quarta-feira, 27 de junho de 2012

Marco Lisboa X Roger D'André - Comunismo - Psicopatologia na América Latina?


  1. A tese explica a virulência da psico-patologia dos comunistas latino americanos pelas diferenças culturais e históricas. Enquanto os europeus conheciam de perto as questões ideológicas abordadas por Marx e Engels, nós fomos influenciados “por políticas externas e pela infiltração de artigos e livros pró marxistas.”
    Há que se concordar em parte. Nosso continente é recente na História. Democracia representativa, divisão de poderes, direitos humanos, são institutos trazidos de fora para a realidade latino-americana. Logo uma origem externa, por si só, não seria um sintoma de patologia.
    A própria história da América Latina tratou de fornecer os seus inimigos externos: os colonizadores. Jefferson, Bolívar, José Marti e outros lideraram movimentos que não poderiam ser acusado de psicopatológicos, antes de mais nada, porque combatiam inimigos reais.
    Seria o imperialismo americano um inimigo real ou um arquétipo do inimigo vilão, sem base na realidade? Ora, o neocolonialismo e a relação de dependência e exploração entre Estados Unidos e América Latina é um dado histórico.
    Pode-se dizer, portanto, que não foi criado um inimigo a partir de um mecanismo de reflexo condicionado. Seria mais justo dizer que para realizar seu programa político os comunistas precisavam derrotar um inimigo real.
    “A partir destes sintomas [a criação de inimigos arquetípicos], surge o ponto culminante da doença: a criação de uma personalidade alternativa e a perda do contato com a realidade: o "Complexo de Che Guevara" Este complexo ... é ... o que precede o complexo de superioridade, latente em quase todo comunista.”
    Aqui temos duas generalizações perigosas: a primeira – os comunistas, em geral, se julgam iguais ao Che; a segunda – em quase todo comunista há um complexo de superioridade latente.
    Não pretendo negar que existam comunistas que se julguem iguais ao Che. Da mesma maneira, é inegável que existam comunistas com um complexo de superioridade latente (não é necessário citar exemplos).
    Infelizmente, a verificação da tese depende da comprovação da veracidade dessas duas afirmações, pois é a partir delas que se conclui que o comunismo é uma psicopatologia social. A base das afirmativas parece ser um raciocínio indutivo. Provavelmente, o autor conhece vários comunistas, a maioria deles apresenta esses sintomas, logo eles são comuns à maioria dos comunistas da América Latina.
    Popper e outros autores já demonstraram os perigos do raciocínio indutivo. Um exemplo clássico: todos os cisnes que vi eram brancos, logo não existem cisnes negros. Nesse caso, bastaria a apresentação de um cisne negro para demonstrar a falsidade da afirmação. No caso em questão, para demonstrar a falsidade da tese, eu teria que provar que a maioria ou pelo menos uma boa parte dos comunistas não se enquadra nessa tipologia.
    Eu poderia argumentar com a minha experiência pessoal: militei durante 14 anos no PC do B e a maioria absoluta dos comunistas que conheci não se enquadrava nesses tipos. Não pretendo insistir nessa linha, porque pecaria pelo mesmo defeito da tese: estaria usando um raciocínio meramente indutivo. Além do mais, não tenho como extrapolar essa experiência para toda América Latina.
    O método científico se baseia numa cadeia indutiva-dedutiva. A partir de várias experiências generalizamos uma hipótese que explica esses fenômenos e a testamos. Caso ela resista à prova, teremos, pelo menos provisoriamente, uma teoria explicativa. Uma teoria assim busca uma explicação causal.
    A tese, para explicar a causa dos complexos citados se apóia no reflexo condicionado. Ela falha ao apontar um agente externo que não seria real, o imperialismo americano, que sabemos sê-lo. Falha também ao não apontar quais seriam os estímulos reais que condicionariam os comunistas a reagir a um inimigo imaginário.
    Portanto, ela se reduz a um argumento de autoridade: o conhecimento qualificado dos comunistas latino-americanos pelo autor. Nesse caso, é justo pedir que ele explicite suas credenciais, no caso que detalhe esse conhecimento.
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  2. Boa, Marco,

    Talvez você tenha visto isso nos tópicos, mas mesmo assim irei reforçar. Ao elaborar esta tese eu deixei três falhas estruturais. Duas delas foram propositais, pois eu queria que o interlocutor as localiza-se no texto e entrasse exatamente neste ponto para formar a antítese. E meus parabéns. Você localizou uma delas.

    A terceira falha, porém, não foi proposital mas é também inevitável ao se elaborar uma tese como esta. Você localizou este ponto e terei dificuldades com isso.

    1ª Falha: "Seria o imperialismo americano um inimigo real ou um arquétipo do inimigo vilão, sem base na realidade?"

    Respondo que não. O imperialismo em si existiu. Mas, veja, existiu. No que tange à América Latina, há muito tempo não há imperialismo. O que acontece por aqui é que desde que nos tornamos uma república democrática sofremos, justamente, com políticas social-democratas, que tem raízes no socialismo, e que engessaram as leis. Além disso, sofremos com um problema latente no que diz respeito à fiscalização de fronteiras.

    Se você for ver, a ilha do Norte não nos agride atualmente. Por outro lado, os países "pobres", nossos vizinhos, estes sim utilizam nossas fronteiras para contrabando e exploram nossa mata amazônica e mata atlântica.

    O Imperialismo na América Latina é um inimigo morto há tempos. E até mesmo essa mania de perseguição constante de parte dos comunistas é emprestada dos nacionalistas mais radicais, que querem fechar fronteiras a todo custo e dificultar a importação ou exportação de produtos.

    Por ser um inimigo morto, a referência ao Imperialismo como algo atuante em nossas vidas hoje é uma patologia, como se o inimigo ainda estivesse vivo. Na verdade, é a falácia do espantalho. Ataca-se um inimigo distorcido. Quando acusam os USA de imperialismo na américa latina, estão na realidade distorcendo aquilo que os USA realmente faz.

    Agora, justificando a menção ao reflexo condicionado, explica-se justamente por que houve um estímulo real no passado que criou o reflexo. Agora, o reflexo atua sem o estímulo real, com base apenas naquele estímulo do passado. Igual ao cão que salivava ao ver o pedaço de carne, e depois salivava com o mero toque da campainha, no experimento de Pavlov.

    Penso ter justificado este ponto. Caso ainda encontre falhas, aponte.

    2ª Falha: Generalização.

    De fato, não há como escapar desta falha, que não é necessariamente uma falha mas que invalida no sentido científico este raciocínio.

    Não há como eu provar para você nem para ninguém o que eu digo. Quando afirmo que os comunistas se comportam assim, mesmo admitindo exceções estou afirmando que a maioria deles se enquadra na patologia que apresento. Isso foge totalmente de minhas mãos.

    No meu outro debate, o interlocutor foi ingênuo e caiu exatamente dentro da armadilha da tese, pois ele optou por defender o socialismo quando este nem mesmo estava sendo atacado. Você, talvez por ter mais entendimento do assunto ou por ter compreendido a tese em si, não caiu. Então, não me resta muita coisa, a não ser admitir minha incapacidade de provar que estou certo neste ponto. Só posso, contar, então com a experiência dos leitores com relação a outros comunistas que eles próprios conheçam, para ver se de fato estas afirmações servem para uma maioria.

    A única coisa que sustenta cientificamente minha afirmação genérica é o reflexo condicionado. Este já foi justificado na primeira falha. Mas a segunda falha é isso mesmo, uma falha estrutural que não está ao meu alcance solucionar.

    Só que isso ainda não invalida a tese. Ou invalida?
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  3. Em relação à generalização sobre os sintomas patológicos dos comunistas, Roger reconheceu que é uma opinião cuja veracidade deverá ser aferida pelos leitores, baseados também em suas opiniões pessoais. Nós julgamos o tempo todo baseados em opiniões e elas são legítimas, embora não possam ser usadas como suporte para uma teoria que se pretenda científica. Como ela é uma premissa essencial na sua cadeia de raciocínio, penso que sua tese fica seriamente prejudicada.
    À guisa de informação, no Brasil, o Partidão, defendia a transição pacífica e se opunha à luta armada. De outro lado, o PC do B, embora defendesse a luta armada, tinha uma concepção diferente, mais calcada na experiência chinesa. Ambos partidos faziam críticas ao modelo cubano. Embora as organizações guevaristas tivessem maior visibilidade, elas não eram majoritárias.
    Segundo Roger, sua tese se sustentaria através do reflexo condicionado. O imperialismo seria o estímulo real, que existia no passado e que teria criado o reflexo condicionado que faz os comunistas salivarem à simples menção de um inimigo que não existe mais.
    Relembrando a analogia usada, o cão saliva quando vê carne, um estímulo real. Ele passa a associar a carne a uma campainha. Mais tarde, ele saliva só de ouvir a campainha, mesmo sem a presença da carne. Há duas questões a se considerar. A primeira, que abordarei agora, é que, mesmo que a carne não exista, o comportamento do cão não é patológico. Transportando a analogia para a tese, mesmo que o imperialismo não seja mais uma ameaça real, não fica provado que o comportamento dos comunistas ao considerá-lo como inimigo seja patológico e não simplesmente um erro de julgamento. Paradigmas são difíceis de serem mudados, como mostrou Thomas Kuhn. A segunda questão, se o imperialismo é ou não um inimigo real será abordada noutra postagem.
    O imperialismo é um fenômeno complexo e dinâmico. As formas de exploração e de controle evoluíram. Será que a percepção dos comunistas também evoluiu?
    Manifesto Programa do PC do B em 62:

    “Por que tudo isso ocorre num país tão imenso e rico, habitado por um povo laborioso? Isso se verifica devido à espoliação do país pelo imperialismo, em particular o norte-americano, ao monopólio da terra e à crescente concentração de riquezas nas mãos de uma minoria de grandes capitalistas.
    Os imperialistas dominam importantes setores da economia nacional. São donos das indústrias de automóveis, pneumáticos, vidro plano, produtos farmacêuticos, frigoríficos, etc., e controlam quase toda a produção e distribuição de energia elétrica, bem como o comércio de petróleo.
    Os monopólios ianques ocupam posição destacada no comércio exterior do Brasil, impõem preços cada vez mais baixos aos produtos brasileiros de exportação e elevam constantemente os dos bens que o país importa.”

    Programa Socialista para o Brasil, de 2009:
    “A nova luta pelo socialismo se dá num mundo em mudanças nas suas relações de poder no século XXI. Está em curso uma transição do quadro de dominação unipolar que marcou o imediato pós-Guerra Fria, com a intensificação de tendências à multipolarização e à instabilidade no sistema internacional. Transição cuja essência é marcada pelo declínio relativo e progressivo dos EUA e pela rápida ascensão da China socialista. Essas tendências são fomentadas e alimentadas pela dinâmica de desenvolvimento desigual do capitalismo que tende a se intensificar com a crise internacional desse sistema. ... a crise econômica atual tende a agravar o declínio da hegemonia dos Estados Unidos, embora estes ainda preservem ampla supremacia de poderio militar. ...”
    A evolução na maneira de encarar o imperialismo americano é um forte indício de que, pelo menos para o PC do B, sua atuação não pode ser assimilada a um reflexo condicionado, onde a reação é sempre igual e não corresponde a um estímulo real. O PC do B tem mais de 300.000 membros e um papel de destaque na América Latina, podendo ser tomado como representativo da posição dos comunistas da região.
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  4. Vamos lá,

    A generalização é inevitável. Mas, pense que eu poderia ter mentido. Eu poderia dizer que fiz um estudo de caso a caso, e que fiz pesquisas de campo entrevistando comunistas por aí, e que tenho provas estatísticas. Se eu dissesse isso, fundamentaria minha tese e ninguém teria como provar que estou errado. Mas o fato é que é uma generalização com base nos comunistas que conheço e também com base nos comunistas que outras pessoas próximas a mim também conhecem. De qualquer forma, você tem razão ao dizer que isso prejudica a tese. De fato, prejudica mesmo.

    Vejamos o seguinte: O reflexo condicionado não é necessariamente patológico. Na verdade, reflexo condicionado é comum no dia-a-dia. Isso deve ficar claro. O cão salivar por um pedaço de carne não é patológico, pois na memória dele, mesmo que a carne não esteja mais ali, ele ainda se lembra dela. Esse estímulo é natural, pois nós salivamos ao simplesmente pensar em um pedaço de carne. Se eu não deixei isso claro na tese, estou deixando agora. A patologia começa a partir do comportamento que se tem com base em um reflexo condicionado.

    Atacar o imperialismo, no passado, era normal. E seria normal que este reflexo se mantivesse após algum tempo, mesmo sem a existência do inimigo. Mas, para o reflexo condicionado se manter, segundo Pavlov, é preciso que seja reforçado de tempo em tempo, pois com o passar dos tempos ele se perde aos poucos. Só que os comunistas, em geral, ainda hoje trabalham contra este inimigo que está morto há décadas. Não houve um reforço para o reflexo, ele simplesmente se manteve em um impulso de massa, virou um vício. Aí, se tornou patológico.

    Quanto ao PC do B, não posso afirmar muita coisa. Não foi neste partido que eu militei. Em minha região, o PC do B não tem influência quase nenhuma, nem conheço ninguém deste partido aqui da região. Mas, sabe o que os comunistas de outro partido falam sobre o PC do B? Dizem que não é um partido genuinamente comunista. Se é ou não, eu não sei. O que sei é que eles dizem isso de qualquer partido que não seja o deles.

    Sugiro que dê uma olhada no site da Esquerda Marxista no Brasil. Lá você verá um ataque diário ao Imperialismo, nos mesmos moldes antigos. O site é: http://www.marxismo.org.br/

    Aliás, eu devia ter usado este site para sustentar minha tese. Seria menos generalizada. rs

    Mas, vendo que você defende, por exemplo, que a existência de empresas estrangeiras explorando a mão de obra nacional é uma prática imperialista, fico receoso. Acho esta análise tendenciosa demais, é uma distorção da realidade.

    Se empresas estrangeiras se instalam no país para explorar mão de obra, isso não é porque elas são más, e sim porque nosso governo é incompetente e não investe nas áreas produtivas, deixando esta brecha enorme na economia que, portanto, alguém tem que tapar. Além disso, pensando pelo lado da classe trabalhadora, são justamente estas empresas que criam vagas de emprego em massa. Não fossem elas, qual medida o governo tomaria para resolver o desemprego? Provavelmente teriam que criar programas de bolsa-esmola, uma vez que assistencialismo traz votos é a é mais fácil do que investir na economia.

    Não vejo, portanto, como empresas de fora no país possam ser uma atitude imperialista. Muito pelo contrário, é uma atitude quase altruísta. Vir com uma empresa, uma fábrica, para um país com a carga tributária do Brasil, enquanto poderiam ir para qualquer outro lugar com uma tributação menor, é um ato de solidariedade com o trabalhador e com o governo brasileiro. Se eu fosse empresário, passaria bem longe daqui.
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  5. Meu caro Roger,
    Em momento algum eu duvidei da sua honestidade. Reconheço que eu mesmo travei conhecimento com alguns tipos afetados dos complexo de Che e de superioridade. O mal, como você mesmo reconheceu, foi a generalização. Weber trabalhava com tipos ideais, baseados em características individuais, para criar por indução um tipo que auxiliara na análise sociológica. Eu poderia aceitar esse comunista que você criou como um tipo ao estilo Weberiano, não fosse o fato de você o ter tomado como representativo de todos os comunistas da América Latina.
    Citei o PC do B como um contra-exemplo, porque é o partido comunista com maior militância, representação no parlamento e participação no governo. Não entro no mérito de ele ser o mais ortodoxo e nem avalizei a correção de suas propostas. Usei os textos de 62 e de 2009 para mostrar que para esse partido, pelo menos, houve uma evolução muito grande na maneira como seus militantes percebem o imperialismo americano.
    Em relação a presença de empresas estrangeiras, eu apenas expus a posição que os comunistas do PC do B mantinham em 62. Penso que, numa economia globalizada como a atual, como alternativa imediata de crescimento, pode ser interessante contar com o investimento direto estrangeiro, desde que ele não monopolize áreas estratégicas da economia. É uma maneira de contar com a poupança externa para crescer. A China, que é o modelo atual do PC do B, fez isso.
    Citando novamente o programa de 2009:
    “Por surgir das entranhas do modo de produção capitalista e das suas instituições, a transição para a nova sociedade ainda terá uma economia mista, heterogênea, com múltiplas formas de propriedade estatal, pública, privada, mista, incluindo vários tipos de empreendimentos, como as cooperativas. Poderá contar com a existência de formas de capitalismo de Estado, e com o mercado, regulados pelo novo Poder. Todavia, progressivamente devem prevalecer as formas de propriedade social sobre os principais meios de produção.”
    O site que você citou, da esquerda marxista, é de inspiração trotsquista. Só para ilustrar como é difícil criar um tipo ideal que represente toda a esquerda marxista, os trotsquistas e os comunistas mais ortodoxos se acusaram mutuamente durante a recente revolta líbia contra Kadafi. Para os segundos, os primeiros seriam cúmplices do imperialismo, por não apoiarem o ditador deposto. É justo acrescentar que mesmo entre as organizações trotsquistas há uma diferenciação muito grande.
    Sem a pretensão de esgotar o tema, eu dividiria assim a esquerda marxista: reformistas, trotstquistas, maoístas, populistas, stalinistas, neostalinistas, ecléticos. Os primeiros, inspirados pelo eurocomunismo, estariam representados no PPS. Os trotsquistas apresentam inúmeras divisões e cisões. O PSTU seria seu principal representante. Há ainda inúmeros movimentos que reivindicam o maoísmo, principalmente na América Latina. As FARC poderiam representá-los. Os populistas seriam a esquerda que não é ligada aos partidos comunistas mais tradicionais. Tem Chávez e Cuba como referência ideológica. Como stalinistas, teríamos o PCB como tendência mais representativa. Eu colocaria o PC do B como neo-stalinista. E finalmente há uma esquerda eclética, muito influenciada pelos indignados e os novos movimentos. Com certeza, muitas posições ficaram de fora, já que não tive a pretensão de ser exaustivo. O PSOL, por exemplo, abriga uma esquerda muito diversificada.
    Uns apóiam o Governo Dilma, outros não; uns ainda apostam na luta armada, outros privilegiam a via eleitoral; uns apóiam Chávez, outros não; novas bandeiras como as questões de gênero e a sustentabilidade foram incorporadas. A própria linguagem da esquerda marxista já abriga novas categorias como inclusão, precarização, etc.
    Toda essa diversidade, a meu ver, torna impossível a tarefa de analisá-la a partir de um mecanismo único, o reflexo condicionado.
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  6. Bem, Marco...

    Na hora em que eu li sua tréplica ontem eu não havia notado uma coisa importante que notei agora.

    De fato, quando li achei que você tivesse me dado um xeque mate e talvez se eu tivesse te respondido ontem eu tivesse aceitado sua posição como certa. Mas, agora lendo novamente percebi algo que me ajudará muito nesta questão.

    É notório que seu conhecimento político da questão é maior que o meu. Talvez pela idade, pelas experiências que tem ou porque pode ter lido mais do assunto do que eu. Mas o fato que encontrei eu seu conhecimento uma brecha que ajuda a reforçar minha tese.

    Na tréplica você apresentou uma diferenciação entre vários tipos de comunistas, vários tipos de esquerdistas, e até mesmo fez um breve resumo do assunto. Ao final, você conclui que não se pode colocar todos em uma mesma avaliação, já que seriam diferentes entre si. Mas eu te digo que é possível, ainda e talvez agora mais do que antes, avaliar todos sob o mesmo escopo.

    - Reparei que entre todos os tipos que você citou, há UMA coisa que não muda em nenhum deles: O Arquétipo do Inimigo.

    Todos os diferentes grupos que você citou, embora discordem e até se acusem ideologicamente, ainda assim têm como inimigo comum o Imperialismo e os Estados Unidos.

    Trotskistas, stalinistas, comunistas ortodoxos, enfim, todos os tipos que você citou se comportam do mesmo modo diante do "inimigo invisível", e carregam em seus discursos sempre acusações contra os EUA e contra os outros comunistas de outras correntes que estariam se vendendo aos interesses do capital especulativo ou do imperialismo.

    Ainda que no caso do PC do B a visão sobre o imperialismo tenha mudado com o tempo, percebe-se que ainda consideram o imperialismo como um inimigo real e cujos tentáculos nascem no império do norte. Essa mentalidade, aliás, não é coisa apenas de militantes políticos, mas está impregnada em boa parte da sociedade de forma bastante subjetiva.

    O fato de vermos que praticamente todos os grupos da esquerda comunista ou socialista tenham um comportamento sempre direcionado para o conflito contra esse inimigo já coloca uma ordem patológica no fato.

    E da mesma forma que o Reflexo Condicionado, que eu expliquei aqui que não é necessariamente algo patológico, o arquétipo também não é. O que é patológica é a reação que a pessoa tem ou a forma como mantem o sintoma.

    Arquétipos são apenas representações figuradas que nos cercam o tempo inteiro, nos filmes, nos livros, etc. A patologia começa apenas quando a pessoa começa a acreditar no arquétipo de forma real e passa a agir como se ele existisse em carne e osso.

    E ao final do texto você diz que usei um mecanismo único de avaliação, que seria o reflexo condicionado. Mas na realidade não foi o que eu fiz. Eu usei mecanismo múltiplos, como a projeção, os arquétipos, a alucinação, etc. Tudo isso está bem no início da tese.

    Espero ter ficado mais claro agora. E aguardo suas considerações finais!
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  7. Usando a classificação de Platão, que dividiu o conhecimento em sensível (crença e opinião) e intelectual (raciocínio e a intuição das formas verdadeiras), podemos dizer que a tese do Roger se apóia, em boa parte, em uma opinião – ele generaliza os comunistas que conhece, direta ou indiretamente, para formar um tipo ideal.
    O uso da opinião enfraquece a sua tese, embora seja difícil refutá-la a não ser através de uma opinião contrária. Já o raciocínio parte de premissas consideradas verdadeiras e avança através da lógica, como na Matemática. De novo, podemos ter conclusões verdadeiras, mesmo partindo de premissas falsas. No terreno do conhecimento intelectual, a sustentação de sua tese postula uma série de procedimentos patológicos que se originariam em uma ilusão (a de que o imperialismo ainda é o inimigo a ser combatido na América Latina).
    Minha refutação segue o princípio de causa e efeito: toda causa tem uma ação e ações iguais, nas mesmas circunstâncias, devem produzir a mesma causa. Inicialmente, através de um contra-exemplo, mostrei que o tipo que ele idealizou era uma generalização muito perigosa.
    Seguindo a mesma linha de raciocínio, a percepção do imperialismo (causa), que poderia ter gerado um reflexo condicionado, deveria produzir sempre a mesma ação – uma prática patológica baseada numa visão irreal. De novo, apresentei um contra-exemplo mostrando que pelo menos num caso, o PC do B, um partido que tem um peso considerável na América Latina, essa percepção evoluiu com o tempo, o que afastaria a hipótese de ser causada por um mecanismo de reflexo condicionado.
    Eu entendo a tese de Roger como uma afirmação não sobre todos os comunistas, mas sim sobre a sua maior parte, caso contrário, bastaria um contra-exemplo para refutá-la. Mostrei também que, sendo os comunistas divididos na prática em vários tipos diferentes, poderíamos concluir que seriam necessárias causas muito diversas para gerar o mesmo tipo de procedimento. Eu usei uma tipologia empírica, baseada em meu conhecimento prático, para ilustrar essa minha afirmação.
    Meu oponente não desqualificou essa tipologia, antes procurou se basear nela para intuir que havia um denominador comum nas ações de todos esses comunistas: o seu antiimperialismo. Nesse ponto chegamos a um terreno mais firme: se eu demonstrar que o imperialismo é um inimigo real, ao contrário do que ele afirmou, sua tese sobre a psicopatologia ficaria muito abalada.
    O imperialismo supõe uma potência central, que mantém relações de dominação com a periferia. Ele surge do desenvolvimento desigual do capitalismo. Enquanto um sistema dinâmico e em transformação, só se extinguirá através de sua superação ou de um retrocesso.
    “Para Panitch/Gindin, o imperialismo atual se caracteriza pela capacidade do Estado americano de penetrar e coordenar os outros Estados líderes capitalistas. O dinamismo do capitalismo americano e o seu apelo mundial, combinado com uma linguagem universalista da ideologia de democracia liberal, apoiam a capacidade do império informal de ir além dos impérios anteriores. ... Assim, a ordem capitalista mundial se organizou e regulou pela via de reconstrução de outros Estados como elementos integrais do império informal americano.” http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1211
    A globalização é um fenômeno novo e ainda na suficientemente estudado. A caracterização que citei acima, embora parta de uma abordagem marxista, não é consensual.
    Retomando os elementos mais importantes: nosso desenvolvimento atrasado nos colocou na periferia e o imperialismo só se transforma através do confronto com as forças que a ele se opõe. Como a própria tese parte da existência anterior do imperialismo, deveria reconhecer que essa oposição é natural ao processo de evolução do capitalismo. Com isso penso ter mostrado que o anti-imperialismo das diversas correntes comunistas tem um base objetiva.
    Concluindo: a tese permanece no terreno da opinião, parte de premissas que não se sustentam e não pode ser provada através do raciocínio lógico.
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  8. Bem, não há muito o que ser dito por aqui.

    A conclusão do meu oponente, em parte contraria minha tese, e em parte a sustenta.

    No caso, persistiria aqui que o reflexo condicionado existe porque um dia houve imperialismo, de fato, e que a existência passada deste imperialismo teria criado o reflexo nos comunistas, que permaneceram agindo como se o inimigo ainda existisse. Mas, eu já disse isso, meu adversário não concorda e não há necessidade alguma de eu repetir. Cabe ao público julgar se meu pensamento é correto ou se meu oponente tem mais razão do que eu neste aspecto.

    Como também já admiti a questão da generalização, desde o início, não há muito o que dizer neste sentido.

    Ademais, achei este debate bom, inteligente e produtivo. Meu oponente soube se portar, apresentou seus argumentos de forma clara e, diria eu, convincente. Simplesmente não concordamos neste ponto de vista e é só isso mesmo.

    De agora em diante, é com os leitores.

    Finalizo aqui minha participação.

8 comentários:

  1. A tese explica a virulência da psico-patologia dos comunistas latino americanos pelas diferenças culturais e históricas. Enquanto os europeus conheciam de perto as questões ideológicas abordadas por Marx e Engels, nós fomos influenciados “por políticas externas e pela infiltração de artigos e livros pró marxistas.”
    Há que se concordar em parte. Nosso continente é recente na História. Democracia representativa, divisão de poderes, direitos humanos, são institutos trazidos de fora para a realidade latino-americana. Logo uma origem externa, por si só, não seria um sintoma de patologia.
    A própria história da América Latina tratou de fornecer os seus inimigos externos: os colonizadores. Jefferson, Bolívar, José Marti e outros lideraram movimentos que não poderiam ser acusado de psicopatológicos, antes de mais nada, porque combatiam inimigos reais.
    Seria o imperialismo americano um inimigo real ou um arquétipo do inimigo vilão, sem base na realidade? Ora, o neocolonialismo e a relação de dependência e exploração entre Estados Unidos e América Latina é um dado histórico.
    Pode-se dizer, portanto, que não foi criado um inimigo a partir de um mecanismo de reflexo condicionado. Seria mais justo dizer que para realizar seu programa político os comunistas precisavam derrotar um inimigo real.
    “A partir destes sintomas [a criação de inimigos arquetípicos], surge o ponto culminante da doença: a criação de uma personalidade alternativa e a perda do contato com a realidade: o "Complexo de Che Guevara" Este complexo ... é ... o que precede o complexo de superioridade, latente em quase todo comunista.”
    Aqui temos duas generalizações perigosas: a primeira – os comunistas, em geral, se julgam iguais ao Che; a segunda – em quase todo comunista há um complexo de superioridade latente.
    Não pretendo negar que existam comunistas que se julguem iguais ao Che. Da mesma maneira, é inegável que existam comunistas com um complexo de superioridade latente (não é necessário citar exemplos).
    Infelizmente, a verificação da tese depende da comprovação da veracidade dessas duas afirmações, pois é a partir delas que se conclui que o comunismo é uma psicopatologia social. A base das afirmativas parece ser um raciocínio indutivo. Provavelmente, o autor conhece vários comunistas, a maioria deles apresenta esses sintomas, logo eles são comuns à maioria dos comunistas da América Latina.
    Popper e outros autores já demonstraram os perigos do raciocínio indutivo. Um exemplo clássico: todos os cisnes que vi eram brancos, logo não existem cisnes negros. Nesse caso, bastaria a apresentação de um cisne negro para demonstrar a falsidade da afirmação. No caso em questão, para demonstrar a falsidade da tese, eu teria que provar que a maioria ou pelo menos uma boa parte dos comunistas não se enquadra nessa tipologia.
    Eu poderia argumentar com a minha experiência pessoal: militei durante 14 anos no PC do B e a maioria absoluta dos comunistas que conheci não se enquadrava nesses tipos. Não pretendo insistir nessa linha, porque pecaria pelo mesmo defeito da tese: estaria usando um raciocínio meramente indutivo. Além do mais, não tenho como extrapolar essa experiência para toda América Latina.
    O método científico se baseia numa cadeia indutiva-dedutiva. A partir de várias experiências generalizamos uma hipótese que explica esses fenômenos e a testamos. Caso ela resista à prova, teremos, pelo menos provisoriamente, uma teoria explicativa. Uma teoria assim busca uma explicação causal.
    A tese, para explicar a causa dos complexos citados se apóia no reflexo condicionado. Ela falha ao apontar um agente externo que não seria real, o imperialismo americano, que sabemos sê-lo. Falha também ao não apontar quais seriam os estímulos reais que condicionariam os comunistas a reagir a um inimigo imaginário.
    Portanto, ela se reduz a um argumento de autoridade: o conhecimento qualificado dos comunistas latino-americanos pelo autor. Nesse caso, é justo pedir que ele explicite suas credenciais, no caso que detalhe esse conhecimento.

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  2. Boa, Marco,

    Talvez você tenha visto isso nos tópicos, mas mesmo assim irei reforçar. Ao elaborar esta tese eu deixei três falhas estruturais. Duas delas foram propositais, pois eu queria que o interlocutor as localiza-se no texto e entrasse exatamente neste ponto para formar a antítese. E meus parabéns. Você localizou uma delas.

    A terceira falha, porém, não foi proposital mas é também inevitável ao se elaborar uma tese como esta. Você localizou este ponto e terei dificuldades com isso.

    1ª Falha: "Seria o imperialismo americano um inimigo real ou um arquétipo do inimigo vilão, sem base na realidade?"

    Respondo que não. O imperialismo em si existiu. Mas, veja, existiu. No que tange à América Latina, há muito tempo não há imperialismo. O que acontece por aqui é que desde que nos tornamos uma república democrática sofremos, justamente, com políticas social-democratas, que tem raízes no socialismo, e que engessaram as leis. Além disso, sofremos com um problema latente no que diz respeito à fiscalização de fronteiras.

    Se você for ver, a ilha do Norte não nos agride atualmente. Por outro lado, os países "pobres", nossos vizinhos, estes sim utilizam nossas fronteiras para contrabando e exploram nossa mata amazônica e mata atlântica.

    O Imperialismo na América Latina é um inimigo morto há tempos. E até mesmo essa mania de perseguição constante de parte dos comunistas é emprestada dos nacionalistas mais radicais, que querem fechar fronteiras a todo custo e dificultar a importação ou exportação de produtos.

    Por ser um inimigo morto, a referência ao Imperialismo como algo atuante em nossas vidas hoje é uma patologia, como se o inimigo ainda estivesse vivo. Na verdade, é a falácia do espantalho. Ataca-se um inimigo distorcido. Quando acusam os USA de imperialismo na américa latina, estão na realidade distorcendo aquilo que os USA realmente faz.

    Agora, justificando a menção ao reflexo condicionado, explica-se justamente por que houve um estímulo real no passado que criou o reflexo. Agora, o reflexo atua sem o estímulo real, com base apenas naquele estímulo do passado. Igual ao cão que salivava ao ver o pedaço de carne, e depois salivava com o mero toque da campainha, no experimento de Pavlov.

    Penso ter justificado este ponto. Caso ainda encontre falhas, aponte.

    2ª Falha: Generalização.

    De fato, não há como escapar desta falha, que não é necessariamente uma falha mas que invalida no sentido científico este raciocínio.

    Não há como eu provar para você nem para ninguém o que eu digo. Quando afirmo que os comunistas se comportam assim, mesmo admitindo exceções estou afirmando que a maioria deles se enquadra na patologia que apresento. Isso foge totalmente de minhas mãos.

    No meu outro debate, o interlocutor foi ingênuo e caiu exatamente dentro da armadilha da tese, pois ele optou por defender o socialismo quando este nem mesmo estava sendo atacado. Você, talvez por ter mais entendimento do assunto ou por ter compreendido a tese em si, não caiu. Então, não me resta muita coisa, a não ser admitir minha incapacidade de provar que estou certo neste ponto. Só posso, contar, então com a experiência dos leitores com relação a outros comunistas que eles próprios conheçam, para ver se de fato estas afirmações servem para uma maioria.

    A única coisa que sustenta cientificamente minha afirmação genérica é o reflexo condicionado. Este já foi justificado na primeira falha. Mas a segunda falha é isso mesmo, uma falha estrutural que não está ao meu alcance solucionar.

    Só que isso ainda não invalida a tese. Ou invalida?

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  3. Em relação à generalização sobre os sintomas patológicos dos comunistas, Roger reconheceu que é uma opinião cuja veracidade deverá ser aferida pelos leitores, baseados também em suas opiniões pessoais. Nós julgamos o tempo todo baseados em opiniões e elas são legítimas, embora não possam ser usadas como suporte para uma teoria que se pretenda científica. Como ela é uma premissa essencial na sua cadeia de raciocínio, penso que sua tese fica seriamente prejudicada.
    À guisa de informação, no Brasil, o Partidão, defendia a transição pacífica e se opunha à luta armada. De outro lado, o PC do B, embora defendesse a luta armada, tinha uma concepção diferente, mais calcada na experiência chinesa. Ambos partidos faziam críticas ao modelo cubano. Embora as organizações guevaristas tivessem maior visibilidade, elas não eram majoritárias.
    Segundo Roger, sua tese se sustentaria através do reflexo condicionado. O imperialismo seria o estímulo real, que existia no passado e que teria criado o reflexo condicionado que faz os comunistas salivarem à simples menção de um inimigo que não existe mais.
    Relembrando a analogia usada, o cão saliva quando vê carne, um estímulo real. Ele passa a associar a carne a uma campainha. Mais tarde, ele saliva só de ouvir a campainha, mesmo sem a presença da carne. Há duas questões a se considerar. A primeira, que abordarei agora, é que, mesmo que a carne não exista, o comportamento do cão não é patológico. Transportando a analogia para a tese, mesmo que o imperialismo não seja mais uma ameaça real, não fica provado que o comportamento dos comunistas ao considerá-lo como inimigo seja patológico e não simplesmente um erro de julgamento. Paradigmas são difíceis de serem mudados, como mostrou Thomas Kuhn. A segunda questão, se o imperialismo é ou não um inimigo real será abordada noutra postagem.
    O imperialismo é um fenômeno complexo e dinâmico. As formas de exploração e de controle evoluíram. Será que a percepção dos comunistas também evoluiu?
    Manifesto Programa do PC do B em 62:

    “Por que tudo isso ocorre num país tão imenso e rico, habitado por um povo laborioso? Isso se verifica devido à espoliação do país pelo imperialismo, em particular o norte-americano, ao monopólio da terra e à crescente concentração de riquezas nas mãos de uma minoria de grandes capitalistas.
    Os imperialistas dominam importantes setores da economia nacional. São donos das indústrias de automóveis, pneumáticos, vidro plano, produtos farmacêuticos, frigoríficos, etc., e controlam quase toda a produção e distribuição de energia elétrica, bem como o comércio de petróleo.
    Os monopólios ianques ocupam posição destacada no comércio exterior do Brasil, impõem preços cada vez mais baixos aos produtos brasileiros de exportação e elevam constantemente os dos bens que o país importa.”

    Programa Socialista para o Brasil, de 2009:
    “A nova luta pelo socialismo se dá num mundo em mudanças nas suas relações de poder no século XXI. Está em curso uma transição do quadro de dominação unipolar que marcou o imediato pós-Guerra Fria, com a intensificação de tendências à multipolarização e à instabilidade no sistema internacional. Transição cuja essência é marcada pelo declínio relativo e progressivo dos EUA e pela rápida ascensão da China socialista. Essas tendências são fomentadas e alimentadas pela dinâmica de desenvolvimento desigual do capitalismo que tende a se intensificar com a crise internacional desse sistema. ... a crise econômica atual tende a agravar o declínio da hegemonia dos Estados Unidos, embora estes ainda preservem ampla supremacia de poderio militar. ...”
    A evolução na maneira de encarar o imperialismo americano é um forte indício de que, pelo menos para o PC do B, sua atuação não pode ser assimilada a um reflexo condicionado, onde a reação é sempre igual e não corresponde a um estímulo real. O PC do B tem mais de 300.000 membros e um papel de destaque na América Latina, podendo ser tomado como representativo da posição dos comunistas da região.

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  4. Vamos lá,

    A generalização é inevitável. Mas, pense que eu poderia ter mentido. Eu poderia dizer que fiz um estudo de caso a caso, e que fiz pesquisas de campo entrevistando comunistas por aí, e que tenho provas estatísticas. Se eu dissesse isso, fundamentaria minha tese e ninguém teria como provar que estou errado. Mas o fato é que é uma generalização com base nos comunistas que conheço e também com base nos comunistas que outras pessoas próximas a mim também conhecem. De qualquer forma, você tem razão ao dizer que isso prejudica a tese. De fato, prejudica mesmo.

    Vejamos o seguinte: O reflexo condicionado não é necessariamente patológico. Na verdade, reflexo condicionado é comum no dia-a-dia. Isso deve ficar claro. O cão salivar por um pedaço de carne não é patológico, pois na memória dele, mesmo que a carne não esteja mais ali, ele ainda se lembra dela. Esse estímulo é natural, pois nós salivamos ao simplesmente pensar em um pedaço de carne. Se eu não deixei isso claro na tese, estou deixando agora. A patologia começa a partir do comportamento que se tem com base em um reflexo condicionado.

    Atacar o imperialismo, no passado, era normal. E seria normal que este reflexo se mantivesse após algum tempo, mesmo sem a existência do inimigo. Mas, para o reflexo condicionado se manter, segundo Pavlov, é preciso que seja reforçado de tempo em tempo, pois com o passar dos tempos ele se perde aos poucos. Só que os comunistas, em geral, ainda hoje trabalham contra este inimigo que está morto há décadas. Não houve um reforço para o reflexo, ele simplesmente se manteve em um impulso de massa, virou um vício. Aí, se tornou patológico.

    Quanto ao PC do B, não posso afirmar muita coisa. Não foi neste partido que eu militei. Em minha região, o PC do B não tem influência quase nenhuma, nem conheço ninguém deste partido aqui da região. Mas, sabe o que os comunistas de outro partido falam sobre o PC do B? Dizem que não é um partido genuinamente comunista. Se é ou não, eu não sei. O que sei é que eles dizem isso de qualquer partido que não seja o deles.

    Sugiro que dê uma olhada no site da Esquerda Marxista no Brasil. Lá você verá um ataque diário ao Imperialismo, nos mesmos moldes antigos. O site é: http://www.marxismo.org.br/

    Aliás, eu devia ter usado este site para sustentar minha tese. Seria menos generalizada. rs

    Mas, vendo que você defende, por exemplo, que a existência de empresas estrangeiras explorando a mão de obra nacional é uma prática imperialista, fico receoso. Acho esta análise tendenciosa demais, é uma distorção da realidade.

    Se empresas estrangeiras se instalam no país para explorar mão de obra, isso não é porque elas são más, e sim porque nosso governo é incompetente e não investe nas áreas produtivas, deixando esta brecha enorme na economia que, portanto, alguém tem que tapar. Além disso, pensando pelo lado da classe trabalhadora, são justamente estas empresas que criam vagas de emprego em massa. Não fossem elas, qual medida o governo tomaria para resolver o desemprego? Provavelmente teriam que criar programas de bolsa-esmola, uma vez que assistencialismo traz votos é a é mais fácil do que investir na economia.

    Não vejo, portanto, como empresas de fora no país possam ser uma atitude imperialista. Muito pelo contrário, é uma atitude quase altruísta. Vir com uma empresa, uma fábrica, para um país com a carga tributária do Brasil, enquanto poderiam ir para qualquer outro lugar com uma tributação menor, é um ato de solidariedade com o trabalhador e com o governo brasileiro. Se eu fosse empresário, passaria bem longe daqui.

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  5. Meu caro Roger,
    Em momento algum eu duvidei da sua honestidade. Reconheço que eu mesmo travei conhecimento com alguns tipos afetados dos complexo de Che e de superioridade. O mal, como você mesmo reconheceu, foi a generalização. Weber trabalhava com tipos ideais, baseados em características individuais, para criar por indução um tipo que auxiliara na análise sociológica. Eu poderia aceitar esse comunista que você criou como um tipo ao estilo Weberiano, não fosse o fato de você o ter tomado como representativo de todos os comunistas da América Latina.
    Citei o PC do B como um contra-exemplo, porque é o partido comunista com maior militância, representação no parlamento e participação no governo. Não entro no mérito de ele ser o mais ortodoxo e nem avalizei a correção de suas propostas. Usei os textos de 62 e de 2009 para mostrar que para esse partido, pelo menos, houve uma evolução muito grande na maneira como seus militantes percebem o imperialismo americano.
    Em relação a presença de empresas estrangeiras, eu apenas expus a posição que os comunistas do PC do B mantinham em 62. Penso que, numa economia globalizada como a atual, como alternativa imediata de crescimento, pode ser interessante contar com o investimento direto estrangeiro, desde que ele não monopolize áreas estratégicas da economia. É uma maneira de contar com a poupança externa para crescer. A China, que é o modelo atual do PC do B, fez isso.
    Citando novamente o programa de 2009:
    “Por surgir das entranhas do modo de produção capitalista e das suas instituições, a transição para a nova sociedade ainda terá uma economia mista, heterogênea, com múltiplas formas de propriedade estatal, pública, privada, mista, incluindo vários tipos de empreendimentos, como as cooperativas. Poderá contar com a existência de formas de capitalismo de Estado, e com o mercado, regulados pelo novo Poder. Todavia, progressivamente devem prevalecer as formas de propriedade social sobre os principais meios de produção.”
    O site que você citou, da esquerda marxista, é de inspiração trotsquista. Só para ilustrar como é difícil criar um tipo ideal que represente toda a esquerda marxista, os trotsquistas e os comunistas mais ortodoxos se acusaram mutuamente durante a recente revolta líbia contra Kadafi. Para os segundos, os primeiros seriam cúmplices do imperialismo, por não apoiarem o ditador deposto. É justo acrescentar que mesmo entre as organizações trotsquistas há uma diferenciação muito grande.
    Sem a pretensão de esgotar o tema, eu dividiria assim a esquerda marxista: reformistas, trotstquistas, maoístas, populistas, stalinistas, neostalinistas, ecléticos. Os primeiros, inspirados pelo eurocomunismo, estariam representados no PPS. Os trotsquistas apresentam inúmeras divisões e cisões. O PSTU seria seu principal representante. Há ainda inúmeros movimentos que reivindicam o maoísmo, principalmente na América Latina. As FARC poderiam representá-los. Os populistas seriam a esquerda que não é ligada aos partidos comunistas mais tradicionais. Tem Chávez e Cuba como referência ideológica. Como stalinistas, teríamos o PCB como tendência mais representativa. Eu colocaria o PC do B como neo-stalinista. E finalmente há uma esquerda eclética, muito influenciada pelos indignados e os novos movimentos. Com certeza, muitas posições ficaram de fora, já que não tive a pretensão de ser exaustivo. O PSOL, por exemplo, abriga uma esquerda muito diversificada.
    Uns apóiam o Governo Dilma, outros não; uns ainda apostam na luta armada, outros privilegiam a via eleitoral; uns apóiam Chávez, outros não; novas bandeiras como as questões de gênero e a sustentabilidade foram incorporadas. A própria linguagem da esquerda marxista já abriga novas categorias como inclusão, precarização, etc.
    Toda essa diversidade, a meu ver, torna impossível a tarefa de analisá-la a partir de um mecanismo único, o reflexo condicionado.

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  6. Bem, Marco...

    Na hora em que eu li sua tréplica ontem eu não havia notado uma coisa importante que notei agora.

    De fato, quando li achei que você tivesse me dado um xeque mate e talvez se eu tivesse te respondido ontem eu tivesse aceitado sua posição como certa. Mas, agora lendo novamente percebi algo que me ajudará muito nesta questão.

    É notório que seu conhecimento político da questão é maior que o meu. Talvez pela idade, pelas experiências que tem ou porque pode ter lido mais do assunto do que eu. Mas o fato que encontrei eu seu conhecimento uma brecha que ajuda a reforçar minha tese.

    Na tréplica você apresentou uma diferenciação entre vários tipos de comunistas, vários tipos de esquerdistas, e até mesmo fez um breve resumo do assunto. Ao final, você conclui que não se pode colocar todos em uma mesma avaliação, já que seriam diferentes entre si. Mas eu te digo que é possível, ainda e talvez agora mais do que antes, avaliar todos sob o mesmo escopo.

    - Reparei que entre todos os tipos que você citou, há UMA coisa que não muda em nenhum deles: O Arquétipo do Inimigo.

    Todos os diferentes grupos que você citou, embora discordem e até se acusem ideologicamente, ainda assim têm como inimigo comum o Imperialismo e os Estados Unidos.

    Trotskistas, stalinistas, comunistas ortodoxos, enfim, todos os tipos que você citou se comportam do mesmo modo diante do "inimigo invisível", e carregam em seus discursos sempre acusações contra os EUA e contra os outros comunistas de outras correntes que estariam se vendendo aos interesses do capital especulativo ou do imperialismo.

    Ainda que no caso do PC do B a visão sobre o imperialismo tenha mudado com o tempo, percebe-se que ainda consideram o imperialismo como um inimigo real e cujos tentáculos nascem no império do norte. Essa mentalidade, aliás, não é coisa apenas de militantes políticos, mas está impregnada em boa parte da sociedade de forma bastante subjetiva.

    O fato de vermos que praticamente todos os grupos da esquerda comunista ou socialista tenham um comportamento sempre direcionado para o conflito contra esse inimigo já coloca uma ordem patológica no fato.

    E da mesma forma que o Reflexo Condicionado, que eu expliquei aqui que não é necessariamente algo patológico, o arquétipo também não é. O que é patológica é a reação que a pessoa tem ou a forma como mantem o sintoma.

    Arquétipos são apenas representações figuradas que nos cercam o tempo inteiro, nos filmes, nos livros, etc. A patologia começa apenas quando a pessoa começa a acreditar no arquétipo de forma real e passa a agir como se ele existisse em carne e osso.

    E ao final do texto você diz que usei um mecanismo único de avaliação, que seria o reflexo condicionado. Mas na realidade não foi o que eu fiz. Eu usei mecanismo múltiplos, como a projeção, os arquétipos, a alucinação, etc. Tudo isso está bem no início da tese.

    Espero ter ficado mais claro agora. E aguardo suas considerações finais!

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  7. Usando a classificação de Platão, que dividiu o conhecimento em sensível (crença e opinião) e intelectual (raciocínio e a intuição das formas verdadeiras), podemos dizer que a tese do Roger se apóia, em boa parte, em uma opinião – ele generaliza os comunistas que conhece, direta ou indiretamente, para formar um tipo ideal.
    O uso da opinião enfraquece a sua tese, embora seja difícil refutá-la a não ser através de uma opinião contrária. Já o raciocínio parte de premissas consideradas verdadeiras e avança através da lógica, como na Matemática. De novo, podemos ter conclusões verdadeiras, mesmo partindo de premissas falsas. No terreno do conhecimento intelectual, a sustentação de sua tese postula uma série de procedimentos patológicos que se originariam em uma ilusão (a de que o imperialismo ainda é o inimigo a ser combatido na América Latina).
    Minha refutação segue o princípio de causa e efeito: toda causa tem uma ação e ações iguais, nas mesmas circunstâncias, devem produzir a mesma causa. Inicialmente, através de um contra-exemplo, mostrei que o tipo que ele idealizou era uma generalização muito perigosa.
    Seguindo a mesma linha de raciocínio, a percepção do imperialismo (causa), que poderia ter gerado um reflexo condicionado, deveria produzir sempre a mesma ação – uma prática patológica baseada numa visão irreal. De novo, apresentei um contra-exemplo mostrando que pelo menos num caso, o PC do B, um partido que tem um peso considerável na América Latina, essa percepção evoluiu com o tempo, o que afastaria a hipótese de ser causada por um mecanismo de reflexo condicionado.
    Eu entendo a tese de Roger como uma afirmação não sobre todos os comunistas, mas sim sobre a sua maior parte, caso contrário, bastaria um contra-exemplo para refutá-la. Mostrei também que, sendo os comunistas divididos na prática em vários tipos diferentes, poderíamos concluir que seriam necessárias causas muito diversas para gerar o mesmo tipo de procedimento. Eu usei uma tipologia empírica, baseada em meu conhecimento prático, para ilustrar essa minha afirmação.
    Meu oponente não desqualificou essa tipologia, antes procurou se basear nela para intuir que havia um denominador comum nas ações de todos esses comunistas: o seu antiimperialismo. Nesse ponto chegamos a um terreno mais firme: se eu demonstrar que o imperialismo é um inimigo real, ao contrário do que ele afirmou, sua tese sobre a psicopatologia ficaria muito abalada.
    O imperialismo supõe uma potência central, que mantém relações de dominação com a periferia. Ele surge do desenvolvimento desigual do capitalismo. Enquanto um sistema dinâmico e em transformação, só se extinguirá através de sua superação ou de um retrocesso.
    “Para Panitch/Gindin, o imperialismo atual se caracteriza pela capacidade do Estado americano de penetrar e coordenar os outros Estados líderes capitalistas. O dinamismo do capitalismo americano e o seu apelo mundial, combinado com uma linguagem universalista da ideologia de democracia liberal, apoiam a capacidade do império informal de ir além dos impérios anteriores. ... Assim, a ordem capitalista mundial se organizou e regulou pela via de reconstrução de outros Estados como elementos integrais do império informal americano.” http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1211
    A globalização é um fenômeno novo e ainda na suficientemente estudado. A caracterização que citei acima, embora parta de uma abordagem marxista, não é consensual.
    Retomando os elementos mais importantes: nosso desenvolvimento atrasado nos colocou na periferia e o imperialismo só se transforma através do confronto com as forças que a ele se opõe. Como a própria tese parte da existência anterior do imperialismo, deveria reconhecer que essa oposição é natural ao processo de evolução do capitalismo. Com isso penso ter mostrado que o anti-imperialismo das diversas correntes comunistas tem um base objetiva.
    Concluindo: a tese permanece no terreno da opinião, parte de premissas que não se sustentam e não pode ser provada através do raciocínio lógico.

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  8. Bem, não há muito o que ser dito por aqui.

    A conclusão do meu oponente, em parte contraria minha tese, e em parte a sustenta.

    No caso, persistiria aqui que o reflexo condicionado existe porque um dia houve imperialismo, de fato, e que a existência passada deste imperialismo teria criado o reflexo nos comunistas, que permaneceram agindo como se o inimigo ainda existisse. Mas, eu já disse isso, meu adversário não concorda e não há necessidade alguma de eu repetir. Cabe ao público julgar se meu pensamento é correto ou se meu oponente tem mais razão do que eu neste aspecto.

    Como também já admiti a questão da generalização, desde o início, não há muito o que dizer neste sentido.

    Ademais, achei este debate bom, inteligente e produtivo. Meu oponente soube se portar, apresentou seus argumentos de forma clara e, diria eu, convincente. Simplesmente não concordamos neste ponto de vista e é só isso mesmo.

    De agora em diante, é com os leitores.

    Finalizo aqui minha participação.

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