. Mas não vou perder tempo aqui derrubando essa tese manifestamente absurda, pois já o fiz nos outros debates anteriores e peço ao leitor que ainda tiver dúvidas a respeito que revisite o meu duelo sobre o livre-arbítrio contra o Alex Cruz, que é onde o conceito foi melhor explicado. A minha teoria de Estado, que é a mesma teoria de Estado kantiana, vai considerar apenas esses dois tipos possíveis de causalidade e deixar dela lado as “não-hipóteses” místicas alternativas.

    Com relação ao homem, sabemos com certeza absoluta que nele está contido uma causalidade natural. Mas não podemos saber se nele há também uma causalidade livre, porque esta espécie de causalidade é suprassensível. Porém, se existir em nós essa forma de causalidade, que é a que nos torna seres racionais, então na verdade somos seres duplos, ou seja, em parte livre, em parte natural, e pelo menos na Terra não conseguimos separar ‘fisicamente” essas duas partes, pois estamos limitados a percepção de “fenômenos”, e não à percepção das coisas como elas são “em si”. Porém, assim como ocorre no caso da onda eletromagnética, podemos pensar e analisar essas duas espécies de causalidade em separado, que é o que pretendo fazer a partir de agora.

    3. O HOMEM COMO UM SER DUPLO: AO MESMO TEMPO LIVRE E NATURAL

    O homem puramente natural é o homem animal, aquele que é puramente condicionado por circunstâncias exteriores a ele e independentes dele. O homem puramente livre é o homem racional, aquele que não se determina por nada exterior a ele, que se autodetermina, que possui uma vontade autônoma.

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  2. Essas duas espécies de homem que existem (no primeiro caso) e pressupostamente existem (no segundo caso) em nós, possuem características e expectativas completamente diversas.

    O homem natural é “morto” por dentro, pois é incapaz de um movimento autônomo, e dessa forma é alheio a tudo o que lhe ocorre. Suas partes constituintes (nossos átomos, por exemplo) são simplesmente jogadas “para lá ou para cá” por conta de circunstâncias simplesmente exteriores e que são regidas por leis, que chamamos normalmente de LEIS DA NATUREZA. Essa é uma lei dada exteriormente a essas partículas (pois elas não se autodeterminam e não poderiam se dar leis), e elas são de cunho exclusivamente lógico-matemático, ou seja, todos os seus movimentos são lógico-matematicamente determináveis.

    Já o homem livre é “vivo” por dentro, pois é capaz de um movimento autônomo, e dessa forma pode em princípio se tornar alheio a tudo o que lhe ocorre exteriormente. Sua parte constituinte não é simplesmente jogada “para lá ou para cá”, mas ela possui a faculdade de escolher se quer ir “para cá ou para lá”, e mesmo para decidir se vai se deixar jogar “para lá ou para cá” por conta de circunstâncias naturais exteriores (que é o que normalmente ocorre com os chamados “espíritos fracos”). Seres autônomos não se regem por leis que lhes são dadas de fora (pois senão não seriam autodeterminados), de modo que as leis naturais a eles não se aplicam. Ao contrário, eles legislam para si próprios, e se dão uma lei que é normalmente conhecida pelo nome de LEI MORAL. O princípio da autonomia é o princípio supremo e único dessa Lei, e nenhum outro poderia haver sem que o homem livre perdesse a sua autonomia e se tornasse meramente uma “natureza”. Dessa forma, essa lei não pode ser dada por nada exterior (nem mesmo por Deus, caso Ele exista), porque isso feriria de morte a autonomia. É uma contradição intrínseca, portanto, crer que um ser livre pudesse ser determinado por uma lei que lhe fosse exterior, pois isso é a mesma coisa que não ser livre, e os sistemas que isso defendem na verdade são intrinsecamente materialistas disfarçados de espiritualistas. O catolicismo e o protestantismo infelizmente são assim (e por isso eu disse que são contrários ao “espírito do Cristianismo), e em nada se diferenciam, em essência, do materialismo e do deísmo propriamente ditos.

    O homem natural apenas quer satisfazer os seus instintos naturais, ou seja, as determinações que a natureza lhe deu. Dessa forma o fim de todo homem natural é aquilo a que comumente chamamos de FELICIDADE, bem entendida aqui como sendo “o estado de coisas em que tudo exteriormente ocorre de modo a satisfazer os nossos desejos naturais”. É conhecida também por outros nomes, como “bem-estar”, “utilidade”, etc...

    Já o homem livre (ou racional), pelo contrário, não tolera determinação exterior; não tolera ser tratado como “coisa” natural. Ele quer se autodeterminar. Dessa forma, o fim de todo homem racional é aquilo que normalmente chamamos de DIGNIDADE, que é justamente a faculdade de não se deixar rebaixar ao estado de uma coisa, um objeto, de poder se autodeterminar, e de se colocar acima de todas as coisas naturais.

    Portanto, a Lei que o homem racional se dá (a Lei Moral) decorre unicamente da sua autonomia, e pode-se ser entendida sob três pontos de vista: autonomia propriamente dita, ou seja, o direito e o dever de se autodeterminar; a dignidade, ou seja, o direito e o dever de não se rebaixar ao estado de uma coisa natural; e a isonomia, ou seja, o direito e o dever de não se colocar nem acima e nem abaixo dos demais seres racionais. Quando penso nessa Lei aplicada a mim mesmo, chamo-a de DEVER DE VIRTUDE, ou dever interno, ou dever para comigo mesmo. Quando penso nessa Lei aplicada aos outros seres racionais que não eu próprio, chamo-a de DEVER JURÍDICO, ou dever exterior, ou dever para com os outros. O dever jurídico gera uma doutrina que se chama de DOUTRINA DO DIREITO, que tem por fim regular as relações recíprocas entre os seres racionais a fim de que todos possam exercer a sua autonomia.

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  3. ESTADO DE DIREITO OU ESTADO UTILITARISTA?

    O Estado deve existir? Sim. Mas a explicação disso eu vou deixar para o próximo quadro, porque senão vai faltar espaço. Mas considerando que sim, qual deve ser o fim do Estado? Satisfazer o homem natural ou o homem racional? É claro que vão dizer: AMBOS! Concordo. Mas e em situações que não puder ser “ambos”, qual deve ser privilegiado? O homem que sei que existe (o natural) ou o homem que apenas creio que existe (o racional)?

    O ESTADO DE DIREITO quer priorizar o homem racional, e o seu fim é a defesa e o fomento da DIGNIDADE. O ESTADO UTILITARISTA quer, por outro lado, priorizar o homem natural, e o seu fim é a defesa e o fomento da FELICIDADE.

    Dignidade e felicidade! São esses os dois maiores dilemas da humanidade em todos os tempos. É evidente que como homem natural e racional queremos sempre os dois em sua máxima realização. Mas e quando não podemos ter os dois? Qual deve ser priorizado?

    Não resta dúvida que a dignidade deve ser priorizada. O utilitarismo então só ganha espaço na ausência de certeza da existência do homem racional, e então em seguida se convence de que esse homem racional não existe, e diz para si mesmo que só deve se preocupar com a felicidade, que é o único bem para ele palpável.

    O problema é: A felicidade de quem? E o que a define subjetivamente? Isso vai variar de indivíduo para indivíduo. Alguns vão dizer que a felicidade de um grupo seleto (no qual ele provavelmente estará incluído) é o que importa. Outros mais “abnegados” vão dizer que a felicidade da maioria é o que importa, e às vezes até se dispõe a se autoexcluir dela (que lindo – e piegas, e falso!). Outros vão dizer que felicidade é paz de rebanho. Outros vão dizer que a felicidade é a luta constante, que nos preserva do aborrecimento. Com isso concluímos que o utilitarismo pode se apresentar sob as mais diversas formas, todos com o fim de produzir felicidade, seja para poucos indivíduos, seja para muitos, seja um gênero de felicidade, seja outro gênero de felicidade, de modo que inúmeros sistemas diferentes são possíveis. E a esmagadora maioria dos sistemas hoje existentes são apenas variações de sistemas utilitários, ou seja, variações de “doutrinas de felicidade”.

    O Estado de Direito, quando quer ser de fato de Direito, não deve olhar para a felicidade, mas apenas para a dignidade (e consequentemente também para a autonomia e isonomia). E mesmo quando olhar para a felicidade, deve ser sempre com um fim de fomento da autonomia. Em um Estado de Direito puro, nenhuma ação estatal pode estar desvinculada da ideia de defesa ou de fomento da autonomia dos indivíduos. O Estado de Direito puro se dirige unicamente ao homem racional e não ao homem natural. A satisfação do homem natural pelo Estado deve ser meramente um meio de satisfação do homem racional, ou seja, de satisfação da dignidade, autonomia e isonomia. A busca da pura felicidade não pode ser negligenciada, sem dúvida, mas ela é um dever-direito dos indivíduos a buscarem por si próprios, sem violação da dignidade alheia, no exercício da sua própria autonomia. O Estado, portanto, só deve olhar para a felicidade quando ela estiver relacionada de alguma forma com o Direito.

    Portanto, o erro do Estado utilitarista é querer fazer os seus súditos felizes, e nessa tentativa a autonomia dos indivíduos é constantemente violada (visto que está em segundo plano), porque o Estado poderia um dia entender que eu não produzo felicidade suficiente, nem para mim mesmo, nem para os outros, e pode imaginar proceder a um “descarte”, da mesma forma que jogamos fora um objeto que não serve mais. Isso gera insegurança, terror e, consequentemente, muita infelicidade.

    Infelizmente meu espaço acabou, mas na continuação eu espero poder fundamentar que toda a demagogia que existe nas democracias se devem a ilusórias promessas e expectativas de felicidade (vejam, por exemplo, as campanhas políticas, que só prometem “felicidades”), e que estão em descompasso com o objetivo de todo Estado que quer ser de Direito (como o nosso, supostamente, por exemplo).

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  4. Cordiais saudações ao kantiano Rafael Gasparini e demais leitores desse debate!

    -Introdução-

    “A demagogia como mal inerente à democracia” - Esse título deve despertar a atenção de muitas pessoas interessadas no processo político como um todo. Ainda mais em vésperas de eleições onde vemos o uso exacerbado de marketing político e pesquisas de intenção de voto hodiernamente na mídia e ainda os militantes partidários travando duras críticas uns aos outros nas redes-sociais sem chegarem a nenhum consenso. Podemos dizer que tudo isso corresponde a formas de demagogia como mal inerente ou internalizado pelo processo democrático?


    De certa forma sim ao meu entender particular, pois a melhor definição que se liga a esse processo atualmente em forma de status quaestionis se encontra na obra de Slavoj Zizek no seu livro “Primeiro como tragédia, depois como farsa” ao mencionar: “Na democracia, cada cidadão comum é de fato um rei – mas um rei numa democracia constitucional, um monarca que decide apenas formalmente, cuja função é apenas assinar as medidas propostas pelo governo executivo. É por isso que o problema dos rituais democráticos é semelhante ao grande problema da monarquia constitucional: como proteger a dignidade do rei? Como manter a aparência de que o rei toma as decisões, quando todos sabemos que isso não é verdade? Trotsky estava certo então em sua crítica básica à democracia parlamentar: não é que ela dê poder demais às massas não instruídas, mas que, paradoxalmente, apassive as massas, deixando a iniciativa para o aparelho do poder estatal (ao contrário dos “sovietes”, em que as classes trabalhadoras se mobilizam e exercem o poder diretamente). Por conseguinte, o que chamamos de “crise da democracia” não ocorre quando os indivíduos deixam de acreditar em seu poder, mas, ao contrário, quando deixam de confiar nas elites, que supostamente sabem por eles e fornecem as diretrizes, quando vivenciam a angústia que acompanha o reconhecimento de que “o (verdadeiro) trono está vazio”, de que a decisão agora é realmente deles. É por isso que, nas “eleições livres”, há sempre um aspecto mínimo de boa educação: os que estão no poder fingem educadamente que não detêm de fato o poder e nos pedem para decidir livremente se queremos lhes dar o poder – num modo que imita a lógica do gesto feito para ser recusado”.

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  5. Com fulcro nisso podemos pensar no conceito corrente mais facilmente encontrado sobre demagogia e sobrepor a esta situação a qual testemunhamos no nosso processo político eleitoral que é a base inicial do processo democrático de forma bastante tranqüila: “Demagogia é um termo de origem grega que significa "arte ou poder de conduzir o povo". É uma forma de atuação política na qual existe um claro interesse em manipular ou agradar a massa popular, incluindo promessas que muito provavelmente não serão realizadas, visando apenas a conquista do poder político ou outras vantagens correlacionadas”.

    “É a estratégia de condução político-ideológica, valendo-se da utilização de argumentos apelativos, emocionais, racionais ou irracionais, em vez de argumentos racionais para proveito próprio”.- “Em geral, a demagogia está relacionada à negativa da deliberação racional, fazendo uso de uma das falhas da democracia, qual seja, manipular a maioria pelo uso de aparentes argumentos de senso comum entremeados com disjunções falaciosas, prática esta que remonta já à Grécia antiga, muito embora sem conotação negativa a princípio”.

    A articulação dessas duas premissas é bastante clara em evidenciar que a sociedade vive num constante processo onde suas escolhas e a limitação de suas escolhas como fatos sociais dentro da visão de Durkheim estão sendo sempre postas em xeque e buscando renovação visando quebrar essa corrente de dominação social demagógica que atinge o processo democrático em sua formatação em diversos níveis.

    Para Marx isso pode ser chamado de luta de classes, para um filósofo clássico grego isso pode ser pautado na República de Platão de forma utópica, para os anarquistas a tese da desobediência civil é a resposta ao tema. Há inúmeras teses e matizes sobre isso.

    Entretanto, nenhuma delas com base nos seus arcabouço ideológicos, sociológicos e filosóficos atende de fato as necessidades do homem político, do cidadão e das diversas camadas sociais a todo momento por um largo lapso de temporal.

    Ante a isso é que se faz necessário a renovação e arejamento de práticas e planos de governo, ou até mesmo novas coordenadas para velhas ideologias e pensamentos políticos, sociais e econômicos. Tudo isso visa desembocar no chamado “power time sharing” definido pela ciência política, isto é, compartilhamento de poder via novos mandatos eletivos visando atender as escolhas da sociedade e com isso fortalecer a idéia de Estado Democrático e livre sociedade.

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  6. No entanto, a tal demagogia e seus diversos tentáculos muitas vezes colide com essa nobre intenção de proporcionar a democracia renovação de seus quadros de representantes e novas teses de gestão pública e social. Isso se deve a muitos interesses, que alguns taxam como interesses das elites ou mercados ou dos partidos, cada qual com seu foco e interesse sem levar em conta o interesse coletivo puro da sociedade.

    Para fechar a minha introdução quero expor que se pensarmos na Democracia como algo que corresponda a um plano real e fático e com referência ao contexto histórico, hoje estamos numa época que devido ao avanço do acesso a informação via mídia e internet, isso serve como ferramenta para demagogia, seja esta qual for: seja aquela que passa a operar de forma aberta como uma espécie de “flatus vocis”, ou seja, uma coisa que não quer dizer nada, bem como pode ser operada por certos segmentos como partidos, ideologias e lobbys de mercado como um motor insidioso para tomada de poder que calcifica a democracia em seu sentido real, ou seja, de poder de escolha e opinião do povo apenas como um mero detalhe no jogo de poder e não como seu ponto de partida e fator primordial.

    Isto posto, creio que essas premissas já sejam suficientes para expor a problemática da pauta desse debate e num diálogo articulado com as idéias trazidas pelo oponente possamos discorrer sobre o assunto de forma questionadora sobre não apenas o arcabouço filosófico acerca do tema, mas também sobre o momento histórico que estamos atravessando na nossa política nacional.

    Passo a palavra ao nobre colega Gasparini para sua réplica.

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  7. Vou continuar a minha exposição anterior e no final comentarei os seus pontos.

    O ESTADO É NECESSÁRIO?

    Em uma perspectiva racional, o Estado é minimamente necessário para limitar a nossa liberdade empírica (ou natural), e com isso possibilitar o exercício da liberdade enquanto faculdade racional. É o poder de polícia do Estado que permite que eu me manifeste publicamente e livremente a respeito do que eu quiser. Todo empreendimento que afeta muita gente, arbitramentos, etc..., também deve ser feito pelo Estado.

    Dessa forma, creio que não cabe mais discussão se o Estado deve ou não existir. Ele deve existir e não pode ser um Estado Total. Cabe discussão apenas sobre a melhor forma de Estado e sobre o que o Estado deve fazer e o que ele não deve fazer. O Estado que faz demais impede a autonomia (racional) dos indivíduos. O Estado que faz de menos impede que essa autonomia seja exercida. Então é preciso apenas encontrar o ponto ótimo de atuação estatal.

    LEIS EDITADAS PELO ESTADO FEREM A AUTONOMIA?

    Se digo que a finalidade do Estado é o fomento e a proteção da autonomia, o fato de ele emitir leis que obrigam a todos não feriria essa própria autonomia?

    Isso trata-se de uma confusão conceitual muito recorrente. A autonomia, dignidade e isonomia do ponto de vista racional possuem as suas imitações grosseiras naturais. Dessa forma:

    1. a imitação natural da autonomia é a liberdade de poder fazer o que quiser, sem limites;

    2. a imitação natural da isonomia é a por muitos ainda almejada igualdade de salários, hierarquias e riquezas; e

    3. a imitação natural da dignidade é achar que uma pessoa não pode ter um estilo de vida mais simples (leia-se "pobre”), que chamam "indigno".

    Eu chamaria essas imitações de autonomia, dignidade e isonomia empíricas ou naturais, e que podem ou não estar relacionadas com as racionais, mas não se confundem uma com a outra.

    Porém digo que a finalidade do Estado é o fomento e a proteção da autonomia, dignidade e isonomia (doravante apenas “autonomia”) racionais, já explicadas, não da autonomia empírica, que pode e deve ser sacrificada quando conflitar com a racional.

    Então, para o pleno exercício da autonomia racional, é preciso um certo grau de restrição à autonomia empírica.

    Para Kant, a liberdade no sentido racional também poderia ser definida da seguinte forma: “Liberdade é não ser obrigado a nenhuma outra lei a não ser aquela que a mim mesmo dou”.

    Portanto, liberdade no sentido racional não é a ausência de leis, mas a presença apenas de leis às quais eu puder dar o meu consentimento. E elas só serão assim se fomentarem ou protegerem a autonomia. Então, por exemplo, quando o Estado emite leis que proíbem o estupro (para pegar um caso bem óbvio) e estabelece punições para quem as desobedecer, mesmo que eu nem tenha participado da elaboração dessas leis, ainda assim pode ser considerada uma lei que eu a mim mesmo dei. Em uma palavra, trata-se de uma lei razoável, ou racional, ou Justa.

    Mas uma lei, por exemplo, que proibisse a comunicação pública de crenças e convicções, seria uma lei a que eu jamais daria o meu consentimento, pois fere autonomia, logo, é uma lei não racional e arbitrária.

    Portanto, as leis podem ou não ferir a autonomia racional. A reforma do Estado consiste na revogação gradativa de toda espécie de lei que fere a autonomia da razão e a sua substituição gradativa por leis razoáveis.

    Mas como se edita uma tal lei razoável? Podemos confiar que o legislador será sempre razoável e que sempre reformará a legislação em um sentido ascendente? Veremos a frente.

    O QUE OS FILÓSOFOS FALAM SOBRE A NATUREZA HUMANA?

    Creio que podemos dividir todos os filósofos que trataram de antropologia em três grandes grupos distintos (embora possa haver diversos subgrupos):

    1. os que creem que o homem é intrinsecamente bom, e que é o “sistema” que o corrompe. Acho que podemos enquadrar Platão, Rousseau e Marx neste grupo. Estes creem que, se não houvesse sistema algum, os homens viveriam livres, felizes e em paz. Essa crença é o que dá origem ao comunismo e ao anarquismo;

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  8. 2. os que creem que o homem é intrinsecamente mau, e que é preciso contê-lo para que tenha paz e não se destrua a si próprio. Hobbes é o principal representante desta corrente, que é a que dá origem a todos os sistemas autoritários, incluindo o socialismo; e finalmente

    3. os que creem que o homem é livre para escolher entre o bem e o mal. Incrível como poucos defendem essa corrente, e Kant é o principal representante dela (senão o único). E é essa ideia que dá origem à sua teoria de Estado, que garante a liberdade a quem deseja exercer a sua autonomia sem violar às dos demais, e restrições severas a quem desejar buscar a sua felicidade às custas da violação da autonomia alheia.

    Aqui cabe uma observação sobre o uso dos termos “bem” e “mal”, que também possuem os seus significados racionais e empíricos.

    O bem racional é tudo o que, feito de forma consciente, favorece ou protege a autonomia racional. O mal é tudo o que, feito também de forma consciente, viola a autonomia racional. Ações neutras são aquelas que não protegem, não fomentam, nem violam a autonomia.

    O bem empírico é tudo o que favorece a felicidade. O mal empírico é tudo o produz tristeza. Ações neutras do ponto de vista empírico não produzem nem felicidade nem tristeza.

    Um bem racional pode produzir um mal empírico, assim como um mal racional pode produzir um bem empírico. Dar esmolas a um mendigo profissional pode produzir-lhe felicidade, mas prejudica a sua dignidade, ou seja, é um mal racional; e vice-versa.

    Bem e mal racionais também só podem ser cometidos por um ser racional a outro ser racional. Nem a natureza é justa ou injusta conosco, nem nós podemos ser justos ou injustos com a natureza, nem a natureza é justa ou injusta consigo própria, pois “coisas” não podem ser justas ou injustas, nem receberem justiça ou injustiça.

    As opções “1” e “2” acima desconsideram a liberdade racional, pois elas já presumem, a priori, que sou “bom” ou “mal”. É claro que aí não seria mais possível falar em “bem” e “mal” racional, mas apenas em “bem” e “mal” empírico. Dessa forma, os dois primeiros sistemas objetivam tão somente gerar “doutrinas de felicidade”, ou seja, SISTEMAS UTILITARISTAS. Podem ser ateístas ou teístas. O primeiro grupo acha que pode determinar a felicidade por meio de cálculos que maximizem a felicidade. O segundo grupo acha que Deus deu uma fórmula de felicidade nas escrituras e que precisamos apenas segui-la para obter felicidade (hoje chamada de “salvação”).

    A opção “3” é a única que presume a liberdade. Parece até óbvio dizer que tomo as minhas decisões, mas infelizmente isso ainda parece absurdo à maioria das pessoas de hoje, sejam elas ateístas ou religiosas.

    AS DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE O “BOM” E O “MAU”

    O bom racional é aquele que, com consciência do bem e do mal, escolhe o bem. O mal racional é aquele que, com consciência do bem e do mal, escolhe o mal, ou seja, escolhe agir contra a autonomia racional.

    Do ponto de vista empírico, as ações boas e más são medidas do ponto de vista da maior quantidade de felicidade produzida (ou seja, as ações mais eficientes e eficazes para conseguir o que se almeja são as boas).

    Do ponto de vista racional, as ações boas são aquelas capazes do melhor exercício da própria autonomia, com o máximo fomento e sem violação da autonomia dos demais. Já as ações más são simplesmente aquelas capazes do melhor exercício da própria autonomia. A autonomia dos demais não entram no cálculo dos maus.

    A única DIFERENÇA entre bons e maus é, portanto, a preocupação ou desprezo para com a autonomia dos demais. Mas ambos se ASSEMELHAM no sentido de quererem as suas próprias autonomias fomentadas e protegidas no mais alto grau.

    A proposta de Estado kantiana procura então tirar partido desta peculiaridade.

    A PROPOSTA KANTIANA PARA O ESTADO

    Como nunca poderemos saber se as pessoas são subjetivamente boas ou más até que “façam as suas obras”, a proposta kantiana para o Estado pretende tirar vantagem do fato de todos, independentemente se são bons ou maus, quererem ver protegidas e fomentadas a própria autonomia.

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  9. Daí que a primeira condição de uma proposta racional para o Estado é que o poder legislativo e executivo sejam exercidos por pessoas diferentes (em outras palavras, o sistema deve ser republicano). Se o legislador e o executor são a mesma pessoa (que é o caso do sistema despótico), ele pode fazer leis que vinculam outros, mas que favorecem apenas a si próprio. Se o legislador é um e o executor outro, o legislador pensará duas vezes antes de produzir leis que o vinculem injustamente como súdito que será perante o executor.

    A segunda condição é que o governo deve ser representativo e aristocrático. Nem a autocracia e nem a democracia (no sentido de democracia direta) funcionam neste caso. O primeiro porque o poder não pode ser dividido por apenas um só. O segundo porque caso o poder fosse de todos, todos seriam ao mesmo tempo legisladores e executores, o que impediria a separação dos poderes. Por isso, só a chamada “democracia indireta representativa” (que na verdade trata-se de uma aristocracia representativa), é viável.

    Quando digo “representativo”, ele deve de fato representar o povo. Isso é mais difícil em mandatos vitalícios, e por isso é útil renovar esse voto de representatividade periodicamente, o que no Brasil é feito por meio de eleições diretas de 4 em 4 anos. Mas nada impede absolutamente que seja vitalício (como na monarquia). O que importa é que seja de fato representativo.

    Essas duas condições são necessárias, mas ainda não são suficientes para impedir que os representantes legislem e executem apenas em causa própria. A terceira condição para fechar definitivamente o circuito é o fomento da educação republicana, do uso público da razão, e da publicidade. Quando isso tudo estiver desenvolvido no seu mais alto grau, poderemos dizer que a forma estatal atingiu a sua perfeição.

    No próximo bloco detalho essa terceira condição, pois não há mais espaço.

    COM RELAÇÃO ÀS CI DO MEU OPONENTE

    O povo não pode ser governante, porque uma forma de governo popular só poderia ser despótica. E seria um despotismo de maiorias sobre minorias, que é a forma mais terrível e intolerável de despotismo.

    Uma educação republicana deveria instruir o povo que é justamente o fato de ele não exercer diretamente a autoridade que lhes preserva a autonomia. Aí os políticos não precisariam apenas fingir que não exercem o poder para exercê-lo abertamente, sem fingimentos e sem medo de ser mal interpretado. O problema neste caso está mais no povo mal esclarecido do que nos políticos.

    A chamada “crise da democracia” tem como pano de fundo o mesmo problema da falta de uma educação republicana. Trata-se de uma crise aparente, mas que pode se tornar bem real se o povo resolver se insurgir, o que nos faria regredir novamente para um sistema ditatorial, a exemplo do que ocorreu com o Egito e a Tailândia recentemente. Por isso é da máxima importância combater o pessimismo para com as democracias.

    Concordo que a demagogia é a arte de conduzir o povo, como se eles fossem máquinas, manobráveis à vontade do seu operador. Mas isso só tem o seu lugar em um povo não esclarecido.

    E nesse mote pode haver realmente um “power time sharing”, como citou. Mas depois que concluir a minha teoria dos Estados Democráticos de Direito, que na verdade não é originariamente minha, mas de Kant, veremos que em um Estado de Direito bem implementado constitucionalmente, não faz a menor diferença o partido que ocupa o poder ou a forma que ele usa para chegar lá. Isso torna-se irrelevante, desde que haja educação republicana, uso público da razão e publicidade.

    É o que posso dizer por ora sobre o tema: a demagogia é fruto da falta de esclarecimento popular, e não um mal da democracia em si. Um povo esclarecido não seria acessível à demagogia. Mas assim mesmo pode-se defender que a presença da demagogia mostra que a democracia ainda é eficaz. Em regimes anárquicos (ou no qual o Estado é muito fraco) ou em regimes ditatoriais, não existe o menor esforço de iludir o povo, pois este já é submetido pela força.

    Passo a palavra ao meu oponente.

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  10. -Réplica-

    A princípio o Gasparini pontuou a questão da demagogia como algo exterior que se manifesta na democracia. Apesar do conceito de demagogia apontar nitidamente para seu maior uso na política, corroboro em parte dessa opinião dele, porém ao meu entender a demagogia é um fenômeno mais escancarado na atividade política do que em outros campos como denota o próprio conceito. A capacidade de iludir e manobrar demagoga a torna mais perniciosa na política e por conseqüência disso nociva para o processo democrático como um todo. A demagogia é como se fosse um vírus que ataca o organismo sócio-político e o conduz para enfermidades que devem ser remediadas por uma política que vise esse estado democrático que ele mesmo apontou como um Estado Democrático de Direito de melhor qualidade onde sejam cultivadas virtudes éticas e morais. Parece-nos até mesmo que ele namora com a República de Platão no teor de suas alegações, mas não podemos afirmar isso com certeza haja vista a profusão de argumentos eivados de certa fenomenologia que recai mais sobre o indivíduo do que o sistema político regrado por ações e pensamentos humanos no qual ele convive em sociedade ora pautado como democracia.

    Nesse item recai a segunda nuance que difere o meu pensamento do dele: Para mim o Estado Democrático de Direito não deve ser responsável pela “felicidade” nem mesmo gerador da dignidade do cidadão comum de forma originária. O “Estado Democrático de Direto é uma ficção criada para ser o garantidor da dignidade já pré-existente via direitos presentes ou reproduzindo costumes e valores no ordenamento jurídico via regras genéricas e abstratas que atendam a uma gama social indistinta, não privilegiando minorias e segmentos tidos como marginalizados pela opinião pública. Para mim esse processo – e nesse ponto recorro às bases de Ihering na sua obra a Luta pelo Direito e Marx em suas teses das lutas de classes – parte da sociedade que deve de forma geral e culturalmente gerar seus próprios traços e alicerces de dignidade, sendo a felicidade algo que tange a cada indivíduo em sua vida particular. O Estado deve ser o mero organizador desses pressupostos de forma secundária estabelecendo regras representativas de ordem pública vinculantes e até mesmo coercitivas ora emanadas do espírito social (o tal volksgeist do direito alemão) e através da política estatal deve fornecer meios aos seus cidadãos de que essa dignidade possa ser exercitada de forma plena e com recursos jurídicos que a protejam como direito tendo em vista às possíveis agressões a esta dignidade individual humana reproduzida em aspectos e contornos jurídicos. Portanto, não tratamos por via da lei duma dignidade real em si mesma, mas sim do que o Direito compreende como sendo dignidade de forma ampla e valorada dentro duma cultura social humana.
    Devo salientar que o Direito é o conteúdo e a lei a forma, sendo assim a interpretação do Direito no plano do Estado recai sobre a forma buscando alicerce no conteúdo. Na interpretação das leis estatais deve prevalecer não a lei em si mesma, mas sim o conteúdo do Direito que lhe dá forma e substância. Devemos concluir que a lei não evolui por si mesma, mas é a sociedade que evolui e reflete no Direito que por sua vez insere na renovação do ordenamento de leis a voz social. Como as mudanças sociais são lentas e graduais o Direito também é imperiosamente lento em acompanhar essas transformações, e por fim a lei é mutável de acordo isso, pois ela seria o produto final desse processo que no fundo traz democracia no seu andamento, isto é, uma aderência à voz da maioria dentro do processo sócio-político temporal.

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  11. Para melhor clarificar o meu apontamento cito os autores supracitados: "O fim do Direito é a paz; o meio de atingi-lo, a luta. O Direito não é uma simples idéia, é força viva. Por isso a justiça sustenta, em uma das mãos, a balança, com que pesa o Direito, enquanto na outra segura a espada, por meio da qual se defende. A espada sem a balança é a força bruta, a balança sem a espada é a impotência do Direito. Uma completa a outra. O verdadeiro Estado de Direito só pode existir quando a justiça brandir a espada com a mesma habilidade com que manipula a balança." (Rudolph Von Ihering) - Por fim a célebre máxima de Marx: “Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência”.

    Acerca das colocações do oponente sobre lei/homem natural em face do homem racional que vive como animal racional e político em sociedade trago à baila o dizer do Marquês de Sade: “O homem natural sempre está acima do homem social”. Em suma isso quer dizer que por mais que sejamos tão racionalistas, dignos e virtuosos não será o Estado que nos define, nem mesmo nossa racionalidade ou dignidade, pois no fundo no fundo somos matéria biológica que surge e se acaba com tempo. Se forem as políticas estatais e suas ideologias que nos definem o ser ou dever ser, como devemos pensar e com agir ou fazer, estamos vivendo não num Estado Democrático de Direitos, mas num regime totalitarista tirânico com base nos ideais mais sórdidos da natureza humana que é a dominação do ego alheio através do “ego estatal” com poderes tão grandiosos de influência na vida humana que parece ser uma espécie de Matrix.


    Assim quando se versa sobre o Estado de Direito e Estado Utilitarista a questão parece tornar contorno ainda mais complexos, sem levar em conta o fato de que no homem racional está simultaneamente no homem natural a todo tempo, que e estes dois duma forma única são objeto uno, diretos ou indiretos, do Direito ou da política do estado. E ainda mais, são eles por si mesmos os geradores do Direito e da política que governa e rege a sociedade através do Direito Positivo a partir da sua convivência social.

    Ante a isso, abro minha objeção ao conteúdo do discurso do Gasparini que é calcado em demasia (ao meu ver) nas fórmulas axiológicas kantianas, as quais que prezam mais pelo minimalismo do conhecimento da origem das coisas em si mesmas no campo fenomenológico visando com isso deter-se copiosamente no aprendizado da relação entre as realidades deste e daquele objeto em função de idéias absolutas ou relativas de ontologia, as quais julgo desnecessárias e nada práticas para abordar o tema ora em pauta. Caso ele queira ainda seguir nesse caminho, quem sou eu para privá-lo desse gosto? Como diria Raul Seixas: “faça o que tu queres pois é tudo da lei” e assim continue a explorar nesse espaço limitado toda sorte de objetos e os valores que achar consistentes para explicar seus pontos de vista. Não irei mais me deter nesse campo filosofal preferindo recorrer aos pensadores sociais mais ligados diretamente ao tema.

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  12. Devo concluir minha réplica... - Para tanto esboço um algoritmo que nos parece um tanto comum para resolver a influência da demagogia no processo democrático: Se diminuirmos o número de partidos políticos, os quais são em suma partidos que não representam de fato diversos segmentos da sociedade e nem mesmo arcabouço ideológico bem definido, este já seria um passo na direção dum processo democrático mais enxuto e livre de certas mazelas da demagogia nesse setor.

    Esse é um postulado básico que se liga também ao fim da reeleição e limitação da propaganda política substancialmente marcada nos últimos tempos por técnicas de marketing político, o qual não é realmente informativo e reflexo de projetos de governo e gestão de Estado e problemas sociais e econômicos os quais em nossa realidade nos deparamos. Atualmente vivemos soterrados por demagogia e propaganda. Vemos a massa repleta de homens e mulheres naturais e racionais vivendo felizes com seus cartões de Bolsa Família, mas com sua dignidade real vendida ao sistema demagogo ora existente, pois não há de fato concretamente políticas de governo e Estado que lhes dêem meios de viverem os direitos sociais e humanos que são extensivos a todos os cidadãos independente de raça, classe social, gênero e outras tantas definições do determinismo sociológico no qual a política se apropria como tentáculo demagogo.

    Para fechar e dizer algo em contraposição à visão adotada pelo Gasparini diria que expressão teórica kantiana não ordena uma práxis tão original. Parece que Kant retoma ou toma algo de Platão ou Maquiavel, só que dentro duma expressão teórica fenomenológica sob perspectiva axiológica mais aguda, sem lidar com traços do conteúdo da vida sócio–política real repleta de circunstâncias que fogem a razão prática ora empregada por ele. Os valores do povo, muitas vezes não são iguais ao sentimento do justo impetrado pelo Estado através da República e suas normas de direito. O motivo para isso é bem causal e simples: O homem como ser humano no desempenho de suas ações na natureza e na sociedade sempre desempenha um papel renovador e progressista à frente do tempo, da lei e dos mecanismos do Estado o quais estão presos a um outro espaço de tempo e regras que como já dito tardam a se alterar para acompanhar a sociedade. Sem mais delongas seria isso...


    Passo a palavra ao nobre colega para dar segmento ao debate.

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  13. Prezado duelista,

    Vou finalizar a minha exposição e em seguida rebato alguns pontos por vc levantados.

    Como já havia dito anteriormente, o homem, seja bom ou mal, jamais abre mão da própria autonomia. Dessa forma, o sistema estatal deve ser elaborado de uma tal forma que todos exerçam vigilância constante sobre todos quando o assunto for de interesse comum.

    Eu já havia dito que o Estado deve ser republicano, aristocrático e representativo. Esses fatores dificultam que os legisladores, executores e juízes atuem em causa própria, mas eles não são suficientes.

    A fim de efetivamente inviabilizar a corrupção e as arbitrariedades, são necessários ainda três pilares:

    1. EDUCAÇÃO REPUBLICANA: me refiro aqui apenas a uma educação expositiva da forma de um Estado de Direito, das suas características, do porquê ele ser imune às imperfeições humanas, do porquê ele poder servir tanto aos propósitos dos bons como dos maus (pois infelizmente é necessária a cooperação dos maus na construção do Estado de Direito, e daí é preciso convencê-los que só neste Estado eles poderiam ter alguma esperança de ganho), e de como essa forma de Estado, ideal, pode se tornar uma espécie de protótipo a ser imitado pelos Estados empíricos. Essa educação permite que a população entenda como deve funcionar o sistema e a exercer ela própria o controle social do Estado, assim que perceber que ele está se afastando do ideal. É como conversamos outro dia sobre o problema do ativismo judicial. Ele foi percebido justamente por conta de uma certa instrução já existente. Mas ainda precisa melhorar, e muito.

    Essa educação deve ser tutelada pelo Estado, ainda que seja conduzida por particulares. O currículo desses cursos deve ser bem travado para difundir apenas os valores dos Estados Democráticos de Direito, caso contrário vão misturar a ele ideologias.

    Mas você ainda poderia perguntar: “Mas isso não é doutrinação ideológica do Estado?” Não, embora possa parecer inicialmente. Primeiro porque essa educação parte de um princípio que pode ser por todos aceito, que é a própria autonomia da vontade humana, sendo que o restante é apenas consequência, deduzida com uma precisão equivalente a da matemática. E segundo porque não se fala aqui em censurar aqueles que discordarem da proposta educativa do Estado. Pelo contrário, trata-se apenas do Estado exercer o seu legítimo direito de também falar e apresentar à população as suas vantagens. Senão as ideologias falam sozinhas, sem contraponto.

    E porque isso hoje praticamente inexiste nas escolas e universidades, os nossos adolescentes estão atingindo a idade adulta completamente vulneráveis às ideologias antijurídicas, como as que os levaram para as ruas no ano passado e se constituíram em sério risco à nossa democracia (lembre que os governos do Egito, da Tailândia e da Ucrânia caíram por conta de manifestações populares semelhantes). Enquanto essa educação não for implementada, o nosso Estado de Direito estará sob constante ameaça, e será ameaçada justamente pelos seus maiores interessados: o próprio povo.

    2. USO PÚBLICO DA RAZÃO: não adianta nada sermos educados para conhecer o sistema e identificar os seus problemas, se não pudermos criticá-los publicamente. São as críticas ao sistema que estimulam o governante a reformar um sistema ineficiente.

    Mas o uso público da razão também tem um outro papel fundamental, na educação, pois sem a liberdade de expressão nós sequer conseguiríamos pensar acuradamente. Vale aqui um outro valioso ensinamento de Kant:

    "Há decerto quem diga: a liberdade de falar ou de escrever pode ser-nos tirada por um poder superior, mas não a liberdade de pensar. MAS QUANTO E COM QUE CORREÇÃO PENSARÍAMOS NÓS SE, POR ASSIM DIZER, NÃO PENSÁSSEMOS EM COMUNHÃO COM OS OUTROS, AOS QUAIS COMUNICAMOS OS NOSSOS PENSAMENTOS E ELES NOS COMUNICAM OS SEUS! Pode, pois, muito bem dizer-se que O PODER EXTERIOR, QUE ARREBATA AOS HOMENS A LIBERDADE DE COMUNICAR PUBLICAMENTE OS SEUS PENSAMENTOS, LHES ROUBA TAMBÉM A LIBERDADE DE PENSAR..." (Kant em O que significa orientar-se no pensamento?)

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  14. Infelizmente todos nós temos preconceitos, e só é possível eliminá-los ao confrontarmos os nossos pontos de vista com os que de nós divergem. Sem isso, jamais identificaríamos o erro em nós. Dessa forma, o uso público da razão não apenas nos permite criticar o sistema, mas também nos educarmos.

    No entanto, é preciso não confundir o direito de crítica ao governo com o direito de revolução, o que na verdade representaria um direito que significaria o fim de todos os direitos. Todas as tentativas de revolução devem, a meu ver, ser duramente combatidas (dentro da moralidade), ao passo que a liberdade de expressão deve ser fomentada no seu mais alto grau.

    E deve haver um duplo compromisso aqui: primeiramente o governante deve garantir a liberdade de expressão em sua máxima abrangência. Mas por outro lado, o povo também deve dar a segurança necessária ao governante de que não tentará tomar o poder por meio de uma insurreição. E essa segurança é ameaçada por meio de manifestações populares violentas, como as que vimos no ano passado. Se o povo não der essa segurança aos Estados, a tendência é que o Estado endureça e regrida para um regime autoritário, ainda que temporário. É papel da educação republicana evidenciar isso para a população.

    3. PUBLICIDADE: em terceiro lugar, não adianta sermos educados para reconhecer as falhas sistêmicas e sermos livres para criticar essas falhas, se não pudermos ver e avaliar o conteúdo do que o governo anda fazendo. Tudo o que é de direito comum deve, portanto, ser público, especialmente as motivações que levaram às decisões (há evidentemente algumas exceções justificáveis, que não vou tratar aqui por causa do espaço). Nesse sentido, vale novamente dois ensinamentos de Kant em “Para a paz perpétua”:

    ‘São injustas todas as ações que se referem ao Direito de outros homens cujos princípios não suportam a publicação’.

    ‘Todas as máximas que necessitam a publicidade (para não fracassar em seus propósitos) concordam com o Direito e a Política ao mesmo tempo’.

    Kant então coloca dois check points que eliminam parte da zona cinzenta nos juízos de justiça ou injustiça. Primeiro ele demarca o que é manifestamente injusto. A recíproca, contudo, não é sempre verdadeira, pois nem tudo o que é tornado público é necessariamente justo. Apenas o que não pode vir a público é injusto. A desonestidade e a injustiça só são possíveis na opacidade. Neste sentido, indico uma notícia do ano passado que fala do ranking de corrupção no mundo. Repare o quanto a ideia de corrupção está associada à falta de transparência. Não se mede corrupção pelo número de casos concretos descobertos, mas pelo grau de transparência de um Estado:

    http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/12/ranking-de-corrupcao-coloca-brasil-em-72-lugar-entre-177-paises.html

    A segunda máxima fala do que é ao mesmo bom do ponto de vista utilitário e justo do ponto de vista jurídico. Ou seja, se eu não apenas posso tornar público, mas eu preciso tornar público para ter sucesso, então o que estou pretendendo fazer é ao mesmo tempo útil e justo (ou seja, concorda ao mesmo tempo com a política e o Direito). As políticas de participação popular nas decisões de governo, ainda que inconscientemente, no fundo têm o objetivo de legitimar juridicamente as decisões políticas do governo.

    A publicidade é o que finalmente termina o edifício do Estado ideal, pois é absolutamente impossível esconder publicamente uma desonestidade. Se ela for cometida, for pública, e a população for mediocremente instruída para analisá-la, ela será descoberta, que então poderá ser criticada pelo uso público da razão e coibida. A publicidade tem a função de não apenas pôr a descoberto a corrupção, mas também de evitá-la, porque o corrupto em potencial, se tiver entendimento, pensará 100 vezes antes de se expor ao se dar conta da possibilidade de esconder a desonestidade. Isso fomentaria também a eficiência administrativa, pois ninguém vai querer aparecer para o público como ocioso ou incompetente.

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  15. Se esses aspectos estivessem todos plenamente implementados, não faria a menor diferença quem ocupa as posições de governo. Se nós ainda somos vulneráveis é porque estes aspectos ainda não estão completamente desenvolvidos. E o que falta é melhorar a educação e a publicidade, porque o restante já se encontra plenamente desenvolvido. Esses dois pontos deveriam ser, a meu ver, os principais objetos das reivindicações populares.

    Vejamos os seus pontos:

    "Parece-nos até mesmo que ele namora com a República de Platão no teor de suas alegações..." (Alonso)

    A República de Platão seria uma república totalmente comunista, que não pressupõe a liberdade.. Até as mulheres eles partilham nessa república "ideal". Nada a ver com o que estou defendendo, que é um sistema que pressupõe a autonomia.

    "A demagogia é como se fosse um vírus que ataca o organismo sócio-político e o conduz para enfermidades que devem ser remediadas por uma política que vise esse estado democrático que ele mesmo apontou como um Estado Democrático de Direito de melhor qualidade onde sejam cultivadas virtudes éticas e morais." (Alonso)

    Nós, como homens, temos uma obrigação subjetiva de um contínuo melhoramento ético-moral. E como estamos (ao que parece) muito longe da “santidade”, somos levados a crer que a atuação estatal é dependente do grau de santidade dos que ocupam as posições de governo.

    E é aí que a ideia de Kant para o Estado é original, porque ela é insensível à falibilidade e mesmo à maldade humana.

    A Religião é a disciplina que tem como fim convencer (e não obrigar) o homem a ser bom (no sentido ético-moral). É verdade que a religião está hoje a tal ponto desvirtuada, que pode-se dizer, sem exageros, que não há hoje nenhuma autêntica Religião no mundo. Mas isso, contudo, não a destitui da sua vocação natural, de modo que ainda compete a ela o encargo de convencer o homem a renunciar ao mal e aderir ao bem moral.

    Se o Estado, contudo, dependesse da santidade do homem, seria preciso deduzir que o Estado dependeria da Religião, de modo que quando a Religião desempenhasse mal o seu papel, o Estado seria corrupto, e só quando a Religião desempenhasse bem o seu papel, o Estado seria justo. A consequência disso seria o fim do Estado laico e somente um Estado teocrático seria possível, visando à maior ética possível (e não apenas o Direito), e a reforma do Estado na verdade dependeria de uma reforma da Religião. Resumindo: não é difícil perceber que não pode ser assim.

    O papel da Religião não é para se desprezar, mas ela tem um valor apenas subjetivo, ou seja, ela só pode servir ao indivíduo que quiser a ela livremente aderir para reformar a si próprio, e não como instrumento do Estado para coação para melhorar os outros. A reforma do Estado deve seguir um caminho totalmente diverso ao do melhoramento do homem e mesmo dele independer. E para isso basta apenas entendimento, e não necessariamente boa vontade.

    "Para mim esse processo – e nesse ponto recorro às bases de Ihering na sua obra a Luta pelo Direito e Marx em suas teses das lutas de classes – parte da sociedade que deve de forma geral e culturalmente gerar seus próprios traços e alicerces de dignidade, sendo a felicidade algo que tange a cada indivíduo em sua vida particular." (Alonso)

    A dignidade é dada e não construída. Deve derivar somente do princípio da autonomia. Os povos podem ser empiricamente (culturalmente diferentes). Mas juridicamente eles devem ser absolutamente iguais, ou seja, nenhum deles pode tolerar a mais ligeira violação da dignidade (no seu sentido racional).

    "Portanto, não tratamos por via da lei duma dignidade real em si mesma, mas sim do que o Direito compreende como sendo dignidade de forma ampla e valorada dentro duma cultura social humana." (Alonso)

    O Direito imperfeito é assim. Mas o Direito perfeitamente constituído não pode ser assim. A dignidade só pode derivar da autonomia da vontade. Qualquer outro princípio apenas nos rebaixaria ao estado de "coisas", em maior ou menor grau.

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  16. Para evitar deixar pontas soltas quero ainda comentar algo que o Gasparini mencionou na sua réplica: “Concordo que a demagogia é a arte de conduzir o povo, como se eles fossem máquinas, manobráveis à vontade do seu operador. Mas isso só tem o seu lugar em um povo não esclarecido”. Vou me valer de certo revisionismo histórico para abordar isso:


    O EUA na sua fundação era uma nação de colonos agrícolas basicamente e de pessoas expurgadas e contrárias ao sistema absolutista monárquico inglês que deram preferência a um Estado Democrático de Direito em sua concepção dando ênfase a liberdade através de convenções socais e legais pautadas no sentimento republicano. Haveria demagogia no princípio de valores dessa nação que a partir da sua independência pela lutou para ser um país livre e soberano distante do império de regras e filosofias absolutistas? Por sua vez, na Alemanha, país de tradição cultural e educação de qualidade e até mesmo com uma certa camada da população conhecedora dos preceitos kantianos ora empregados pelo meu adversário, não foi nesse país que surgiu a mais desastrosa e nociva forma de demagogia com o advento do Nazismo e sua ascendência ao poder?


    Se analisarmos bem, dum lado temos uma nação basicamente de camponeses com educação ainda rudimentar pautada até mesmo na moral religiosa e valores contrários a dominação do poder absolutista. De outro uma nação já livre e unificada em certos valores que caiu nas garras da demagogia dum partido e na lábia nefasta de seu líder e viu-se trucidado numa guerra entre o dito mundo livre e dominação de teses fascistas onde o Estado e sua ideologia era o maior pólo de influência social e moral dentro da sociedade. Nessas sociedades qual Direito Positivo prevaleceu? Certamente foi naquela sociedade a qual originou e formou seus conteúdos de normas e regras sociais e legais dentro da perspectiva de liberdade e democracia através da luta incessante por isso, sem necessitar duma educação mais aprofundada nesses termos, pois esse senso não é meramente racional e postulado filosófico, mas sim um sentimento de justiça e liberdade que está ligado a cada pessoa humana no tecido social que preza por essas qualidades dentro da sociedade. Poderia me alongar nesse foco apontando fatos e argumentos que comprovam mais ainda essa minha descrição da realidade no quesito demagogia vs democracia, porém devido o espaço limitado e outras teses a serem rebatidas creio que este parágrafo já tenha elucidado a questão e refutado a colocação do meu adversário retórico.

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  17. Se o Gasparini fosse marxista ele responderia a tudo isso com a seguinte inserção advinda do Manifesto Comunista: “O que demonstra a história das idéias senão que a produção intelectual se transforma com a produção material? As idéias dominantes de uma época sempre foram apenas as idéias da classe dominante”.


    Podemos dizer que demagogia é falta de esclarecimento popular tanto quanto possa ser uma ideologia política que oculta a verdadeira realidade social aos olhos do povo. Já vimos ditaduras de todos os tipos que implantaram ideologias das mais variadas que cegaram a população e levaram ao aprisionamento em conceitos chaves dessas teses de dominação da classe dominante demagoga. Falo em ditaduras em países que caíram nas garras desse molde de demagogia insidiosa e não de países com liberdade de expressão e educação social e política de alto nível que ainda impedem a implantação desses sistemas ideológicos-demagogos. Poderia citar Burkina-Faso que caiu nas mãos de socialistas admiradores da Revolução Cubana através de seu líder Sankara que inspirado em Che fez o que não fora feito na própria Cuba pós-revolução: Libertação do domínio das elites opressoras. Em Cuba apenas se trocou uma ideologia dominante pela outra e fez do discurso demagogo uma arma para convencer muitos que a revolução era a solução. Sankara por sua vez pensava em democracia participativa e direitos difusos e educação igualitária para todos, mas a base ideológica que ele se valeu para isso, a qual detém em sua raiz essa concepção prática, sempre se altera quando detém o poder em grande parte dos casos.


    A demagogia se refere na prática a essa capacidade de manobras políticas até mesmo ideológicas e porque não dizer de informação e desinformação através duma mídia que se rende aos interesses de servir determinado grupo político. O que o Gasparini nos traz com a idéia duma educação republicana é nobre, mas como implantar isso numa sociedade onde as informações e educação não são arejadas pelo senso de liberdade e justiça desvinculados de ideologias políticas e sociais, e sim por motores demagógicos que alienam nesses mesmos padrões? Sabemos que os governos sobrevivem de aprovação tendo em vista a resolução de problemas sociais, econômicos e outros que dizem respeito ao desenvolvimento da sociedade de forma integral. Entretanto, o pressuposto da demagogia mais forte, nociva e virulenta está no campo onde o governo não realiza esse desenvolvimento e se vale de discursos que convencem a sociedade ou a mantém refém de suas teses. É esse o pano de fundo demagogo desde duma Cuba até uma URSS e hoje vemos isso se passar em nosso país de certa forma bastante visível. Temos uma educação de nível baixo e não comprometido com a liberdade de pensamento, formamos opinião através duma mídia eivada de compromissos com setores que visam seus próprios interesses e temos uma democracia devido a Ditadura extirpou do meio político nomes que deixaram lacunas na formação de novas lideranças.

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  18. Nesse último caso houve uma apropriação de elementos maciços de demagogia nessas lacunas por parte de inúmeros partidos e mecanismos sociais que se valem do discurso repetitivo sobre mazelas e desmandos como se fossem paladinos da ética pública. Quando estes mesmos detém o poder os vemos comprometidos com os mesmos vícios daqueles que antes estavam no poder. A começar pela demagogia, passando pela corrupção e impunidade até chegar ao ponto de institucionalizar de vez práticas engessadas de burocracia que não atendem a sociedade e valendo-se de teses que corrompem a integração nacional dentro dum senso republicano democrático.


    Diante disso, quando o Gasparini coloca que a dignidade é produto da autonomia da vontade, mas essa vontade ora é legítima sendo a vontade social imperativa, a vox populi, e ora pode ser a vontade que o Estado quer ecoar na população via instrumentos demagogos empregados pelo Estado tais como a propaganda - como no caso da Alemanha Nazista e outros tantos exemplos como vemos na atual conjuntura da América Latina nos regimes de esquerda em especial. Dignidade social e humana ainda recai sobre a tutela do Direito Positivo e como disse Ihering: é preciso lutar para sermos ouvidos pelo Estado detentor da produção de normas e regras que atingem a todos, caso contrário o Estado produzirá apenas o que lhe serve para manter no poder os grupos de dominação social que melhor militam ativamente na sociedade. Sem dúvida que isso é algo nocivo ao processo democrático de qualquer sociedade e fere muito da dignidade da pessoa humana a começar pela sua liberdade de expressão social de vontade.


    Se olharmos para história veremos que Maquiavel tinha muita razão na maioria dos casos se valendo da sua tese do “bom governo” – Ao romper com o deve ser político ideal com base no sentido do homem real Maquiavel sustenta que o governo deve sempre se basear e sustentar de acordo com a conjuntura política atual com ações que se adéquem a isso e não com base em mecanismos filosóficos específicos onde enxergamos tudo preto no branco como se isso funcionasse a todo momento. A política é feita de ação e não de organização de pensamentos filosóficos aplicáveis a conjuntura política. Se filosofia fosse a base real da vida política o Gasparini seria obrigado a concordar com a República tanto quanto concorda com a visão kantiana e isso o colocaria num beco sem saída naturalmente. Será que ele dirá que não é nada disso? Veremos a seguir...

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  19. Não me consta, Alonso, que na Terra tenha existido algum dia algum povo esclarecido. Não me refiro aqui às individualidades, porque em todos os povos sempre existiram pessoas muito esclarecidas. Porém as grandes massas nunca foram esclarecidas, e isso em todos os povos.

    Aqui creio ser útil fazer uma distinção entre cultura e esclarecimento. Um indivíduo ou um povo pode ser culto, porém pode não ser esclarecido.

    Esclarecimento, como bem dizia Kant, é a capacidade de fazer uso do próprio entendimento sem a tutela de outro. Ou seja, o esclarecimento possui um vínculo obrigatório com a autonomia.

    Nós dois testemunhamos várias discussões no FB de pessoas muito cultas, mas muito pouco esclarecidas, ou seja, que não são capazes de emitirem uma opinião autônoma, uma opinião sem se apoiar em alguém. Para eles, o que refuta um argumento não é um outro argumento, mas “milhares e milhares” de artigos de supostas autoridades no assunto (oficiais ou não) que concluíam em sentido contrário ao argumento proposto. Não que esses artigos não contivessem realmente a verdade sobre a questão, ou mesmo a refutação do argumento. A crítica é quanto à forma como eles são utilizados, sem nenhum critério, quando se tem é justamente preguiça de pensar e contra argumentar.

    E aí, um se escora no outro, que se escora no outro, que se escora no outro, e quando nos damos conta, vemos vários argumentos “mancos”, que não param de pé por si sós, escorados uns nos outros por milhões de pessoas, sem que sequer uma delas saiba explicar o porquê de aquele argumento defendido ser verdadeiro, apenas alegando que “um outro” já o teria explicado e não precisa repetir o que “todo mundo já sabe”.

    Em uma discussão no FB eu coloquei em xeque a tese da seleção natural com a seguinte pergunta:

    “Explica para nós o raciocínio. Como os fósseis mais o método cientifico provaram que é impossível o Design?”

    A resposta veio em seguida:

    “Eu??? Hahahaha... Não sou bióloga; para que eu entendesse demorei aaaaannnoooosss... Cada um na sua colega; se queres aprender, estude; se não, por mim, tudo bem. Como eu disse, se não aceitas o Método Científico, então, siga em paz!...”

    E esse tipo de resposta é invariavelmente uma regra com quem converso. Em resumo, ela não tem o argumento. Ela me remeteu para outros, que teriam então o encargo de me “explicar”. Mas quando vamos a esses outros, eles também nada explicam e remetem a outros, e esses outros a outros, que às vezes retornam para os primeiros, em um círculo perpétuo e vicioso, sucessivamente, de modo que falácias desfilam por aí como se fossem verdades, simplesmente porque possuem muitos apoiadores. Na Religião o mesmo ocorre.

    São pessoas cultas? Sem dúvidas! Mas não são esclarecidas, pois não conseguem fazer um uso autônomo do próprio entendimento.

    Não entenda aqui que estou dizendo que devemos fechar os nossos olhos e os nossos ouvidos para tudo aquilo que não é a nossa opinião, sob o argumento de que devemos pensar autonomamente. Longe disso, porque a nossa educação é em parte feita analisando e até aproveitando o que outros já fizeram.

    O que digo é que, mesmo quando estou usando um argumento alheio, eu devo utilizá-lo como se ele fosse meu próprio, ou seja, eu devo defende-lo por mim mesmo, ao invés de, quando contestado, simplesmente dizer: “espera aí que vou procurar a resposta no livro do fulano”, como se essa literatura fosse um oráculo a quem eu recorresse para ocultar a minha ignorância.

    Certamente que os argumentos que utilizo eu os aprendi de Kant. Mas não os apresento só porque eram de Kant, mas os apresento porque li e entendi (pelo menos creio que entendi), e os apresento como se fossem meus próprios argumentos.

    Eu já mudei a minha opinião antes ao ler certos autores. Mas isso não ocorreu da noite para o dia, facilmente e sem luta interna. Você escreveu lá no FB que “talvez seja hora de admitir que não temos um acordo em nossos pontos de vista devido a certas nuances específicas”.

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  20. De fato. E eu realmente me admiraria, e me decepcionaria, se ao final deste embate você escrevesse algo do tipo: “Amém Rafael, eu cedo aos teus argumentos que agora reconheço serem a mais pura expressão da verdade, etc...!”. Se isso acontecesse, isso significaria que estaria deixando a sua razão se guiar pela minha, o que não pode ser se fosse de fato esclarecida. Evidente que não deve esperar o mesmo de mim.

    Mas certamente os meus argumentos produziram alguma impressão em você, assim como os seus argumentos produziram alguma impressão em mim, assim como os nossos argumentos produzirão impressões em todos os que nos lerem, e a primeira reação natural em todos nós é reagir contra tudo o que contradiz as nossas ideias prévias sobre o assunto. E será justamente a incapacidade de encontrar os argumentos de refutação que poderá nos levar a um ajuste de opinião após mais ou menos tempo. Por isso eu digo que aprendo mais quando sou refutado (embora isso seja doloroso) do que quando refuto alguém.

    Portanto, não se trata aqui do objeto da convicção, mas da forma pela qual atingimos as nossas convicções. Se ela é tutelada, então ela não é esclarecida, mesmo que o dogma adotado se trate de uma verdade em última instância.

    Eu escrevi isso tudo para dizer que a maioria das pessoas é ainda tutelada e não é esclarecida, de modo que são constantemente manobradas para lá ou para cá, como máquinas, por aqueles que se auto intitulam seus tutores, e estes podem ser tanto pastores e padres, como políticos e governantes, e mesmo cientistas e filósofos. Tanto a Alemanha quanto a América era formada de uma população não esclarecida, embora a Alemanha fosse mais culta. Kant até que tentou convencer o povo ao esclarecimento, com o seu famoso artigo “Was ist Aufklärung?”, mas infelizmente “não pegou”.

    Na America, a população podia não ser esclarecida, mas os seus fundadores eram relativamente esclarecidos, e foram eles que determinaram o destino da America já na sua fundação. Na declaração de independência:

    “…. We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness. — That to secure these rights, Governments are instituted among Men, deriving their just powers from the consent of the governed,…”

    No memorial Thomas Jefferson também lemos:

    “No man shall be compelled to frequent or support any religious worship or ministry or shall otherwise suffer on account of his religious opinions or belief, but all men shall be free to profess and by argument to maintain, their opinions in matters of religion. I know but one code of morality for men whether acting singly or collectively.”

    É evidente que os demagogos americanos tentam o tempo todo deturpar esses princípios, mas eles estão lá, gravados (literalmente) em pedra, de modo que o máximo que conseguem é desviar um pouquinho para a esquerda ou para a direita, mas não conseguem revogar.

    Já a Alemanha tinha sido governada apenas por déspotas e não tinha uma Constituição forte e liberal (não no sentido empírico, mas racional) como a americana. Por isso ela era por demais dependente da boa vontade do governante, e quando um verdadeiro “demônio” chegou ao poder, deu no que deu.

    Espero com isso ter respondido a primeira objeção. Vamos às outras.

    “Certamente foi naquela sociedade a qual originou e formou seus conteúdos de normas e regras sociais e legais dentro da perspectiva de liberdade e democracia através da LUTA incessante por isso, SEM NECESSITAR DUMA EDUCAÇÃO MAIS APROFUNDADA NESSES TERMOS, pois esse senso não é meramente racional e postulado filosófico...” (grifei)

    Uma população não esclarecida é um risco constante para as democracias. Democracias se aprimoram pela via negociada e não com “lutas”. Manifestações populares intensas fizeram, por exemplo, a democracia egípcia e a tailandesa retrocederem para ditaduras militares; na Ucrânia as manifestações levaram a um golpe de Estado que provocou uma guerra civil com movimentos separatistas.

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  21. São resultados mais do que previsíveis e o mesmo teria ocorrido no Brasil caso as manifestações não cessassem. Uma população esclarecida saberia disso. Uma população não esclarecida acha que ir para as ruas e gerar transtornos é a solução; não entendem que são parte do problema.

    “Podemos dizer que demagogia é falta de esclarecimento popular tanto quanto possa ser uma ideologia política que oculta a verdadeira realidade social aos olhos do povo.” (Alonso)

    Com publicidade e uso público da razão, a ideologia só consegue ocultar algo de quem não pensa autonomamente, de quem gosta de ser tutelado, porque quem quer realmente saber nunca é enganado. Mas é muito difícil convencer a se esclarecer aquele que gosta de ser tutelado. Nada há o que se fazer nesses casos a não ser lamentar e ver os demagogos explorarem essa gente intelectualmente preguiçosa. Faz parte do jogo e não há porque sofrer por causa disso. As pessoas realmente esclarecidas sempre saberão se virar bem em qualquer contexto.

    “O que o Gasparini nos traz com a idéia duma educação republicana é nobre, mas como implantar isso numa sociedade onde as informações e educação não são arejadas pelo senso de liberdade e justiça desvinculados de ideologias políticas e sociais, e sim por motores demagógicos que alienam nesses mesmos padrões?” (Alonso)

    A dificuldade é grande, de fato. A educação republicana (inclusive com o fomento ao esclarecimento) deve ser inserido no sistema educacional. O problema é que os que cuidam desse sistema educacional podem não ter a menor vontade de implementar isso, porque eles próprios não são esclarecidos e são também dominados por suas próprias ideologias.

    Mas o uso público da razão pode contribuir bastante para esclarecer o povo. Nós, quando trocamos as nossas ideias, nos esclarecemos mutuamente. É possível que com o advento e a popularização das redes sociais esse problema do esclarecimento seja bastante mitigado no futuro. As mídias não mais falam sozinhas. Hoje, literalmente, qualquer um pode falar e ser lido ou ouvido. Antes isso era monopólio das grandes redes de comunicação. Ainda não vimos muito os efeitos disto porque estamos pegando o comecinho do advento das redes sociais. Mas acho que o futuro pode nos reservar boas surpresas quanto ao esclarecimento da população por conta dessas redes. E com o aumento de pessoas esclarecidas, maiores serão as chances de algumas delas atingirem as posições relativas ao planejamento da educação.

    “Se filosofia fosse a base real da vida política o Gasparini seria obrigado a concordar com a República tanto quanto concorda com a visão kantiana e isso o colocaria num beco sem saída naturalmente.” (Alonso)

    A filosofia é a base do sistema político. Mas nem toda a filosofia é de fato “Filosofia”. Há muita contradição nesse meio e muita coisa refutada, embora isso ainda não tenha sido percebido pela maioria.

    Tudo para a razão humana deve partir de princípios. Quando partimos do princípio que o homem é autônomo e portador de dignidade intrínseca, produzimos leis com base nisso (leis jurídicas). Quando partimos do princípio que o homem é apenas um animal mais sofisticado, mas que não é autônomo, que é sempre manobrável, da mesma forma produzimos leis que concordam com isso (leis utilitárias). Só que para partir de princípios devemos ser racionais, e um princípio cuja consequência é negar a racionalidade em nós é uma contradição em si. O sistema platônico não é adequado a um homem racional, e por isso pode ser com toda justiça rechaçado, a despeito das boas intenções desse filósofo.

    O homem animal é político; o homem racional é jurídico. Maquiavel estava certo com relação ao homem político, que então deve se reger por princípios de prudência e adequado às contingências locais e temporais. Mas estava errado com relação ao homem jurídico, que então deve partir de um princípio primeiro, a priori e irrenunciável: a autonomia da vontade. Mas Maquiavel não fazia essa distinção, que começou apenas com Kant. Erro compreensível para o tempo de Maquiavel, mas não para o nosso.

    Obrigado e até uma próxima!

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  22. Passo às minhas considerações finais deixando claro que a visão do Gasparini é focada no homem em si mesmo como objeto duma visão filosófica que não se associa com a prática da vida social e política da sociedade integralmente. Isto é, ele trata o homem não como cidadão, nem mesmo como uma peça da sociedade, ele trata o ser humano e o sistema como objetos de estudo da filosofia de Kant, deixando assim o homem como ser social bem longe da nossa realidade atual no processo democrático e suas conseqüências sócio-jurídicas. Essa é a refutação básica a toda sorte de argumentos lançados por ele no debate todo, embora esteja de acordo com algumas nuances menos teóricas ora trazidas para discussão.


    Parto do princípio já exposto anteriormente: A sociedade e o direito são mutáveis e são frutos da evolução social duma determinada nação em seu processo histórico, social e político. A política através do processo democrático é que dá voz para população condicionar às variações da vida social e por conseqüência do Estado Democrático de Direito. Essa ênfase substitui as concepções racionalistas no setor jurídico por procedimentos empíricos e utilitaristas. Digo isso baseado nos estudos da vertente chamada de Escola Sociológica Americana, a qual anda lado a lado com Escola de Direito Livre alemã e Escola da Livre Pesquisa Científica francesa. Para quem quiser saber e compreender mais basta pesquisar essas vertentes.


    Sabemos que os conceitos fixos ou imutáveis e determinados padrões de conceitos não são o melhor modo de reger a sociedade numa democracia, tendo em vista isso é que a demagogia sempre se valeu dessa necessidade tanto de inovação do discurso ideologico quanto de conservação do status quo em seus discursos mais conservadores. Ela serve da mesma forma por assim dizer aos dois lados da ideologia política denominados direita e esquerda. Em contraponto a isso devemos pensar na Democracia e Direito como elementos da funcionalidade do Estado. Estado –Democracia – Direito nada mais são que instrumentos que devem atender a civilização da sociedade em maior grau possível fornecendo-lhes melhorias sociais e econômicas gradativas de acordo com os fatores históricos e de acordo com a sua mutação sócio-econômica. Aparentemente isso parece ser um jusmarxismo, mas não se trata de empregar uma estrutura para mover a outra, mas sim de compreender o mecanismo social como uma entidade que se posiciona em face dos acontecimentos econômicos e sociais que surgem gradativamente em seu meio.

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  23. O Direito para ser de fato democrático deve assim interpretar e criar normas legislativas que correspondam a uma correta ponderação valorativa das realidades sociais no seu processos de mutação na sociedade. Devemos enxergar isso como um grande instrumento da engenharia social que tem por finalidade o poder de regular determinadas relações sociais e até relações econômicas (Direito Propriedade – Direito Trabalhista – Direito do Consumidor) tornando ações humanas em ações socialmente e politicamente organizadas. Isso coloca em xeque a coordenação de idéias do Gasparini, pois os critérios dele são opostos a essa regulação de forma participativa da sociedade como um todo de forma prática devido fundar-se num eixo teórico que apenas explica a situação do homem social como “ser kantiano” sem flexibilidade e possibilidades de pensamento e ação de acordo com os processos históricos e situações sócio-política. O Gasparini ao tentar refutar o arcabouço do pensamento de Maquiavel coloca o homem nessa situação de inflexibilidade social e racional por mera falta de investigação dos efeitos sociais da instituições e doutrinas jurídicas do nosso tempo presente.


    Para se formar uma legislação que de fato atenda a dignidade humana, essa legislação prescinde de estudos das realidades atuais e meios adequados para que os preceitos jurídicos tenham eficácia na realidade. Gasparini desconsidera isso de forma geral e diz que a dignidade é emanada do homem e a lei deve atender isso a todo custo sem pormenorizar elucidações práticas sobre como isso afeta as instituições e camadas sociais chamadas de minorias. Se criarmos leis com base no pensamento do Gasparini corremos sérios riscos de gerar um ordenamento inflexível e conservador ao extremo mero propagador de injustiças sociais e humanas das mais variadas. Falta ao pensamento dele correlações com outras disciplinas tais como sociologia, psicologia e métodos jurídicos mais modernos. Em virtude disso aplicar apenas filosofia bruta de Kant sem considerar outras opções nesse tema não foi uma das melhores escolhas da parte dele, pois essa filosofia está na contramão do reconhecimento razoável para casos concretos no âmbito jurídico do Direito Público e Privado.


    Precisamos dum Estado onde exista combinação da flexibilidade da justiça social e não da manutenção desenvolvimento lógico filosófico como base da política de forma restritiva, ou da velha política maniqueísta dos governos fundados em ideologias ou demagogia que servem apenas para manobrar a sociedade. O pensamento do Gasparini é um tanto anacrônico dando ênfase a Kant em excesso, tal como um militante de esquerda radical louva Marx ou um liberal Von Mises sem olhar para outras possibilidades.

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  24. Os interesses e necessidades sociais não seguem a priori ideologias e manobras demagogas, nem mesmo conteúdos filosóficos desse ou daquele teor ou pensador. O erro central na abordagem do mecanismo político consiste em pensar a sociedade como sujeito onde podem injetar quaisquer ideologias, demagogia e filosofias para atender interesses de grupos sociais, elites, partidos ou como queiram chamar.

    Se o Gasparini tivesse optado em mencionar em Filosofia como base da Justiça e Política no meio social ele teria se saído melhor em suas abordagens e me faria concordar com ele.

    A justiça é um dos maiores anseios sociais e humanos em qualquer país do mundo ou civilização antiga. Por isso existem Democracia, Direito e por fim Estado e instituições públicas.

    A política que prima pela justiça é aquela que é democraticamente capaz de ouvir os apelos das necessidades essenciais do povo e traduzi-los em regras e políticas que atendam a todos de forma integral sem gerar males e divisões sociais contundentes ou sem agravar as pré-existentes via demagogia ou ideologias.

    Essa distribuição democrática de justiça social, econômica e política gera uma sociedade mais desenvolvida em idéias políticas sem ter que recorrer necessariamente aos preceitos ideológicos massivos, pois o povo está integrado no processo de gestão pública de seu país e apto a debater e a pensar em soluções para suas necessidades e rebater interesses escusos de dominação social e econômica.

    Em resumo: “A Democracia é império da Justiça para todos sem distinção de classes de pessoas onde a Liberdade existe e a Igualdade prospera”. – (Revolução Francesa)


    Isto posto, finalizo aqui minha participação nesse debate agradecendo ao duelista Gasparini e aos demais leitores desse debate pela oportunidade de expor nossas idéias aqui nesse espaço onde brigam as idéias e não as pessoas.

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